Irã: três manifestantes mortos pela Guarda Revolucionária durante protestos que chocam país

01/01/2018 18:20 Atualizado: 01/01/2018 18:20

Três manifestantes iranianos foram assassinados pela Guarda Revolucionária do Irã na noite de sábado, 30 de dezembro, numa manifestação no centro do país, de acordo com a rede saudita Al-Arabiya.

O Irã não confirmou oficialmente os assassinatos, que teriam ocorrido em Doroud, na região central do Irã.

A maioria dos vídeos publicados nas redes sociais mostrou grandes protestos com milhares de participantes em cidades que incluem Teerã, Kermanshah, Zanjan, Arak, Shiraz, Bandar Abbas, Najafabad, Kashan, Ahvaz, Ardabil, Khorramabad e outras.

Um dos vídeos mostrou um manifestante que parece ter sido baleado diretamente no peito.

Em outro vídeo, pessoas numa multidão que foge de tiros são vistas carregando um manifestante ferido.

Os protestos contra o governo irromperam pelo terceiro dia no sábado, enquanto outras manifestações patrocinadas pelo Estado foram encenadas para marcar o fim do distúrbio que abalou o país, como em 2009, de acordo com agências de notícias iranianas e a mídia estatal.

Os manifestantes na cidade de Arak invadiram e ocuparam um complexo governamental, de acordo com um vídeo publicado pelo Iran Wire.

A agência de notícias semioficial Fars disse que até 70 estudantes se reuniram em frente à Universidade de Teerã e jogaram pedras na polícia. Um vídeo de mídia social mostrou-os cantando “Morte ao ditador”, uma aparente referência ao aiatolá Ali Hosseini Khamenei.

O vídeo mais tarde mostrou a polícia antichoque espancando e prendendo os manifestantes. A agência de notícias ISNA disse que um grupo de apoiadores do governo também se reuniu fora da universidade enquanto a polícia tentava dispersar os manifestantes. As autoridades fecharam duas estações de metrô próximas “até o fim da agitação”, informou a ISNA.

Outro vídeo pareceu mostrar forças de segurança prendendo manifestantes em outra parte de Teerã, com manifestantes gritando: “Deixem-no ir! Deixem ele ir!”

Em outro vídeo, que não pôde ser verificado, manifestantes na cidade ocidental de Dorud gritavam: “Morte ao ditador!”

Dezenas de manifestantes reuniram-se na cidade ocidental de Shahr-e Kord, disse a ISNA. Uma filmagem de mídia social pareceu mostrar um manifestante sendo ajudado por seus companheiros depois de ser atingido por gás lacrimogêneo.

O presidente estadunidense Donald Trump e sua administração expressaram apoio na sexta-feira aos protestos no Irã e condenaram a prisão de manifestantes pacíficos.

“Muitos relatos de protestos pacíficos por parte dos cidadãos iranianos insatisfeitos com a corrupção do regime e o desperdício da riqueza da nação para financiar o terrorismo no exterior”, declarou Trump no Twitter na noite de sexta-feira, 29 de dezembro.

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O Departamento de Estado dos EUA emitiu uma crítica forte ao regime iraniano numa declaração na sexta-feira, dizendo que os líderes do país “transformaram um país rico com uma rica história e cultura num Estado ladino e economicamente esgotado cujas principais exportações são a violência, o derramamento de sangue e o caos.”

Na mesma declaração, o Departamento de Estado ecoou os comentários anteriores de Trump e do secretário de Estado Rex Tillerson, afirmando que as maiores vítimas do regime iraniano são seu próprio povo e que os Estados Unidos apoiam uma transição pacífica do governo.

Trump destacou o Irã como o maior inimigo da paz e da prosperidade no Oriente Médio num discurso durante sua visita de Estado à Arábia Saudita em maio deste ano.

Irã, protestos, desemprego, inflação, corrupção - O presidente estadunidense Donald Trump fala durante a Cimeira Árabe Islâmica Americana no Centro de Conferência em Riade, Arábia Saudita, em 21 de maio de 2017 (Mandel Ngan/AFP/Getty Images)
O presidente estadunidense Donald Trump fala durante a Cimeira Árabe Islâmica Americana no Centro de Conferência em Riade, Arábia Saudita, em 21 de maio de 2017 (Mandel Ngan/AFP/Getty Images)

“Do Líbano ao Iraque e o Iêmen, o Irã financia, arma e treina terroristas, milícias e outros grupos extremistas que espalham a destruição e o caos na região. Durante décadas, o Irã alimentou o fogo do conflito sectário e do terror”, disse Trump. “É um governo que fala abertamente do assassinato em massa, prometeu a destruição de Israel, a morte para a América e a ruína para muitos líderes e nações nesta sala.”

Trump prosseguiu instando que “todas as nações de consciência” devem isolar o Irã, negar o financiamento do terrorismo, “e rezar pelo dia em que o povo iraniano tenha o governo justo e digno que merece”.

Irã, protestos, desemprego, inflação, corrupção - Pessoas protestam em Teerã, no Irã, em 30 de dezembro de 2017, nesta imagem obtida por meio das mídias sociais (Reuters)
Pessoas protestam em Teerã, no Irã, em 30 de dezembro de 2017, nesta imagem obtida por meio das mídias sociais (Reuters)

Descontentamento

A ocorrência de protestos políticos em público é rara na República Islâmica, onde os serviços de segurança são onipresentes.

Mas há um descontentamento considerável sobre o alto desemprego, a inflação e a suposta corrupção no governo. Alguns dos novos protestos tornaram-se questões políticas, incluindo o custoso envolvimento do Irã em conflitos regionais como os da Síria e do Iraque.

O desemprego aumentou e a inflação anual está em cerca de 8%, com a escassez de alguns alimentos contribuindo para preços mais altos e dificuldades para muitas famílias.

Abdolreza Rahmani-Fazli, o ministro iraniano do interior (que controla as forças de segurança pública do país), alertou contra as tentativas de promover protestos por meio das redes sociais.

Irã, protestos, desemprego, inflação, corrupção - Manifestantes protestam em Teerã, no Irã, em 30 de dezembro de 2017, nesta imagem de vídeo obtida pela Reuters
Manifestantes protestam em Teerã, no Irã, em 30 de dezembro de 2017, nesta imagem de vídeo obtida pela Reuters

“Pedimos às pessoas que não participem de reuniões ilegais. Se elas planejam uma reunião, elas devem solicitar uma (para obter uma aprovação)”, disse ele ao website de notícias Young Journalists Club.

Na quinta-feira, centenas de pessoas saíram às ruas em Mashhad, um dos lugares mais sagrados do islã xiita, para protestar contra os altos preços e gritar slogans antigoverno. A polícia prendeu 52 pessoas, de acordo com um funcionário judicial.

Os Estados Unidos condenaram as prisões, com o presidente Trump escrevendo no Twitter: “O governo iraniano deve respeitar os direitos das pessoas, inclusive o direito de se expressar. O mundo está assistindo!”

A mídia estatal citou o porta-voz do Ministério das Relações Exteriores, Bahram Qassemi, em resposta: “O povo iraniano não vê qualquer valor nas alegações oportunistas de funcionários americanos e do sr. Trump.”

Irã, protestos, desemprego, inflação, corrupção - Manifestantes protestam perto da Universidade de Teerã, no Irã, nesta imagem obtida por meio de mídia social, em 30 de dezembro de 2017 (Twitter/@kasra_nouri/via Reuters)
Manifestantes protestam perto da Universidade de Teerã, no Irã, nesta imagem obtida por meio de mídia social, em 30 de dezembro de 2017 (Twitter/@kasra_nouri/via Reuters)

Na sexta-feira, ocorreu a maior onda de manifestações desde 2009, quando os protestos se espalharam para Teerã e outras cidades.

A emissora estatal IRIB não cobriu os protestos, “depois de ter sido instruída pelos órgãos relevantes que a questão não deveria ser apresentada na rádio e na televisão estatais”, afirmou seu website da internet citando um funcionário anônimo.

Maioria dos detidos é libertada

A maioria dos presos nos últimos dois dias foi libertada, afirmou a TV estatal, sem fornecer maiores detalhes.

“Os websites inimigos e a mídia estrangeira continuam tentando explorar as dificuldades econômicas e as legítimas demandas das pessoas a esse respeito para realizar reuniões ilegais e organizar possíveis distúrbios”, afirmou.

A Guarda Revolucionária e sua milícia Basij, que liderou a repressão de segurança que esmagou os protestos de 2009, disse numa declaração divulgada pela mídia estatal: “A nação iraniana… não permitirá que o país seja prejudicado.”

Irã, protestos, desemprego, inflação, corrupção - Oponentes do presidente iraniano Hassan Rouhani se manifestam diante da embaixada iraniana no oeste de Londres em 31 de dezembro de 2017 (Eddie Keogh/Reuters)
Oponentes do presidente iraniano Hassan Rouhani se manifestam diante da embaixada iraniana no oeste de Londres em 31 de dezembro de 2017 (Eddie Keogh/Reuters)

Embora protestos puramente políticos raramente sejam vistos no Irã, manifestações são frequentemente realizadas por trabalhadores devido a demissões ou não pagamento de salários e por pessoas que detém depósitos em instituições financeiras não bancárias que faliram.

A maior conquista do presidente Hassan Rouhani, um acordo de 2015 com as potências mundiais que restringiram o programa nuclear do Irã em troca do levantamento da maioria das sanções internacionais, ainda não viu os amplos benefícios econômicos que o governo diz estarem chegando.

O desemprego atingiu 12,4% neste ano fiscal, de acordo com o Centro de Estatística do Irã, subindo 1,4% e deixando cerca de 3,2 milhões de iranianos sem emprego.

Irã, protestos, desemprego, inflação, corrupção - Manifestantes protestam perto da Universidade de Teerã, no Irã, nesta imagem obtida por meio de mídia social, em 30 de dezembro de 2017 (Twitter/@kasra_nouri/via Reuters)
Manifestantes protestam perto da Universidade de Teerã, no Irã, nesta imagem obtida por meio de mídia social, em 30 de dezembro de 2017 (Twitter/@kasra_nouri/via Reuters)

Colaborou: Reuters

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