A procuradora-geral do Equador, Diana Salazar, afirmou em entrevista à Agência EFE que boa parte do Estado foi infiltrada pelo crime organizado e pelo narcotráfico, em referência à crise que explodiu há algumas semanas e que levou o presidente do país, Daniel Noboa, a reconhecer a existência de um “conflito armado interno”.
Como exemplo dessa “infiltração”, Salazar mencionou o caso Metástasis, que no final do ano passado revelou uma possível trama de corrupção judicial, policial e carcerária em favor de estruturas criminosas, durante uma investigação sobre o suposto narcotraficante Leandro Norero, assassinado em 2022 na prisão de Latacunga.
“A Metástasis é um claro raio-x de como o crime organizado permeou muitas instituições do Estado. Nesse caso, temos réus do Tribunal Nacional e dos tribunais de justiça provinciais, do Conselho Judiciário, da Polícia Nacional, do Ministério Público, advogados, particulares e outros, todos trabalhando em troca de dinheiro do narcotráfico”, afirmou Salazar em declaração enviada por escrito.
Em risco permanente
Nos últimos meses, Salazar denunciou ameaças de morte e até mesmo um plano para assassiná-la, como aconteceu em 17 de janeiro com o promotor César Suárez, responsável pela investigação de vários crimes de alto nível, incluindo a recente invasão à emissora “TC Televisión” por um comando armado.
“As intimidações são um risco que correm todos os cidadãos que não querem um país controlado por narcotraficantes ou criminosos e que fazem algo para mudar a realidade atual”, disse.
“Como procuradora-geral, o risco pessoal é muito maior, porque – de certa forma – significa enfrentar todos os criminosos”, explicou Salazar, cujo dia a dia mudou radicalmente devido ao risco que corre constantemente.
“É como viver em prisão domiciliar. Já repeti isso várias vezes, não porque devo alguma coisa a alguém, mas porque os delinquentes querem vingança. Mas tenho fé que tudo ficará bem”, comentou.
Salazar, que ganhou o apelido de “dama de ferro” por conta de sua firmeza, disse que, apesar de tudo, não perde a esperança. “Nem tudo está perdido, mas é hora de agir, e é isso que estamos fazendo como instituição”, enfatizou.
“Estamos fazendo nosso trabalho para sair desse momento difícil (…), as pessoas que não foram tomadas pelo narcotráfico são a maioria nas instituições do Estado; se agirmos de forma coordenada, tiraremos o país dessa situação”, declarou.
Depois que vários promotores foram assassinados por facções criminosas, todos os funcionários do MP contam com segurança, para que “se sintam apoiados pela instituição no julgamento de crimes”.
Com relação às vítimas e testemunhas, a procuradora-geral disse que o sistema de proteção “foi declarado em emergência há quase dois anos, devido à falta de recursos”.
“Ninguém está acima da lei”
Questionada sobre as alegações feitas por várias ONGs sobre supostas violações de direitos humanos cometidas por membros das Forças Armadas durante operações nas prisões, Salazar enfatizou: “Ninguém está acima da lei. O MP investiga todos os fatos de que tem conhecimento”.
“Devido ao decreto (que declara o ‘conflito armado interno’), a polícia e as Forças Armadas agem sem a necessidade da presença de um promotor. Uma vez que os agentes ou militares concluem seu trabalho, eles entregam os resultados de suas ações à autoridade competente com os elementos que encontraram, para que o MP possa dar continuidade ao trabalho”, detalhou.
“Essa é a coordenação que existe: cumprir a lei, os prazos, para que se atue como se deve, sem violar os direitos das pessoas, e que as sentenças sejam cumpridas com as respectivas investigações. Cada instituição cumpre suas competências”, acrescentou Salazar.
A procuradora-geral agradeceu o apoio internacional à situação no Equador e enfatizou que o MP fortaleceu a cooperação com outros países “com o objetivo de enfrentar o crime organizado transnacional, porque esse é um dos eixos fundamentais dessa luta”, disse.
“Parte da natureza desse tipo de criminalidade é que ela não conhece fronteiras (…), para combatê-la é imperativo que os Estados se ajudem mutuamente”, concluiu a procuradora-geral, que cita como exemplo o recente golpe contra a máfia albanesa em uma operação conjunta entre Equador e Espanha que desmantelou um esquema que enviava grandes quantidades de cocaína para a Europa e tinha uma rede de empresas para lavar milhões de dólares.