Multitarefa é como um truque que empregamos contra nós mesmos – porque fazemos malabarismos com mais tarefas, parece que estamos fazendo mais.
Mas especialistas dizem que o oposto é verdade. De acordo com a Associação Americana de Psicologia, a multitarefa pode desperdiçar “até 40% do tempo produtivo de alguém”.
Computadores e smartphones permitem mais oportunidades de multitarefas do que nunca – podemos enviar um texto, postar no Instagram, jogar um jogo e assistir a um vídeo na mesma tela. Pode parecer que a nossa inteligência tecnológica nos tornaria melhores em multitarefas, mas a evidência sugere que isso pode de fato estar enfraquecendo nossos cérebros. Pesquisadores da Universidade de Stanford descobriram que os estudantes que habitualmente manipulavam várias fontes midiáticas tinham pior concentração e menor tempo de atenção do que colegas que mantinham a tecnologia multitarefa no mínimo.
No cerne de nossa deficiência multitarefa estão as limitações de nossa biologia. Apenas os computadores podem fazer vários cálculos simultaneamente, enquanto a natureza da atenção humana requer um único foco, diz a neurocientista Susana Martinez-Conde.
“Os circuitos neurais que viabilizam a atenção são circuitos supressivos”, disse ela. “Se você está dividindo sua atenção entre duas ou mais tarefas, elas estão se suprimindo mutuamente, porque o ato de prestar atenção em algo significa que você está suprimindo outra(s) coisa(s).”
Isso sugere que a multitarefa – pelo menos para os seres humanos – é impossível, porque os nossos cérebros não podem prestar atenção a duas coisas ao mesmo tempo. Um termo mais preciso seria “comutação de tarefa”, e a maioria de nós é muito ruim nisso.
Especialistas estimam que menos de 2% da população é eficiente na alternância de tarefas (essas pessoas são chamadas “supertarefas“). As outras pessoas precisam de muito esforço mental para deslocar seu cérebro de uma tarefa para outra, e quanto mais atenção uma tarefa exige, mais difícil é fazer a mudança.
Atividades de coordenação que requerem pouca atenção, como comer um sanduíche, verificar o e-mail e assistir a um show podem ser realizáveis. Mas as consequências podem ser devastadoras quando você alterna entre tarefas de maior atenção, como escrever mensagens de texto e conduzir um veículo. Um estudo descobriu que as pessoas que dirigiam enquanto conversavam em seu celular (mesmo com um dispositivo de mãos-livres) desempenharam-se tão mal quanto motoristas bêbados.
Sob um feitiço
Se os seres humanos são tão pobres em multitarefa, por que abraçamos este comportamento?
Martinez-Conde abordou essa questão estudando prestidigitadores ou ilusionistas. Em seu livro “Truque da Mente: o que a neurociência do ilusionismo revela sobre nossos enganos diários“, Martinez-Conde e seu colega neurocientista Stephen L. Macknik demonstram que as mesmas ferramentas de distração usadas no ilusionismo de palco também nos mantêm cegos para o feitiço da multitarefa.
“É basicamente uma estratégia de divisão e conquista”, disse ela.
Sabendo que nossa atenção funciona melhor quando a dedicamos a um único foco, um ilusionista frequentemente usa múltiplas distrações para esconder os detalhes de um truque, criando assim uma ilusão convincente.
Um cenário semelhante ocorre quando você está sentado no computador trabalhando, pagando contas ou executando outras tarefas de grande atenção. A cada poucos minutos, um zumbido ou bipe alerta você para uma mensagem instantânea, e-mail ou atualização do Facebook, fazendo com que você mude de tarefa. Porque essas distrações parecem tão pequenas, supomos que elas têm pouco impacto em nosso trabalho. Mas elas ainda corroem nosso tempo e foco.
“Cada vez que você faz isso, você perde tempo, algo entre 30 segundos a cinco minutos, mas isso realmente se amontoa até o final do dia”, disse Martinez-Conde.
Num mundo em que as pessoas esperam uma resposta rápida, há muita pressão social para ficar conectado a nossos dispositivos. Mas há também um aspecto viciante em nossa conectividade constante que erode ainda mais a nossa atenção.
Uma pesquisa da Universidade Estadual de Ohio descobriu que os estudantes tinham mais probabilidade de recorrer a distrações digitais quando precisavam estudar. Os alunos reconheceram que esse comportamento era um entrave na consecução de seus objetivos, mas o hábito multitarefa os fazia se sentirem mais emocionalmente satisfeitos com sua experiência de estudo.
Psicólogos referem-se a esses tipos de hábitos como fornecendo “reforço intermitente”. É o mesmo mecanismo que torna o jogo tão viciante. Quando verificamos constantemente nossas mídias sociais, por exemplo, geralmente nada mudou. Mas eventualmente algo novo aparece, e somos instigados a responder imediatamente. Esta recompensa ocasional e imprevisível nos mantém empenhados numa plataforma em que na maioria das vezes não há nada para ver.
“É uma recompensa muito poderosa devido à forma como nossos cérebros são conectados”, disse Martinez-Conde.
Contratam-se multitarefas
Os empregadores também estão hipnotizados pelo fascínio da multitarefa. De acordo com Conrado Lamas, diretor de marketing de uma empresa de tecnologia na Espanha, as empresas veem grandes economias em trabalhadores que podem fazer malabarismos.
“A tecnologia nas últimas décadas fez os locais de trabalho concentrarem o que três, cinco, às vezes 10 pessoas costumavam fazer como seus empregos em tempo integral”, disse ele.
Lamas diz que as organizações só investirão em profissionais focados quando veem um incentivo para isso. Mas de acordo com Margaret King, analista cultural que estuda o comportamento humano para grandes corporações, os empregadores não conseguem ver esse incentivo porque não mensuram o quanto a multitarefa prejudica a produtividade.
“O hábito de alternar repetidamente é onde está todo o custo, e não resolveremos esse problema porque é apenas a maneira como o seu cérebro funciona”, disse King.
No serviço de atendimento ao cliente, por exemplo, os funcionários podem ter que atender ao telefone, lidar com os clientes em pessoa, operar um computador e ir ao estoque para verificar uma encomenda. Todas estas tarefas possuem seus desafios individuais, mas mudar constantemente entre elas custa mais do que apenas tempo.
“Em lugares onde você tem que fazer um monte de multitarefa, as pessoas se esgotam e vão embora”, disse King. “Isso é devido ao esforço e desgaste que sofre o nosso cérebro quando tenta fazer muitas coisas diferentes no mesmo espaço de tempo.”
Estabelecendo limites
Completar um projeto exige tempo e atenção. Mas muitos funcionários trabalham em escritórios tão cheios de distrações que eles não têm o ambiente necessário para fazer as coisas. King vê nisso a razão por que muitos funcionários levam trabalho para casa.
“No trabalho, você não pode dizer a seu chefe, ‘Eu não posso falar com você agora.’ Em casa, você não tem que se socializar – se sua família entende isso ou você vive sozinho. Então você pode finalmente se concentrar”, disse King.
Arquitetos voltados para a produtividade estão agora reformulando os espaços de escritório para serem mais voltados para a concentração e menos para a socialização. Enquanto isso, os especialistas recomendam banir as distrações que você pode controlar.
“Há uma luta contínua por nossa atenção, então você tem de controlar o ambiente ao seu redor”, disse Martinez-Conde. “Se há algo em que estou trabalhando, eu fecho o e-mail e o Facebook, e minimizo o volume no meu celular, caso contrário, eu sei que continuarei verificando e distraindo-me.”
Para King, a chave para a gestão do tempo é estabelecer prioridades. Em vez de tentar fazer tudo de uma vez, identifique o que é mais importante e coloque toda a sua energia em realizar esse único objetivo.
“Se você cuidar de sua prioridade máxima primeiramente, tudo mais se endireita”, disse ela.