Pesquisadores têm se destacado na busca de alternativas para o tratamento da fibrose cística (FC), uma doença genética que afeta mais de 100 mil pessoas pelo mundo e cerca de 10 mil brasileiros.
A FC é causada por mutações no gene que regula a proteína CFTR (sigla em inglês para “regulador da condutância transmembrana da fibrose cística”), essencial para o transporte de cloro, sódio e água nas células.
Mutação mais comum, a F508-del provoca a degradação prematura dessa proteína, resultando em graves complicações respiratórias e digestivas.
Recentemente, a farmacêutica Vertex introduziu os medicamentos Trikafta/Kaftrio, que têm demonstrado melhorar a expectativa e qualidade de vida de pacientes com fibrose cística.
A incorporação do Trikafta ao Sistema Único de Saúde (SUS), em março de 2024, facilitou o acesso ao tratamento para aproximadamente 1.700 pacientes no Brasil, eliminando o custo anual de cerca de US$ 360 mil por paciente.
Entretanto, mesmo com esse avanço, muitos pacientes ainda enfrentam sintomas persistentes e complicações. Isso evidencia a necessidade de desenvolver novas combinações de moduladores do CFTR, a fim de otimizar a função da proteína mutante.
Motivada pelo diagnóstico de fibrose cística de seu filho, a professora Camilla Buarque, do Departamento de Química da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio), se dedicou à pesquisa na área desde 2016.
Em parceria com o biomédico Miquéias Lopes Pacheco, da Universidade Emory, nos EUA, Buarque identificou duas moléculas promissoras, resultando no pedido de patente junto ao Instituto Nacional da Propriedade Industrial (Inpi).
Esses compostos fazem parte do portfólio de patentes da PUC-Rio, disponíveis para licenciamento pela indústria farmacêutica.
Novos compostos e química verde
Uma das inovações é a simplicidade e eficiência da rota sintética utilizada para produzir esses compostos, alinhada aos princípios da química verde — nos quais são desenvolvidos produtos e processos que reduzam ou eliminem o uso de substâncias nocivas à saúde humana e ao ambiente.
Distintos da combinação tripla do Trikafta, os novos compostos têm um arcabouço químico mais simples e demonstraram alta potência in vitro contra a mutação F508-del, a mais prevalente no mundo.
Esses compostos são apresentados como misturas de enantiômeros — compostos que diferem na forma como os átomos estão organizados no espaço. Embora quimicamente idênticos, eles podem ter interações biológicas diferentes.
Isso torna a obtenção de fármacos enantiomericamente puros fundamental para garantir segurança e eficácia nos tratamentos. A equipe de Buarque está focada em separar os enantiômeros e identificar qual deles é ativo e seguro.
O avanço da pesquisa é promissor, com o objetivo de desenvolver novos tratamentos que possam beneficiar os pacientes com fibrose cística. Embora o caminho ainda seja longo, os pesquisadores esperam que, com o devido investimento, essas novas alternativas terapêuticas possam se tornar uma realidade no combate à doença.