A “convergência estratégica” de China e Rússia para tentar quebrar a hegemonia de Estados Unidos e Europa inclui um aparato de propaganda que tem a América Latina como um importante objetivo, disseram, nesta quarta-feira, especialistas em uma reunião da Sociedade Interamericana de Imprensa (SIP).
O painel sobre a propaganda e desinformação dos dois países na América Latina abriu o segundo dia da reunião semestral da SIP.
“Rússia e China compartilham objetivos e uma visão estratégica do mundo que tem a ver com o fim da hegemonia ocidental. Esse é o elemento central que explica a relação bilateral que se fortaleceu na última década”, disse Nicolás de Pedro, do Institute for Statecraft, do Reino Unido.
Esta associação de dois países com “interesses concorrentes”, mas que partilham a opacidade na tomada de decisões, como disse o especialista, garante que a China não permitirá uma derrota catastrófica da Rússia na guerra com a Ucrânia, ao mesmo tempo que o gigante asiático está interessado em testar a reação do Ocidente aos movimentos agressivos da Rússia.
“Rússia e China insistem que a ordem atual é injusta e agressiva contra eles. Propõem uma ordem muito mais segura para as ditaduras”, acrescentou o especialista espanhol.
Por sua vez, Juan Pablo Cardenal, analista do Centro para a Abertura e Desenvolvimento da América Latina (CADAL), aludiu à estratégia do chamado “poder brando” desenvolvida pela China, através da qual fecha acordos institucionais de curto prazo, muitos deles com a mídia, e implanta um programa de recrutamento de elite voltado para acadêmicos, jornalistas, ex-diplomatas, entre outros.
Cardenal destacou que entre 2002 e 2020 houve pelo menos 326 reuniões e viagens de membros de partidos políticos latino-americanos à China, custeadas e coordenadas pelo Partido Comunista daquele país, e nas quais este se esmerou em oferecer uma imagem “amigável”, enquanto tenta silenciar “críticas e questões sensíveis”.
“É a exposição dessas pessoas influentes à propaganda do regime. É uma estratégia do poder brando que está funcionando muito bem para a China”, aprofundou o especialista.
A jornalista e pesquisadora Ludmila González Cerulli, apontou que a Rússia sistematizou suas narrativas em oito tópicos principais, entre eles se incluem “Ocidente é um inimigo que quer destruir a Rússia”, “As autoridades ucranianas são ultranacionalistas” e “O referendo da Crimeia foi uma iniciativa deles, e não da Rússia”.
O especialista disse que nesta campanha são ferramentas importantes os meios oficiais “Sputnik” e “Russia Today” (RT), muito presentes e ativos nas redes sociais, onde é mais difícil o trabalho de verificação da informação.
No início da sessão de hoje, o diretor-executivo da SIP, Ricardo Trotti, anunciou a morte, ontem, do jornalista Ricot Jean, que havia sido sequestrado no Haiti, elevando para 10 o número, cinco deles naquele país, dos jornalistas assassinados na região desde novembro do ano passado.
A SIP iniciou ontem sua reunião semestral de três dias, expressando o alarme causado pela deterioração das liberdades na região, mesmo em países com governos democraticamente eleitos.
“Temos sintomas inequívocos de que estamos atravessando um dos piores momentos para a democracia em nossas Américas”, advertiu o presidente da SIP, Michael Greenspon, diretor do “The New York Times”, na abertura do encontro.
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