Matéria traduzida e adaptada do inglês, originalmente publicada pela matriz americana do Epoch Times.
A atração da internet é inegável. Usando apenas um celular, podemos nos conectar com quase qualquer pessoa no planeta e acessar todo o conhecimento humano em um instante. No entanto, em nossa busca incessante por informações e conectividade, sacrificamos algo vital: nossa conexão profunda com o mundo real e seus prazeres genuínos.
Como seres humanos, lutamos com a moderação—especialmente quando se trata de coisas que gostamos. Indústrias inteiras são construídas com base nessa tendência, desde as redes sociais até a indústria alimentícia, que é mestre em criar alimentos viciantes para manter você voltando para mais. Nosso consumo dessas atividades prazerosas até tem um nome—consumo hedônico.
O consumo hedônico pode soar como o nome do mais recente blockbuster de Hollywood, mas é o tema de um estudo recente, publicado no Journal of Personality and Social Psychology, que investiga por que exageramos—e a razão pode surpreendê-lo. A pesquisa analisou como a distração afeta o “consumo hedônico,” um termo que os pesquisadores usam para definir a indulgência excessiva em atividades prazerosas, como comer ou jogar videogames.
Stephen Murphy é pesquisador de pós-doutorado em psicologia na Universidade de Ghent, na Bélgica, e autor principal do estudo. Ele descreve o novo estudo em uma postagem no LinkedIn, dizendo que ele e seus colegas “visaram entender se o consumo excessivo de coisas e experiências prazerosas é em parte devido à falha em ‘extrair’ o prazer esperado do consumo hedônico. Por exemplo, não prestar atenção completa a um filme ou refeição leva a mais consumo posteriormente (por exemplo, lanches, assistir vídeos curtos no YouTube) porque a distração tornou essas atividades menos agradáveis?”
Os autores do estudo teorizam que uma das razões pelas quais exageramos é porque estamos distraídos enquanto participamos de atividades que achamos prazerosas. A equipe de pesquisa descobriu que quando não estamos totalmente focados durante essas atividades, tendemos a apreciá-las menos, fazendo-nos sentir menos satisfeitos. Como resultado, buscamos coisas ou atividades prazerosas mais tarde para preencher o vazio.
O estudo
O estudo foi conduzido em duas partes, a primeira focada na distração enquanto se come e a segunda em uma ampla gama de “domínios de consumo.”
Estudo 1
Para testar sua hipótese, os pesquisadores primeiro conduziram um experimento de campo com 122 participantes predominantemente do sexo feminino, principalmente entre 18 e 24 anos. As mulheres foram questionadas sobre quanto achavam que iriam gostar de seu almoço antes de comê-lo. Elas então comeram seu almoço em um de três ambientes: sem distração, com alguma distração, que envolvia assistir a um vídeo, ou altamente distraídas enquanto jogavam o videogame Tetris.
Após a refeição, as mulheres relataram vários fatores: quanto gostaram da refeição, seu nível de satisfação, se queriam gratificação adicional e, em caso afirmativo, quanto consumiram. Elas também registraram quaisquer lanches subsequentes mais tarde naquele dia.
Aquelas que comeram distraídas gostaram menos de suas refeições e ficaram menos satisfeitas. Elas também lancharam mais e sentiram uma necessidade maior de gratificação adicional depois.
Os pesquisadores chamam esse efeito de “compensação hedônica” e acreditam que também se aplica a atividades além de comer.
Por exemplo, suponha que você esteja distraído enquanto assiste a um filme porque está falando ao telefone ou dobrando roupas. De acordo com a teoria, você pode estar mais inclinado a buscar atividades que achou prazerosas mais tarde, já que não recebeu a quantidade de prazer que teria se estivesse totalmente focado no filme. Isso poderia se manifestar como um lanche noturno ou rolando nas redes sociais para preencher a lacuna.
Estudo 2
A segunda fase do estudo expandiu seu foco além da comida para avaliar o impacto mais amplo do efeito.
Este estudo envolveu mais de 6.000 “episódios de consumo” de várias atividades, incluindo alimentos, bebidas, mídia/áudio e leitura de lazer. O estudo utilizou um grupo de 220 participantes, predominantemente mulheres entre 18 e 71 anos. Cada uma foi solicitada a preencher sete pequenas pesquisas diárias sobre seu “consumo hedônico,” distração e nível de satisfação.
Os resultados alinharam-se com o primeiro experimento, que descobriu que aqueles que consumiam distraídos eram menos propensos a desfrutar da experiência, sentiam-se menos satisfeitos e sentiam uma necessidade maior de gratificação adicional posteriormente.
“O consumo excessivo muitas vezes resulta de uma falta de autocontrole,” disse o Sr. Murphy em um comunicado à imprensa. “No entanto, nossas descobertas sugerem que o consumo excessivo pode também ser frequentemente impulsionado pelo simples desejo humano de alcançar um certo nível de prazer de uma atividade. Quando a distração atrapalha, é provável que tentemos compensar consumindo mais.”
Os perigos da multitarefa
Embora muitos de nós abracem a multitarefa e seus benefícios percebidos, um corpo crescente de pesquisas sugere que não fomos projetados para isso. Um artigo na revista Cerebrum publicado em 2019 explorou a multitarefa e o cérebro. Os pesquisadores descobriram que ao realizar multitarefas:
– O cérebro tem que trabalhar mais.
– Ficamos mais facilmente distraídos.
– As tarefas demoram mais para serem concluídas.
– Cometemos mais erros.
Em última análise, eles descobriram que o cérebro é mais adequado para fazer uma coisa de cada vez.
Se você acha que pode ser a exceção, o estudo também descobriu que tendemos a superestimar nossa capacidade de realizar multitarefas de forma eficaz—e que essa habilidade percebida muitas vezes não se alinha com nossas habilidades reais.
Como o estudo inicial demonstrou, essa distração provavelmente também nos rouba o prazer que buscamos obter de uma atividade e nos faz buscar mais prazer mais tarde para compensar o déficit.
Quando as recompensas não são tão recompensadoras
O aumento do tempo de tela tem mostrado ter efeitos abrangentes na saúde e bem-estar. Esses efeitos negativos são particularmente pronunciados em crianças cujos cérebros ainda estão se desenvolvendo.
O Dr. Michael Rich é professor associado de pediatria na Harvard Medical School, professor associado de ciências sociais e comportamentais na Harvard T.H. Chan School of Public Health e diretor do Digital Wellness Lab no Boston Children’s Hospital. Em um artigo no site da Harvard, ele explica que a mídia digital é atraente porque ativa o sistema de recompensa do cérebro.
“Praticamente todos os jogos e redes sociais funcionam com o que é chamado de sistema de recompensa variável, que é exatamente o que você obtém quando vai ao Mohegan Sun e puxa a alavanca de uma máquina caça-níqueis. Ele equilibra a esperança de que você vai ganhar muito com um pouco de frustração e, ao contrário da máquina caça-níqueis, uma sensação de habilidade necessária para melhorar,” disse ele.
O artigo explica que gerenciar esse comportamento compulsivo é difícil para os jovens porque seus sistemas de autocontrole estão subdesenvolvidos enquanto seus cérebros ainda estão crescendo.
(Getty Images)
A dopamina é o neurotransmissor associado ao prazer e recompensa. Quando nos envolvemos em uma atividade que achamos prazerosa, o cérebro libera dopamina—fazendo-nos sentir bem. Obter curtidas nas redes sociais, ganhar no blackjack ou vencer o grande vilão no último videogame oferece doses rápidas e consistentes de dopamina e pode condicionar o cérebro a buscar mais dessas atividades porque elas nos inundam com esses produtos químicos que nos fazem sentir bem. No entanto, estudos descobriram que essa gratificação instantânea pode alterar o sistema de recompensa do cérebro e levar a uma diminuição do prazer em atividades que podem demorar mais para se concretizar—como ler um livro, cultivar amizades ou dominar uma habilidade. O efeito pode erodir nossos sentimentos de prazer por qualquer coisa que não seja imediatamente gratificante.
Reflexões finais
É quase impossível imaginar a vida sem computadores, tablets e celulares. Essas maravilhas tecnológicas transformaram a maneira como trabalhamos, aprendemos, nos entretemos e nos conectamos com os outros. Embora nossas telas ofereçam benefícios incríveis, em excesso, podem ser prejudiciais. Encontrar um equilíbrio que nos permita desfrutar e apreciar o mundo real é uma maneira de recuperarmos os prazeres e conexões que enriquecem nossas vidas e tornam a vida digna de ser vivida.