Conversas com Coreia do Norte são uma farsa, dizem especialistas

10/01/2018 17:58 Atualizado: 10/01/2018 17:58

A recente disposição da Coreia do Norte de manter conversações com a Coreia do Sul é uma estratagema para ganhar tempo ou impedir uma possível invasão dos Estados Unidos ou ambas as coisas, de acordo com dois especialistas.

Muito tem sido arguido sobre a repentina vontade da Coreia do Norte de dialogar com a Coreia do Sul. Alguns comentaristas credíveis têm considerado o movimento um avanço diplomático. Outros têm pintado a possível participação de dois patinadores artísticos norte-coreanos nas próximas Olimpíadas de Inverno como um ponto de virada num problema de décadas que viu o regime mais opressivo do mundo se tornar um Estado nuclear.

Mas qualquer esperança de que o atual ramo de oliveira da Coreia do Norte possa se traduzir numa mudança significativa na Península Coreana é uma ilusão, de acordo com Rick Fisher, um membro sênior do Centro Internacional de Avaliação e Estratégia.

Fisher acredita que durante a atual crise, a Coreia do Norte alinhou o mundo inteiro contra ela, com apenas dois tensos aliados, a China e a Rússia, que poderiam oferecer suporte credível.

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Sem mais lugar para onde ir, e com as sanções agora apertando fortemente a economia norte-coreana, o regime comunista de Kim Jong-un está encarando uma ameaça real de uma nova administração estadunidense que colocou a força militar de volta à mesa.

A Coreia do Norte não pode mudar isso por meio da força, então o regime de Kim Jong-un está tentando uma abordagem diferente.

“Eles pensam que podem enfraquecer um pouco o crescente consenso liderado pelos Estados Unidos por algum tipo de ação contra eles, mostrando-se agradáveis em relação ao Sul”, disse Fisher.

Para a Coreia do Sul, a memória de uma guerra devastadora e a possibilidade de outra são suficientes para querer preservar qualquer esperança de que a Coreia do Norte possa ser sincera.

Mas Kim Jong-un disse especificamente que seus mísseis balísticos armados com armas nucleares são destinados aos Estados Unidos, fazendo qualquer otimismo ser perigosamente imprudente.

Fisher deixa pouca margem para ingenuidade em sua análise.

A Coreia do Norte continuará sendo, e incrementando, uma ameaça de míssil nuclear para o mundo e especialmente para os Estados Unidos, disse ele.

A atual abertura diplomática é um tipo de recuo tático, uma maneira de aliviar a pressão que se acumulou e que representa uma possibilidade perigosa que a Coreia do Norte não quer enfrentar.

“Os norte-coreanos querem romper a bolha de um consenso internacional liderado pelos Estados Unidos que, se necessário, uma ação militar deve ser tomada contra a Coreia do Norte.”

Fisher disse que ao iniciar um diálogo, a Coreia do Norte espera diluir esse consenso. Isso dá tempo ao regime, a única coisa que Kim Jong-un precisa tanto quanto dinheiro.

Fisher concorda com outras avaliações de inteligência que a Coreia do Norte está a um ano de ser capaz de explorar plenamente seus atuais programas nucleares e de mísseis, combinando-os para criar um míssil balístico intercontinental (ICBM) capaz de transportar uma ogiva nuclear com sucesso para atingir um alvo terrestre.

O regime de Kim Jon-un também precisa de tempo para terminar a construção de um submarino maior, bem como um míssil lançado por submarino que possa representar uma ameaça para o Japão.

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Fisher não é o único que pensa que as negociações provavelmente não darão frutos.

Steven Mosher, presidente do Instituto de Pesquisa Populacional e autor do livro recém-publicado “Bully of Asia: Why China’s Dream is the New Threat to World Order“, pensa que a Coreia do Norte está comprando, ou melhor sendo subornada por, tempo.

“Do ponto de vista dos EUA, as negociações passadas com a Coreia do Norte não conseguiram nada. Do ponto de vista norte-coreano, no entanto, eles conseguiram exatamente o que pretendiam. Eles ganharam tempo para a Coreia do Norte e mais de um bilhão de dólares em ajuda americana das gestões Clinton e Bush”, disse ele.

Esse dinheiro e o tempo foram essenciais para os atuais programas de mísseis e de armas nucleares da Coreia do Norte, disse Mosher. Agora, o regime está entrando na etapa em que pode combinar essas duas tecnologias.

Ele só precisa de mais tempo e talvez algum dinheiro, nenhum dos quais é possível por meio da força ou provocações adicionais. Sem outra opção disponível, a Coreia do Norte tem de apresentar o seu cartão de conversa.

E não há um país tão pronto e disposto a conversar com a Coreia do Norte como a Coreia do Sul. Enquanto o Japão e os Estados Unidos exigem uma linha dura em relação ao regime de Kim Jong-un, Seul permanece mais aberta e otimista.

“As sanções estão começando a morder, e Kim Jong-un está acessando o elo mais fraco das alianças EUA-Japão e EUA-Coreia do Sul, que é a Coreia do Sul”, disse ele.

Mosher concorda com Fisher que a Coreia do Sul é movida por suas simpatias naturais com os cidadãos comuns norte-coreanos, pessoas traumatizadas pelo atual regime. Há também a memória de uma guerra devastadora e a possibilidade muito real de que a artilharia norte-coreana possa reivindicar milhões de vidas na Coreia do Sul.

Mas, embora esses sentimentos possam exortar a Coreia do Sul a fazer todos os esforços possíveis para uma solução diplomática, Mosher disse que, enquanto isso, a Coreia do Norte continuará a construir febrilmente mísseis e armas nucleares.

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“A chave para resolver o dilema norte-coreano não será encontrada nas negociações entre a Coreia do Norte e a Coreia do Sul, mas na pressão dos EUA no ‘patrocinador’ da Coreia do Norte, a China”, disse Mosher. “Enquanto Kim Jong-un estiver convencido de que ele tem do apoio silencioso da China, ele não tem absolutamente qualquer razão para mudar seu comportamento.”

Isso soa bastante coerente, uma vez que a Coreia do Norte continuar a desenvolver mísseis balísticos intercontinentais (ICBMs) capazes de transportar ogivas nucleares miniaturizadas que se acredita que o regime de Kim Jong-un já possua.

Mosher acredita que a abordagem vigorosa de Trump fez Kim Jong-un pausar e retardar os testes de mísseis da Coreia do Norte.

Mas, para uma mudança mais duradoura, os Estados Unidos precisam quebrar a aliança China-Coreia do Norte.

Mosher disse que a Coreia do Norte recebeu e aproveitou “subornos enormes” das gestões anteriores de Bush e Clinton, subornos facilitados pela China.

Fisher também acredita que a China é a chave para resolver o dilema da Coreia do Norte. Para a China, a Coreia do Norte é um bicho-papão perfeitamente projetado para distrair os recursos militares dos Estados Unidos.

E se uma guerra começar, os Estados Unidos usariam um poder militar e financeiro significativo, deixando-o enfraquecido e menos capaz de impedir a China de reivindicar Taiwan.

Fisher disse que outra guerra coreana poderia acelerar o cronograma da China para conquistar Taiwan.

Segundo sua opinião, a melhor solução para todos esses problemas é reintroduzir armas táticas nucleares na Ásia, algo que a gestão Bush removeu durante seus esforços anteriores para negociar com a Coreia do Norte o encerramento de seu programa de armas nucleares.

Com esse esforço claramente fracassou, as armas nucleares táticas na porta de Kim Jong-un fariam muito para convencer Kim e a China de que a guerra não é do interesse de ninguém.

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