Especulação imobiliária muda coração de Lisboa

A mudança é mais profunda em cidades como Lisboa e Porto, onde a especulação fez os preços dos imóveis dispararam

09/09/2018 23:59 Atualizado: 10/09/2018 00:20

Por Agência EFE

Acompanhada de belas imagens de praias virgens próximas a Lisboa, a cantora Madonna se tornou uma das principais garotas-propaganda da cidade europeia da moda, um fenômeno que, no entanto, está mudando o coração da capital portuguesa, dominada pela especulação imobiliária.

“Isto é Portugal. Isto é o paraíso”, escreveu Madonna em uma conhecida rede social. A mensagem veio acompanhada de imagens, gravadas com um drone, na qual ela cavalgava com seus filhos no exclusivo balneário de Comporta, que fica a uma hora de Lisboa.

Não é a primeira vez que a cantora, que vive em um palacete na capital portuguesa, destaca as virtudes do país, que passa por uma profunda transformação devido ao turismo e ao investimento externo.

A mudança é mais profunda em cidades como Lisboa e Porto, onde a especulação fez os preços dos imóveis dispararem. Milhares de portugueses deixaram as regiões centrais por causa dos custos e foram obrigados a se mudar para áreas periféricas mais baratas.

O fenômeno tem afetado inclusive espaços simbólicos, como a quase centenária Pastelaria Suiça, na famosa Praça do Rossio. Agora, o local foi comprado por um grupo de investimentos da Espanha.

Passaram pela confeitaria nomes como María Callas e Orson Wells, na época dourada de Lisboa, que agora volta ter um “boom” de moradores ilustres, como Madonna, Harrison Ford e John Malkovich.

“Durante décadas, lanchei e jantei aqui. Vinha desde criança com a minha família. Nesta mesma mesa, morreu meu pai há 16 anos”, disse o presidente de Portugal, Marcelo Rebelo de Sousa, que foi à despedida organizada pela pastelaria.

O destino da Suíça estava decidido desde junho, quando o proprietário anunciou que fecharia as portas no fim do verão europeu. O local foi comprado por um fundo de investimentos que tem participação do tenista espanhol Rafael Nadal.

Aproveitando a popularidade do atleta, o Fórum Cidadania Lx, focado em denunciar a perda do patrimônio de Lisboa, escreveu uma carta a Nadal. O texto pede que o tenista não “mate a memória da cidade” e afirma que não há ninguém em Lisboa que não saiba onde fica a confeitaria.

Poucos metros além da Suiça, outro emblemático restaurante de comida tradicional portuguesa, o Ano Novo, fechou as portas após o novo dono do prédio, estrangeiro, se negar a renovar o aluguel.

Tudo isso ocorre em meio a uma escalada nos preços dos imóveis e dos aluguéis em Lisboa. Apesar dos alertas sobre uma bolha imobiliária, nada indica que a especulação vá diminuir.

Muitos estabelecimentos que fecham devem ser transformados em edifícios de luxo, como vai ocorrer com outra das joias de Lisboa, a antiga sede do “Diário de Notícias”, erguida em 1940 na Avenida da Liberdade, hoje uma das mais caras do mundo.

O imóvel, adquirido por uma imobiliária no ano passado por 20 milhões de euros, será remodelado para receber 34 apartamentos, distribuídos em cinco andares, que serão comercializados por até 1,7 milhão de euros.

Os novos proprietários ainda não revelaram o valor da cobertura, um espaço de 400 metros, com quatro suítes, outros 400 metros de terraço exterior e acesso independente.

Apesar dos alertas sobre os riscos de bolha, a agência de classificação Standard & Poor’s previu que o preço médio dos imóveis crescerá 9,5% neste ano em Portugal, impulsionado pela demanda estrangeira que não para de crescer.

Só no primeiro trimestre deste ano, os imóveis ficaram 12,2% mais caros no país. Em Lisboa, a alta foi de 20%. No Porto, de 23%.

“O progresso, a mudança, tem custos urbanísticos e humanos” resumiu, resignado, Rebelo ao se despedir da Suiça.