Dia de São Francisco de Assis: humildade, compaixão e desejo por martírio em encontro com sultão do Egito

Por Igor Iuan
04/10/2024 22:32 Atualizado: 04/10/2024 22:32

No 4 de outubro, católicos e admiradores ao redor do mundo celebram o Dia de São Francisco de Assis, um dos santos mais reverenciados da Igreja Católica. Sua influência transcende fronteiras religiosas, tornando-o um símbolo de compaixão e respeito à vida em todas as formas.

Com trajetória marcada pela simplicidade, humildade e profunda devoção ao próximo, São Francisco é conhecido por ter renunciado a uma existência de riquezas para abraçar a pobreza e o amor à natureza e aos animais.

Francisco acreditava que o amor de Deus era uma riqueza inestimável, muito mais valiosa que qualquer moeda, e que a única forma de retribuir esse amor era através do sacrifício pelo próximo, pois para ele “nada se devia antepor à salvação das almas”.

No entanto, pouco se comenta sobre uma “santa inveja” cultivada por Francisco: a busca pelo martírio. Sua vida foi marcada por uma intensa procura pelo triunfo dos mártires, que nunca permitiram que a chama da caridade se apagasse.

Movido por essa chama ardente de martírio, Francisco resolveu dirigir-se para o Oriente dominado pelos sarracenos — designação utilizada na Idade Média para se referir aos muçulmanos ou árabes — e pregar a fé cristã.

Desistência da guerra e reconstrução de capela

Nascido na Itália em 1181 ou 1182, Francisco de Bernardone era filho de um próspero comerciante. Sua juventude foi repleta de luxos e distrações, mas o jovem se sentia insatisfeito com a vida que levava.

Influenciado por histórias de cavaleiros e em busca de um ideal mais elevado, ele se alistou para lutar na guerra, mas o contato com a realidade da luta e o sofrimento despertou nele um chamado para algo maior.

Após uma série de experiências transformadoras, incluindo um sonho em que lhe foi revelado o vazio das vaidades mundanas, Francisco decidiu retornar para Assis. Foi nesse período que ele começou a se distanciar dos prazeres terrenos, investindo tempo em oração e reflexão.

Um momento crucial de sua conversão ocorreu quando ele ouviu uma voz pedindo que reconstruísse a Igreja, levando-o a restaurar uma capela em ruínas, simbolizando sua renovação espiritual.

São Francisco fundou a Ordem dos Frades Menores, que se destacava por sua ênfase na pobreza radical e na bondade. Seus ensinamentos e ações ressoaram ao longo dos séculos, enfatizando o valor da simplicidade.

A jornada de Francisco é repleta de episódios marcantes, como seu famoso encontro com o feroz lobo da cidade de Gúbio, que ameaçava currais e pastores e, segundo a tradição, foi domesticado por suas palavras de compaixão. Ele também é conhecido por pregar aos pássaros e por sua conexão profunda com a natureza.

Todavia, outro tipo de pregação foi marcantemente desafiadora, como relata São Boaventura, nas obras Legenda maior e Legenda menor, envolvendo um célebre episódio da vida de São Francisco de Assis.

Pregação ao Sultão e martírio frustrado

Seis anos após sua conversão, São Francisco decidiu ir à Síria, desejando pregar a fé cristã aos muçulmanos, com esperança de se tornar mártir. No entanto, um navio que o levava foi desviado para a Eslavônia, onde ele ficou preso por um tempo.

Sem recursos para pagar por sua passagem, ele confiou na providência divina e, milagrosamente, recebeu a ajuda de um passageiro que lhe forneceu mantimentos suficientes para a viagem. 

Determinado a buscar o martírio, Francisco partiu em direção a Marrocos, com a intenção de pregar ao Miramolim — título muçulmano que se pode traduzir como Comandante dos Fiéis. Contudo, a doença o impediu de alcançar seu objetivo. Ele entendeu que sua vida era necessária para aqueles que dependiam dele e retornou para cuidar de sua “família espiritual”.

Mas a chama do martírio continuava a arder em seu coração. Então, em mais uma tentativa de cruzar para as terras do Oriente, Francisco decidiu viajar durante uma época de guerra entre cristãos e sarracenos. Ele e um companheiro foram capturados e levados à presença de Malik Al-Kamil — Sultão do Egito pertencente à dinastia dos aiúbidas. 

O encontro ocorreu em 1219, na cidade de Damieta. Destemido, Francisco revelou que havia sido enviado por Deus para trazer a mensagem da salvação. Com fervor, pregou os mistérios da fé cristã, impressionando o Sultão com sua coragem e eloquência.

Admirado, Al-Kamil ofereceu a Francisco a possibilidade de permanecer em sua corte, mas o santo insistiu que ele estaria disposto a enfrentar a fogueira, desafiando os sacerdotes muçulmanos a se juntarem a ele num teste de fé. 

O Sultão hesitou, percebendo que os seus sacerdotes não teriam a mesma coragem. Francisco, em sua fé inabalável, declarou que se ele saísse ileso do fogo, isso seria uma confirmação da verdade de Cristo.

Apesar de sua ousadia e rejeição a riquezas materiais, Francisco não conseguiu converter o Sultão. Ele se despediu, triste por não ter alcançado seu objetivo de martírio, mas uma revelação divina o guiou de volta às terras cristãs: embora não tivesse morrido por Cristo, sua dedicação e desejo por esse sacrifício foram reconhecidos.

Marcado pela chama divina em seu coração, Francisco foi reconhecido como um verdadeiro mártir de espírito. Seu amor ardente por Deus o levou a viver em conformidade com os ensinamentos de Cristo, mesmo sem o sacrifício da própria vida. Ele se tornou um símbolo de desprendimento e compaixão, mostrando que a verdadeira riqueza está em servir e amar os outros.

A história de São Francisco de Assis, sua busca pelo martírio e seu amor incondicional continuam a inspirar muitos até hoje. Através de suas ações, ele nos convida a refletir sobre o que significa amar de verdade e como podemos nos entregar a um propósito maior, buscando a salvação das almas e a paz entre todos.