O arrependimento é um grande tópico na terapia. As pessoas falam com raiva, tristeza, autocrítica e desilusão sobre as escolhas que fizeram, as que elas gostariam de não terem feito e como suas escolhas “ruins” criaram sua infelicidade, e como elas foram responsáveis por arruinar suas próprias vidas. Elas se maltratam duramente pelas decisões que tomaram, que não geraram os resultados que elas queriam.
Muitas pessoas têm uma percepção de que a vida é como um labirinto, um quebra-cabeças pré-existente que está em algum lugar fora deles mesmas. Elas são colocadas, por assim dizer, neste labirinto. Certas caminhos (ou escolhas) as levarão à felicidade e outros as levarão a um beco sem saída, ou pior, ao rio do desespero. Há uma vida boa e elas terão que tê-la, se, e somente se, elas fizerem todas as escolhas corretas ao longo do caminho. Mas se elas fizerem certas escolhas erradas ou se as cartas que elas têm na mão são de certa natureza, elas vão perder o que poderia e deveria ter sido delas, o que estava disponível para a tomada de decisão.
Muitas pessoas imaginam que há uma escolha certa e uma errada em todas as situações. Se a decisão delas levar ao resultado desejado, eles tomaram a decisão certa. Se não, então, elas tomaram a decisão errada. O certo e o errado são determinados pelo resultado que se espera. Como um programa de jogos, a porta número um está certa e irá entregar a viagem ao Havaí, enquanto a porta número dois se abrirá para revelar um ventilador de R$1,99.
Essa atitude em relação às nossas escolhas, bem como a esta visão da vida, é a culpa.
Para cada escolha que fazemos, utilizamos a experiência, a informação e as intenções disponíveis para nós – nesse momento particular no qual estamos fazendo a escolha. Tomamos a decisão que tomamos na tentativa de alcançar o objetivo que desejamos, com os recursos que possuímos para isso agora. A vida então se desdobra e surge do jeito que ela existe; torna-se o que é em parte como resultado da nossa escolha e, em parte como resultado do mistério com que a vida se manifesta, o mistério que às vezes parece maior do que todas as nossas escolhas. A verdade é que não existe nenhuma realidade em outro lugar que diga: “João, você não vai se juntar a nós aqui na vida feliz, onde você poderia ter chegado se você tivesse feito a escolha certa e escolhido o outro caminho”. Essa outra vida feliz imaginada é, e sempre foi, apenas um pensamento. Essa realidade particular que teria ocorrido, se tivéssemos feito a outra escolha, nunca foi e nunca será uma realidade.
Queremos dividir quem somos, as escolhas que fazemos e a vida que se segue em três coisas diferentes, mas na verdade são apenas uma coisa, uma realidade inseparável e unida.
Com cada escolha que fazemos, mudamos, nos tornamos alguém diferente. Quem somos é a essência de todas as nossas experiências. Cada decisão que tomamos nos apresenta diferentes desafios, e são presentes. Às vezes, os desafios são maiores do que o que percebemos como um presente, e às vezes é o contrário. Quem somos como resultado desses desafios e presentes é a pessoa certa para nos tornarmos, quem devemos nos tornar, e a única pessoa em que pudemos nos tornar, porque essa é a única realidade que poderia existir, aquela que é.
Toda escolha que fazemos é a escolha certa, independentemente de nos levar ou não ao resultado desejado. É a escolha que fizemos naquele momento, com a inteligência, a história, feridas, condicionamentos, relacionamentos e tudo mais que possuímos e existiam na época. Embora possa parecer que poderíamos ter escolhido algo diferente do que escolhemos, esta é uma crença totalmente falsa, e que cria um tremendo sofrimento. A única escolha que poderíamos ter feito foi a que fizemos, precisamente porque é aquilo que fizemos. Se tivéssemos feito uma escolha diferente, teríamos conseguido. A vida não poderia ter sido diferente da maneira como seria. Sugerir que pudéssemos escolher um caminho diferente é imaginar que poderíamos ter sido alguém diferente do que éramos nesse momento. Fizemos o melhor que pudemos com o que tivemos para trabalhar. Mesmo que pensássemos que estivéssemos fazendo uma escolha errada no momento em que a fizemos, ainda assim, nosso melhor era fazer essa escolha “errada”, sabendo que era “errado”. Ainda era a escolha certa “errada”.
Quando uma escolha que nós fizemos acaba nos levando a uma situação indesejável, é uma escolha certa que trouxe desapontamento ou sofrimento. Embora possa não ter criado o que queríamos, está nos apresentando as lições a serem aprendidas neste momento e a oportunidade de crescer nos tornando o que somos agora. É a única e possível experiência da nossa vida neste momento.
Em vez de concentrar sua atenção nas escolhas que você deveria ter feito ou quem deveria ter sido quando estava fazendo essas escolhas, volte sua atenção para o que está aqui agora para ser aprendido e experimentado. Perceba a sua sabedoria como a união de tudo o que você viveu até agora, “bom” ou “mau”. Em vez de lamentar a vida que você poderia ter vivido, as escolhas diferentes que deveria ter feito, mergulhe na vida em que você está realmente. Observe o que você agradece e também o que deseja mudar. Veja o que pode ser aprendido na situação em que você está. Em vez de usar sua energia para torturar-se, infligir-se ódio pelas decisões que você tomou quando você deveria ter escolhido de outra forma, perdoe-se por ser quem você era naquele momento. Lembre-se de que, independentemente de como esse “você” atuou com todos os outros componentes incontroláveis da vida, suas intenções foram ser feliz. Fique do seu lado. E, acima de tudo, ao invés de brigar pelas escolhas que você fez, ofereça-se compaixão pelo desapontamento, sofrimento ou qualquer outra coisa que veio com a forma como a vida escolheu fluir.
Há apenas uma coisa que podemos saber com certeza, e isso é: seja qual for a situação em que estejamos, isso mudará. Isso mudará em parte através de nossas escolhas e em parte pela natureza eterna e mutável da vida. Em vez de desperdiçar sua atenção nas velhas escolhas feitas, momentos que se foram, transforme-a no seu mais poderoso presente, volte sua atenção para o que está aqui agora. Faça emergir o melhor de si, sua sabedoria e sua presença completa para a próxima escolha que se apresenta aqui com uma intenção sincera de fazer o melhor que puder com quem você é agora. Esteja nesta escolha, nesta vida, agora, e pare de imaginar que a realidade poderia ser ou poderia estar sendo algo diferente do que é.
Nancy Colier é psicoterapeuta, ministra inter-religiosa, autora, oradora e líder de oficinas. Colier está disponível para psicoterapia individual, treinamento de atenção plena, orientação espiritual, fala pública e oficinas, e também trabalha com clientes via Skype em todo o mundo. Para mais informações, visite NancyColier.com
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