Os cinco anos de trabalho de restauração da Notre-Dame, em Paris, após o incêndio de 2019, revelaram 2 mil anos de história. Os arqueólogos descobriram, sob a catedral, mais de mil peças, incluindo 700 fragmentos, de obras de arte que datam desde a Antiguidade até o século 19.
Entre o tesouro arqueológico encontrado, está um busto de calcário em tamanho real do rosto crucificado de Cristo, o torso de um homem usando uma túnica e cerca de 30 fragmentos do rood screen ou “jubé” da catedral — uma estrutura de pedra, adornada com estátuas, que separava o coro (área sagrada) da nave (onde os fiéis se sentavam nas igrejas medievais).
Os arqueólogos explicaram que, antes do incêndio, essa escavação seria inimaginável. No entanto, como a legislação francesa determina que qualquer obra de construção que envolva a movimentação de solo onde possam ser encontrados artefatos ou restos históricos deve contar com a presença de arqueólogos do governo, eles foram chamados.
A principal missão era garantir que nenhum item valioso fosse danificado pela estrutura de andaimes de 770 toneladas usada para reconstruir a torre que havia sido atingida pelo fogo.
Inicialmente, a equipe do Instituto Nacional de Pesquisas Arqueológicas Preventivas (INRAP, na sigla em francês) obteve autorização para escavar sob o piso de pedra da Notre-Dame por apenas cinco semanas, com limite de profundidade de até 40 centímetros — o mesmo nível da fundação do andaime de restauração.
Arte, túmulos e ossos
À medida que as peças foram aparecendo, a equipe obteve permissão para escavar mais profundamente. Ao todo, em 20 operações, encontraram até 1.035 fragmentos de obras de arte e cem túmulos, além de ossos espalhados. Com isso, o número de sepultamentos na catedral aumentou para mais de quinhentos.
Entre eles, está um sarcófago de chumbo, que pode pertencer ao poeta francês do Renascimento Joachim du Bellay (1522-1560).
Os vestígios encontrados foram muito mais ricos do que o esperado”, disse Christophe Besnier, líder da escavação, à National Geographic. “É realmente impressionante”.
Os trabalhos também revelaram vestígios da Idade Média anteriores à construção da catedral, incluindo uma imponente edificação carolíngia, datada do período em que a família carolíngia governava grande parte da Europa Ocidental, entre 750 e 887.
Do ponto de vista arqueológico, a área era relativamente desconhecida, exceto pela praça”, explicou a arqueóloga e curadora-chefe de patrimônio, Dorothée Chaoui-Derieux. “A Notre- Dame era considerada um monumento histórico, não um sítio arqueológico.”