O confronto global pela liberdade de expressão | Opinião

Por Jeffrey A. Tucker
04/09/2024 15:35 Atualizado: 04/09/2024 15:35
Matéria traduzida e adaptada do inglês, publicada pela matriz americana do Epoch Times.

Acompanhei o trabalho do economista Robert Reich por décadas. Muito antes de ser Secretário do Trabalho na administração Clinton, ele já escrevia livros fascinantes sobre organização industrial e padrões de vida nos EUA. Concordando ou discordando, sempre aprendi com ele e apreciei o desafio de lidar com ideias que confrontavam minhas suposições sobre o mundo. Sempre o considerei um observador honesto.

Neste fim de semana, ele escreveu um artigo para o jornal britânico The Guardian, no qual pede a proibição da plataforma social X (anteriormente Twitter) e a prisão de seu proprietário, Elon Musk, por permitir “desinformação” e “informação incorreta” na plataforma. “Reguladores ao redor do mundo deveriam ameaçar prender Musk se ele não parar de disseminar mentiras e ódio no X”, escreveu ele.

Reich está entre muitos no campo da censura que proclamaram que certas visões são perigosas para a ordem pública e, portanto, dignas de punição.

O pedido de Reich para prender Musk acontece exatamente no momento em que o impensável ocorreu no Brasil. Um juiz da Suprema Corte, chamado Alexandre de Moraes, que aparentemente exerce um poder autocrático autônomo, baniu completamente a plataforma no país. Trata-se do aplicativo de notícias mais popular do Brasil. Além disso, ele impôs penalidades criminais para qualquer pessoa que use o aplicativo por meio de uma Rede Privada Virtual (VPN), no valor de US$ 10.000 por dia.

Claro, é algo que não pode ser aplicado, mas abre a possibilidade de investigações sobre cada dissidente político no país. Já surgiram graves questionamentos sobre a legitimidade da eleição de 2022, que tirou o ex-presidente Jair Messias Bolsonaro do poder e colocou no governo o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Os resultados da votação provocaram os maiores protestos públicos da história do país e endureceram uma resistência que depende de fontes alternativas de notícias, simplesmente porque a mídia tradicional no país parece amplamente controlada pelo governo.

Não é nem mesmo controverso afirmar claramente: esta censura não se trata de bloquear falsidades e informações incorretas. Trata-se de consolidar uma certa perspectiva política, a de Lula e seu partido. No contexto da proibição do X, o governo pressionou fortemente todas as outras plataformas de mídia social para banir várias contas e restringir vozes alternativas. Foram ordens secretas, emitidas dessa forma, mas todas as plataformas obedeceram.

Acreditando que tais solicitações contrariavam a legislação brasileira, a qual Elon Musk se comprometeu a seguir como é necessário, o X recusou-se a bloquear contas simplesmente porque um juiz ordenou. Afinal, a constituição brasileira diz o seguinte:

“Art. 5º IX – é livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença; Art. 220 – A manifestação do pensamento, a criação, a expressão e a informação, sob qualquer forma, processo ou veículo, não sofrerão qualquer restrição, observado o disposto nesta Constituição. § 2º – É vedada toda e qualquer censura de natureza política, ideológica e artística.”

Presumindo que essas palavras são a lei, Elon recusou-se a banir contas e incitou a ira do partido de Lula. Elon não está sozinho ao enfrentar esse dilema no mundo das tecnologias de comunicação. Toda plataforma tem um vasto histórico de contatos com agentes governamentais, em quase todos os países. A maioria obedece, o que explica por que a internet hoje é um lugar muito diferente de cinco anos atrás. O que foi chamado de “Complexo Industrial da Censura” está estruturado, é global e altamente eficaz.

Elon pagou 44 bilhões de dólares pelo Twitter precisamente porque queria que ele servisse como um baluarte contra as incursões à liberdade de expressão. Isso lhe custou imensamente em termos de receita publicitária. Os consórcios de publicidade boicotaram a plataforma. E lembre-se do motivo. Não é porque sua plataforma reformulada se inclinou politicamente à direita. É porque ela permite a liberdade de expressão dentro dos limites da lei. Isso não é o que os poderes vigentes desejam hoje em dia.

Observe que o Departamento de Estado dos EUA não expressou nenhuma oposição real ao que está acontecendo no Brasil, o que é profundamente perturbador. Dez ou quinze anos atrás, os Estados Unidos eram o principal defensor da liberdade de expressão no mundo. Insistia em mídias sociais abertas e livres de influência governamental, chegando ao ponto de condenar a Rússia por exigir uma brecha de acesso ao Telegram, e até parabenizando o CEO Pavel Durov por deixar o país.

Esses tempos parecem ter acabado, já que muitos membros da elite dos EUA – Robert Reich entre eles – tacitamente aprovaram o que está acontecendo no Brasil. Certamente, a chapa democrata não tem nada a dizer, enquanto os republicanos estão ao menos levantando a questão.

Tenho estado em contato próximo com brasileiros ao longo desse processo. Eles estão assustados. Sentem que estão próximos de serem os próximos na lista, não por terem apoiado a “insurreição” de 2022, que foi na verdade um protesto em massa. Meus amigos nunca duvidaram publicamente do resultado da eleição. E ainda assim, como opositores ao tipo de socialismo de Lula, sentem-se como alvos. E alertam que os EUA podem ser os próximos na lista.

Parece que a liberdade de expressão está por um fio. É útil imaginar como as coisas estariam se Elon não tivesse se levantado e dito não. Todas as outras plataformas seguiram completamente o curso, sem dizer nada publicamente, mesmo que ressentissem a pressão em privado. Elon e o X estão sendo alvo exatamente porque ele se levantou e disse abertamente que as ações do governo contradizem as leis do país, que ele jurou seguir.

Até o momento desta redação, o X está banido na China, Coreia do Norte, Rússia, Turcomenistão, Mianmar, Venezuela, Irã e agora no Brasil. Está banido em todos esses países por apenas um motivo: permite que as pessoas sejam expostas a uma variedade de pontos de vista. A questão aqui é simples. É política. Em todos esses países, você pode ter todo tipo de opinião sobre comida, música e tecnologia, mas deve evitar política e, em alguns casos, religião, que também está conectada à política.

A liberdade e a democracia dependem fundamentalmente de um público informado, que, por sua vez, exerce influência sobre o regime sob o qual vive. Essa é a ideia básica dos sistemas de governança pós-feudal. Se não temos isso, temos autocracia ou totalitarismo. Alguns países estão bem com isso. Mas, presumivelmente, as nações ocidentais preferem um caminho diferente, o que explica por que a liberdade de expressão ocupa uma posição tão exaltada na lei.

Agora esse compromisso está sendo colocado à prova, especialmente com as ferramentas de comunicação que abriram a gama de opiniões como nunca antes. Acreditamos que as pessoas têm o direito de falar e o direito de ouvir. É um grande comentário sobre o nosso tempo que isso tenha exigido a coragem e o compromisso de um homem, que por acaso é um multibilionário, para torná-lo real para o resto de nós.

Por causa das minhas muitas viagens ao Brasil e porque vários dos meus livros foram traduzidos para o português, desenvolvi um interesse especial por este caso. Fiquei chocado e entristecido ao ver que a própria cobertura do The New York Times se inclinou a favor das restrições. Nunca pensei que viveria para ver o dia em que um postulado tão fundamental da vida civilizada seria questionado e tão ameaçado em nossa época.

Quero a liberdade de ler e comentar os trabalhos de Robert Reich. Mas, de acordo com suas próprias palavras, ele não quer que você ou eu tenhamos o direito de ler perspectivas que contradigam suas próprias opiniões. Ninguém vence esse jogo. Um consenso forçado não é estável. Se os censores vencerem, herdarão o controle de uma população desconfiada e zangada. Ninguém se beneficia disso.

 

As opiniões expressas neste artigo são as opiniões do autor e não refletem necessariamente as opiniões do Epoch Times