Ex-juiz do Supremo Tribunal venezuelano se desculpa por ter feito parte do governo de Maduro

09/01/2019 16:42 Atualizado: 09/01/2019 16:42

Por VOA

Christian Zerpa, juiz do Supremo Tribunal de Justiça (TSJ, na sigla em espanhol) da Venezuela que fugiu para os Estados Unidos, lamenta ter contribuído para a situação em seu país.

Em uma entrevista para a rádio Voz da América, Zerpa pediu desculpas aos venezuelanos por não ter se oposto às situações que levaram o país a mergulhar em uma das maiores crises do hemisfério.

O Supremo Tribunal de Justiça da Venezuela é um dos cinco poderes que compõem o Estado venezuelano, o poder judicial e, portanto, é o tribunal mais importante do país.

Zerpa foi nomeado magistrado da Câmara Eleitoral do TSJ pela Assembleia Nacional em dezembro de 2015, quando o partido no poder ainda controlava esse órgão, em um processo que a oposição descreveu como “expresso” porque foi realizado em menos de um mês, antes de que o Parlamento mudasse de mãos e os selecionados ficassem ligados ao governo.

Zerpa, até o momento de deixar a Venezuela, foi leal a Nicolás Maduro e um dos magistrados que lhe permitiu retirar os poderes da Assembleia Nacional (Congresso venezuelano).

A que você poderia se opor estando dentro do Tribunal?

O TSJ é um órgão colegiado e, por mais que eu me opusesse, seria voto vencido. O que eu poderia ter feito era ter renunciado, não ter assumido o cargo mas, infelizmente, não o fiz no devido tempo.

Por que você tomou a decisão de deixar o país?

Faço parte do TSJ desde 2015 e já em 2016, tendo em vista a deterioração da situação política e econômica na Venezuela, considerei a ideia de deixar o país, mas estava preparando as condições para fazê-lo, porque não foi fácil.

E como você conseguiu isso? O que diz dos rumores que afirmam que você tinha muito dinheiro para poder deixar o país?

Eu não sei a que se referem quando dizem muito dinheiro. Fiz o que muitos venezuelanos fizeram quando tiveram que deixar o país: vendi o pouco que tinha para poder ter dinheiro que me permitisse ficar alguns dias aqui nos Estados Unidos.

Você está solicitando asilo por perseguição política?

Sim, estou pensando em pedir, eu entrei como turista e vou pedir asilo porque minha vida e a de meus parentes próximos, minha esposa e meus filhos estão em perigo na Venezuela. Se as autoridades norte-americanas me permitirem ficar neste país, terei que começar a trabalhar porque não trouxe dinheiro suficiente para ficar mais do que um ou dois meses sem trabalhar.

Existem outros membros dentro do TSJ que pensam como você?

Eu sei que muitos deles compartilham as mesmas preocupações que eu. Infelizmente não podem tomar a mesma decisão porque temem por suas famílias, temem pelos bens que possuem na Venezuela, mas sei que precisam refletir e não podem se prestar à farsa de legitimar com a sua presença a investidura de Maduro em 10 de janeiro.

Qual é sua relação com Maikel Moreno, o presidente do TSJ?

Eu nunca tive boas relações com ele e hoje ele está me atacando. Ele é um criminoso, há provas contundentes contra ele, contra seu modo de proceder, que usa o Judiciário para patrocinar seus interesses econômicos, é uma pessoa que causou muito dano ao Judiciário na Venezuela. Hoje, o poder judiciário na Venezuela está no chão graças a atitudes como as que vem sendo adotadas nos últimos anos [por Moreno].

Como Moreno se tornou magistrado?

Ele foi expulso do Judiciário. No entanto, Raúl Gorrín, por ser o testa de ferro de [Cilia] Flores e Maduro, incentivou a participação de Moreno no concurso dos magistrados. Eles precisavam de uma pessoa igual a eles, sem escrúpulos, dentro do tribunal; é por isso que ele conseguiu, porque ele é igual a eles. Ele vai mentir, fazer o que eles querem que ele faça com base no único interesse que eles têm que é se manter no poder.

Você foi sancionado pelo Canadá, o que acha das sanções que outros países estão aplicando aos funcionários do governo de Maduro?

O Canadá me puniu porque fui falar com o embaixador canadense em 2017 e eles me pediram para falar publicamente contra o presidente Nicolás Maduro. Isso não era viável naquele momento porque eu poderia arriscar minha vida e eles não entenderam. Eu não cometi nenhum crime de corrupção, mas acredito que aqueles que o fizeram devem ser punidos. Não pode ser que, por seu egoísmo, tenham condenado o povo da Venezuela a viver na miséria.

O governo de Maduro está ligado ao tráfico de drogas?

Sim. A Venezuela tornou-se um país [para o] trânsito de drogas da Colômbia e de outros países e, infelizmente, as autoridades ficaram genuflexas.

Você tem provas disso?

Eu tenho testemunhas, não tenho documentos porque não trabalhei em agências de inteligência ou algo assim. Só conheço situações, fatos que se evidenciaram.

O que você sabe sobre o chefe do Serviço Bolivariano de Inteligência da Venezuela (SEBIN), Gustavo González López?

Eu não sei os detalhes, tudo o que sei é que ele está desaparecido desde outubro. Há rumores de sua morte e de que foi o governo que o assassinou.