Por Marcos Schotgues
Ao fim de 2018, a CGTN, mídia estatal da ditadura comunista chinesa, noticiava uma nova era de parceria entre seu país natal e a Argentina. À época o presidente Mauricio Macri e o ditador vitalício Xi Jinping haviam se encontrado cinco vezes em menos de três anos. Eram públicos os pronunciamentos sobre “uma nova era nas negociações sino-argentinas”.
Semana passada a jornalista Cleide Silva, do Estadão, publicou com imenso eco um anúncio de que a China substituiu o Brasil como maior parceiro comercial da Argentina em abril. É o ápice das interações entre Pequim e Buenos Aires que tomaram forma em 1972 como parte do projeto de Chou En-Lai e Mao Tsé-Tung para reabrir conversas comerciais com o ocidente. Na década de 1970, Mao estabeleceu em poucos anos relações com diversos países na América do Sul que, assim como os Estados Unidos*, alteraram seu reconhecimento diplomático da República da China, em Taiwan, para o regime totalitário do Partido Comunista Chinês (PCC).
Desde então, a constante expansão da influência amarela vem sendo entusiasticamente incentivada no continente. A China é hoje o parceiro de negócios mais importante da América do Sul. O valor do comércio mandarim com o Brasil, principal economia local, foi de 98,142 bilhões de dólares em 2019 de acordo com números publicados via Macau Hub, jornal chinês.
Entretanto, a cooperação econômica internacional com o Partido Comunista Chinês levanta preocupações, conforme alerta José Augusto de Castro, da Associação de Comércio Exterior do Brasil ao comentar sobre a situação sino-argentina: “No curto prazo não tem como reverter isso, pois o custo Brasil continua alto”, diz. “Mas se o Brasil deixar a China colocar seus pés na América do Sul, ela vai ocupar todos os países da região”.
De fato, é manifesto o interesse chinês em “ocupar todos os países da região”. O estarrecedor é isto ser tratado com tamanha naturalidade, e mesmo ser abraçado, tanto por governantes como pelo público em geral. Dois dos aspectos mais fundamentais destes eventos vêm sendo amplamente ignorados. Um deles é o fato de o comércio com a China mostrar-se algo feito por certo preço e sob certas condições.
Um regime que foi formado pelo comunismo soviético e que dedicou 71 anos de existência a matar mais de sua própria população em tempos de paz do que a somatória de mortos da 2ª Guerra Mundial, conflito mais intenso da história do mundo, possui imensas noções de controle, autoproteção e estratégias extrajudiciais de ação. Isto não é uma condição que possa ser ignorada, tratando-o como um mero competidor de mercado. A literatura acadêmica no assunto, como a obra “The Dictator’s Dilemma”, de Bruce Dickson, valida esta declaração.
Este preço e estas condições são muito bem expressos pelo antigo secretário de estado dos Estados Unidos, Rex Tillerson. Já em 2018, Tillerson postulava sobre a postura da China: “…encoraja dependência, usando contratos opacos, práticas de empréstimo predatórias e negociações corruptas para subjugar nações através de dívidas e minar sua soberania, negando-as crescimento sustentável em longo prazo”. Os exemplos de países levados tornarem-se reféns do Partido Comunista Chinês por estas circunstâncias abundam e de forma bem documentada. Sri Lanka; Paquistão; Montenegro; Ilhas Maldivas e Djibouti estão entre os mais explícitos, cedendo terra, infraestrutura, bases militares e controle sobre seu planejamento estrutural. É possível identificar diretrizes do PCC para a implantação deste modelo de negócios também em solo latino.
O segundo aspecto é o de que estabelecer comércio com a China pode, em essência, ser considerado falha moral e acovardamento perante a tirania. Se esta declaração pode a um leitor desavisado parecer extrema ou inverossímil, cabe explicação: este é um governo abertamente genocida. Seus crimes foram comprovados por corpos legais internacionais como o London China Tribunal. Investigações quanto a seus métodos utilizados para a tortura de prisioneiros de consciência foram indicadas a condecorações como o Prêmio Nobel, a exemplo do Kilgour-Matas Report. Não restam dúvidas de suas extensas atrocidades. Não há evidências da intenção de encerrá-las.
Para fins de proporção, estabeleça-se um paralelo compreensível ao ocidente: o comércio, de qualquer país com a China do Partido Comunista Chinês está, no mínimo, em equivalência moral com relações de negócios frente à Alemanha Nazista de Adolf Hitler. Exatamente como à época da década de 1930 estas eram tidas como livres de qualquer problema, ou ao menos viáveis, o governo Maoísta de Xi Jinping, originário do Marxismo-Leninismo, é tratado como propulsor de uma nação industrializada e moderna. O mundo todo, e certamente a América do Sul, deseja negociar com este.
Em assustadores esforços, a China, sob a boa vontade e cooperação plena e absolutamente irrestrita de governantes como Mauricio Macri e João Dória afirma-se perante o continente, jamais confrontada com os empecilhos aqui postulados. Ao contrário, vem a ser a principal parceira comercial da Argentina, desbancando da posição a maior economia regional, o Brasil.
Resta saber do equilíbrio entre a conivência com o inaceitável e a capacidade de reação frente ao nefasto: terão Argentina, Brasil e América do Sul compreensão, integridade e condições para impedir que se replique o destino dado aos países subjugados pelo Partido Comunista Chinês mundo afora?
*Os Estados Unidos mantém formalmente seu reconhecimento diplomático da China, e sua embaixada, junto à Pequim, abdicando pelo “Princípio de Uma Só China” estabelecido pelo Partido Comunista Chinês, governante da República Popular da China, desde 1979. É concedida aos Estados Unidos por Pequim uma série única de liberdades para interação não oficial com Taiwan em regime de exceção. Para fins de esclarecimento, postulamos que o TAIPEI Act, lei sancionada pelo governo dos EUA em março contendo manifesto apoio ao fortalecimento das relações entre Taiwan e os países do mundo não altera em caráter oficial o status diplomático firmado na década de 1970.
As opiniões deste artigo são ideias do autor e não refletem necessariamente os pontos de vista do Epoch Times.
Ajude nosso jornalismo independente doando um “café” para a equipe.
Veja também:
A conexão de Wall Street com a pandemia
As opiniões expressas neste artigo são as opiniões do autor e não refletem necessariamente as opiniões do Epoch Times