Muitos povos que ainda vivem de acordo com suas culturas ancestrais milenares possuem conhecimentos que permitem a sua interação com diferentes reinos da natureza, de um modo que a cultura moderna ocidental desconhece completamente.
Quem assistiu ao documentário “Camelos também choram” observou um acontecimento peculiar. Dois mongóis – uma mãe de família e um professor de música – conseguem comunicar uma necessidade vital a uma mãe camelo: a de aceitar e amamentar seu filhote, que estava perecendo devido à sua rejeição.
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O filhote estava sendo rejeitado pela mãe porque havia sido fruto de um parto muito difícil e doloroso, além de ter nascido albino. Depois de muitas tentativas infrutíferas de aproximação entre a mãe e seu filhote, os mongóis usaram um antigo conhecimento de sua cultura: um tipo de melodia, que talvez seja uma cantiga ou oração ancestral – ininteligível para nós ocidentais – para que a mãe camelo recobrasse sua disposição materna em relação ao filhote.
Então, a mulher começou a acariciar a mãe camelo e a entoar a melodia. Em pouco tempo, a voz da mulher e o som do instrumento se afinaram, seguindo um mesmo ritmo e melodia, e depois de um tempo a mãe camelo começou a derramar lágrimas. Então, mais uma vez colocaram o filhote debaixo da mãe. Dessa vez ela não o agrediu com coices, cabeçadas e mordidas, mas o acolheu gentilmente, e, finalmente, ele começou a mamar.
Como é possível que humanos sejam capazes de comunicar sentimentos e necessidades precisas a animais, sem o uso da força ou do adestramento? Pode isso significar que, em essência e num certo nível, os seres vivos compartilham de determinados estados comuns de consciência?
Esse documentário foi gravado no deserto da Mongólia, no seio de uma família tradicional de nômades sheperds – pessoas acolhedoras e pacatas, que mostram humanidade e dignidade, vivendo harmoniosamente num clima tão inóspito. Elas, apesar de sua aparente simplicidade e falta de ciência, conhecem formas diferentes de se relacionar com o mundo e com os seres vivos que, muitas vezes, ultrapassam o nosso conhecimento científico moderno.
Há muitas pessoas entre nós que conseguem, em certas circunstâncias de suas vidas, transmitir sentimentos-ideias a pessoas próximas, e esses sentimentos são experimentados realmente pela outra pessoa, que sente-compreende a mensagem imediatamente, sem a necessidade de diálogos verbais ou explicações posteriores. Boa parte de nós já passou por experiências assim.
Porém, estamos trocando cada vez mais a nossa sensibilidade e sabedoria instintiva pelas funções dos instrumentos e das máquinas; confiando totalmente nos recursos tecnológicos, em detrimento de riquíssimas possibilidades e capacidades naturais que temos. A ciência contemporânea tem criado instrumentos notáveis; em contrapartida tem levado à atrofia e à perda de muitas de nossas capacidades naturais que são mesmo extraordinárias.
Hoje, temos um predomínio esmagador do uso do intelecto nos seres humanos. Educamos nossas crianças muito mais para utilizarem máquinas do que para relacionarem-se com humanidade. Como diz o livre pensador Krishnamurti: “A educação atual está toda interessada na eficiência exterior, desprezando inteiramente ou pervertendo, com deliberação, a natureza intrínseca do homem.”
A própria ciência moderna é filha exclusiva do intelecto. E quando ao intelecto é dada importância exacerbada, a sensibilidade multicomposta dos seres humanos (afetiva, perceptiva, intuitiva, sinestésica) definha; e quando definha a sensibilidade, estabelece-se a aridez e a insensibilidade dos seres humanos. Isso resulta numa sociedade tecnologicamente capaz, mas cada vez mais pobre em espírito humano.
Clique abaixo para assistir o documentário “Camelos também choram” completo:
CAMELOS TAMBÉM CHORAM from Rodrigo Rocha on Vimeo.
Alberto Fiaschitello é terapeuta naturalista e cientista social