A Rússia está cometendo “dezenas de Buchas” na Ucrânia, de acordo com a Truth Hounds, uma ONG que documenta os crimes de guerra russos na Ucrânia e que agora está investigando o recente assassinato de uma de suas colaboradoras, a escritora Victoria Amelina, em um ataque com mísseis contra uma pizzaria em Kramatorsk.
Meia dúzia de coletes à prova de balas estão pendurados nas paredes de um apartamento que, de outra forma, pareceria normal em Kiev.
Os coletes são indispensáveis para a equipe da ONG, que visita regularmente as áreas atacadas para coletar o máximo de evidências possível sobre os crimes cometidos pelas tropas russas no país invadido.
“O que a Rússia fez em Bucha não é uma aberração ou algo limitado a unidades ou soldados individuais. Documentamos crimes da mesma crueldade, embora nem sempre na mesma escala, em quase todos os lugares que visitamos”, explicou Roman Koval à EFE, mostrando um fragmento de uma bomba de fragmentação usada pela Rússia na região de Kharkiv.
“É assim que o exército deles opera, por meio de ataques direcionados contra civis, tortura, assassinato e sequestro”, enfatiza.
Koval documenta crimes de guerra desde 2018, enquanto a própria ONG foi fundada em 2014, em resposta à guerra iniciada pela Rússia em Donbas.
Essa experiência tem sido útil desde que a Rússia invadiu a Ucrânia em 2022, quando promotores e tribunais do país enfrentaram o enorme desafio de investigar dezenas de milhares de possíveis crimes de guerra.
A maior parte dessa carga recairá sobre eles, enquanto a Corte Penal Internacional e qualquer tribunal internacional possível lidarão com no máximo algumas dezenas de casos, explica Koval.
A Truth Hounds tem ajudado a capacitar promotores e juízes ucranianos que precisam demonstrar ao mundo que a Ucrânia pode ser confiável para investigar crimes de guerra.
A ONG, com uma equipe de cerca de 50 pessoas, também documenta possíveis crimes de guerra nas áreas afetadas e coleta depoimentos detalhados e metodologicamente sólidos que podem ser usados pelos promotores para construir um caso nos tribunais.
Os “documentadores”, a maioria dos quais permanece anônima por razões de segurança, conversam com testemunhas para obter respostas a duas perguntas: se o incidente em questão foi um crime de guerra e, em caso afirmativo, quem o cometeu, destaca Koval.
Por exemplo, a ONG estabeleceu que o bombardeio russo próximo a uma padaria em Chernihiv, em março de 2022, que matou pelo menos 14 pessoas e feriu 27, foi um crime de guerra devido ao uso injustificado da força em uma área civil sem a presença de militares.
Além de coletar depoimentos, a ONG analisou imagens de satélite e fontes abertas para determinar possíveis autores do ataque.
Atualmente, estão investigando o assassinato de uma de suas colaboradoras, a documentarista e escritora Victoria Amelina, que, junto com outras 12 pessoas, foi morta por um míssil russo de alta precisão que atingiu uma pizzaria em Kramatorsk, cerca de 45 quilômetros da linha de frente, em 27 de junho.
“Victoria deu voz a muitas pessoas que estavam sofrendo. Ela lhes deu esperança de justiça como verdade, e a justiça não era algo abstrato para ela”, lembra Koval.
Assim como Amelina, todos na Truth Hounds são motivados pelo desejo de estabelecer a verdade e fazer justiça àqueles que sofrem com a invasão russa, enfatiza Koval. A equipe agora fará tudo ao seu alcance para ajudar a responsabilizar os assassinos de Amelina.
A Truth Hounds também busca que promotores e tribunais de outros países, como Espanha e Argentina, investiguem os crimes de guerra russos na Ucrânia com base no princípio da jurisdição universal.
A gravidade dos crimes internacionais permite que eles “ultrapassem fronteiras” no sentido de que vários países podem investigar crimes cometidos em outros países se afetarem a segurança global ou, em um sentido mais estrito, envolverem cidadãos do país.
Isso tornaria muito mais difícil para os criminosos de guerra e para a Rússia, “um criminoso de guerra global”, evitar prestar contas, ressalta Koval.