Por Judith Graham
No início deste ano, a Organização Mundial da Saúde anunciou uma campanha global para combater o preconceito etário contra adultos mais velhos, o qual é generalizado e prejudicial, mas muitas vezes não reconhecido.
“Precisamos mudar a narrativa em torno da idade e do envelhecimento”… “adotar estratégias para combater” [atitudes e comportamentos anti-idade], concluiu a OMS em um importante relatório da campanha.
Várias estratégias endossadas pela OMS – educar as pessoas sobre o preconceito etário, promover contatos entre gerações e mudar as políticas e leis para promover a igualdade etária – estão sendo testadas nos Estados Unidos. Mas um maior senso de urgência é necessário à luz do número chocante de mortes na pandemia da COVID-19, incluindo mais de 500.000 americanos mais velhos, sugerem os especialistas.
‘A COVID nos acertou na cabeça com um golpe’, [mostrando que] você não pode continuar fazendo a mesma coisa indefinidamente e esperar resultados diferentes” para os idosos, Jess Maurer, diretora executiva do Conselho de Maine sobre envelhecimento, declarou em um webinar de outubro sobre preconceito de idade nos cuidados de saúde, patrocinado pela KHN e pela Fundação John A. Hartford. “Você tem que abordar a causa raiz – e a causa raiz aqui é o preconceito etário”.
Alguns especialistas acreditam que há uma oportunidade única de enfrentar essa preocupação mediante ao que o país tem passado. Aqui estão alguns exemplos do que está sendo feito, especialmente em ambientes de saúde.
Distinguindo velhice de doença
Em outubro, um grupo de especialistas dos Estados Unidos, Canadá, Índia, Portugal, Suíça e Reino Unido exigiu que a velhice fosse removida como uma das causas e sintomas de doença na 11ª revisão do a Classificação Internacional de Doenças, um recurso global usado para padronizar dados de saúde em todo o mundo.
O envelhecimento é um processo normal e igualar a velhice à doença “é potencialmente prejudicial”, escreveram os especialistas no The Lancet. Isso poderia resultar em avaliação clínica e cuidados inadequados e um aumento da “marginalização e discriminação social” contra os idosos, alertaram.
Identificando crenças e linguagem preconceituosa
Uma pesquisa inovadora publicada em 2015 pelo FrameWorks Institute, uma organização que estuda questões sociais, mostrou que muitas pessoas associam envelhecimento com deterioração, dependência e declínio – um estereótipo que quase certamente contribuiu para a adoção de políticas que prejudicaram adultos mais velhos durante a pandemia. Por outro lado, os especialistas entendem que os adultos mais velhos variam amplamente em suas habilidades e que um número significativo é saudável, independente e capaz de contribuir para a sociedade.
Utilizando essa pesquisa e as subsequentes, a Iniciativa Reenquadrando o Envelhecimento, um esforço para promover a mudança cultural, tem trabalhado para mudar a forma como as pessoas pensam e falam sobre o envelhecimento, treinando organizações em todo o país. Em vez de expressar fatalismo sobre o envelhecimento (“um tsunami de prata que inundará a sociedade”), enfatiza a engenhosidade, como em “podemos resolver qualquer problema se resolvermos fazê-lo”, afirma Patricia D’Antonio, diretora de projeto e vice-presidente da política e assuntos profissionais na Gerontological Society of America.
Além disso, a iniciativa promove a justiça como um valor, da mesma forma em que “devemos tratar os idosos como iguais”.
Desde que começou, a American Medical Association, a American Psychological Association e a The Associated Press adotaram uma linguagem livre de preconceitos sobre o envelhecimento, e comunidades no Colorado, Nova Hampshire, Massachusetts, Connecticut, Nova Iorque e Texas assinaram como parceiros.
Combatendo o preconceito à idade pela raíz
Nos últimos três anos no Colorado, a Mudando a Narrativa, uma campanha de conscientização estratégica, realizou mais de 300 workshops educando o público sobre a linguagem, crenças e práticas relacionadas ao preconceito à idade. E agora, está lançando uma campanha que chama a atenção para o preconceito de idade na saúde.
“Nosso objetivo é ensinar as pessoas sobre as conexões entre o preconceito de idade e os maus resultados de saúde e mobilizar os idosos e os profissionais [da saúde] para advogar por melhores cuidados médicos”, afirmou Janine Vanderburg, diretora de Changing the Narrative.
Ao se deparar com o terrível impacto da pandemia, o Conselho de Maine sobre envelhecimento, no início deste ano, lançou o projeto Power in Aging, que está patrocinando uma série de conversas na comunidade sobre o preconceito etário e pedindo às organizações que façam uma “promessa contra o preconceito de idade“.
O objetivo é educar as pessoas sobre seu próprio “preconceito etário” – suposições amplamente inconscientes sobre o envelhecimento – e ajudá-las a entender “como o preconceito etário afeta tudo ao seu redor”, relatou Maurer. Para aqueles interessados em avaliar seu próprio preconceito etário, um teste do Projeto Implícito da Universidade de Harvard é frequentemente recomendado. (Inscreva-se e escolha a “age IAT” na próxima página).
Mudando a educação para profissionais da saúde
Dois anos atrás, a Escola de Medicina de Harvard começou a integrar a educação em geriatria e cuidados paliativos ao seu currículo, reconhecendo que não estava fazendo o suficiente para preparar futuros médicos no cuidado à idosos. Apesar do rápido crescimento da população idosa, apenas 55% das escolas de medicina dos EUA exigiam educação em geriatria em 2020, de acordo com os dados mais recentes da Associação de Faculdades de Medicina Americana.
A Dra. Andrea Schwartz, professora assistente de medicina, dirige o esforço de Harvard, que ensina aos alunos sobre tudo, desde os locais onde os adultos mais velhos recebem cuidados (lares de idosos, vida assistida, programas domiciliares, ambientes comunitários) até como gerenciar síndromes geriátricas, como quedas e delírio. Além disso, os alunos aprendem a conversar com os pacientes mais velhos sobre o que é mais importante para eles e o que mais desejam de seus cuidados.
Schwartz também presidiu um comitê de programas acadêmicos em geriatria que publicou recentemente competências mínimas em geriatria atualizadas, as quais qualquer graduado em medicina deve ter.
Alterando os requisitos profissionais
A Dra. Sharon Inouye, também professora de medicina em Harvard, sugere abordagens adicionais que podem levar a um melhor atendimento aos adultos mais velhos. Quando um médico busca certificação em uma especialidade ou médicos, enfermeiras e farmacêuticos renovam suas licenças, eles devem ser obrigados a demonstrar treinamento ou competência em “noções básicas de geriatria”, afirmou. E uma maior quantidade de ensaios clínicos deveriam incluir uma gama representativa de adultos mais velhos para construir uma melhor base de evidências para seus cuidados.
Inouye, uma geriatra, ficou particularmente horrorizada durante a pandemia quando médicos e enfermeiras não conseguiram reconhecer que idosos infectados com a COVID-19 estavam chegando às salas de emergência de hospitais com sintomas “atípicos”, como perda de apetite e delírio. Esses sintomas “atípicos” são comuns em adultos mais velhos, mas em vez de receberem os testes ou tratamento para a COVID, esses idosos foram enviados de volta à asilos ou comunidades onde ajudaram a espalhar infecções, relatou.
Trazendo especialização em geriatria
Se a pandemia tem um lado positivo, é que os profissionais médicos e os líderes do sistema de saúde observaram em primeira mão os problemas que se seguiram e perceberam que os adultos mais velhos precisam de consideração especial.
“Tudo o que nós, geriatras, temos tentado informar aos nossos colegas de repente entrou em foco”, afirma a Dra. Rosanne Leipzig, professora de geriatria da Escola de Medicina Icahn no Monte Sinai, na cidade de Nova Iorque.
Agora, mais cirurgiões do Monte Sinai estão pedindo geriatras para ajudá-los a lidar com pacientes cirúrgicos mais velhos, e especialistas em ortopedia estão discutindo o estabelecimento de um programa semelhante.
“Acho que o valor da geriatria aumentou à medida que as instituições percebem como cuidamos de idosos com casos complicados e como esse atendimento melhora os resultados”, relatou Leipzig.
Construindo sistemas de saúde amigáveis aos idosos
“Acredito que estamos em um ponto de inflexão”, afirma Terry Fulmer, presidente da John A. Hartford Foundation, que está apoiando o desenvolvimento de sistemas de saúde amigáveis aos idosos com a American Hospital Association, a Catholic Health Associação dos Estados Unidos e o Institute for Healthcare Improvement.
Mais de 2.500 sistemas de saúde, hospitais, clínicas médicas e outros prestadores de cuidados de saúde aderiram a este movimento, que estabelece quatro prioridades (“os 4Ms”) no cuidado de idosos : cuidar de sua mobilidade, medicamentos, mentação (cognição e saúde mental) e o que é mais importante para eles – a base para o cuidado centrado na pessoa.
A criação de uma estrutura padronizada para melhorar o atendimento aos idosos ajudou os profissionais e sistemas de saúde a saberem como proceder, mesmo em meio à enorme incerteza dos últimos dois anos. “Nós pensamos que [a pandemia] iria nos desacelerar, mas o que descobrimos, na maioria dos casos, foi o oposto – as pessoas poderiam se agarrar aos 4Ms para ter um senso de domínio e realização durante uma época de tamanho caos”, afirmou Fulmer.
Judith Graham é uma colunista colaboradora do Kaiser Health News, o qual publicou originalmente este artigo. A cobertura desses tópicos pela KHN é apoiada pela Fundação John A. Hartford, Fundação Gordon & Betty Moore e pela Fundação SCAN.
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