As informações confiáveis sobre 2.145 crianças que desapareceram da Ucrânia em circunstâncias especiais estão diminuindo com o passar do tempo, o que exige a coleta de dados genéticos dos familiares para manter vivos seus rastros diante dos esforços da Rússia para “doutriná-las a esquecer” suas raízes, disseram especialistas internacionais na quarta-feira (19).
Em uma reunião organizada nesta quarta-feira em Haia pela Comissão Internacional sobre Pessoas Desaparecidas (ICMP), especialistas estrangeiros e ucranianos, além de representantes da comunidade internacional, discutiram a necessidade de melhorar a visão estratégica da Ucrânia para localizar dezenas de milhares de pessoas desaparecidas, incluindo crianças deportadas ilegalmente.
O Registro Unificado de Pessoas Desaparecidas em Circunstâncias Especiais lista atualmente 2.145 indivíduos que tinham menos de 18 anos de idade no momento de seu desaparecimento.
A deportação ilegal de crianças é um crime de guerra segundo o Estatuto de Roma, o tratado fundador do Tribunal Penal Internacional (TPI), e foi objeto de dois mandados de prisão emitidos em março do ano passado contra o líder russo, Vladimir Putin, e Maria Lvova-Belova, comissária presidencial russa para os direitos das crianças, ambos acusados de serem supostamente responsáveis pela transferência forçada de crianças para o território russo.
A rainha Noor da Jordânia, comissária da ICMP desde 2001, enfatizou que há consenso sobre o papel “crucial” que um banco de dados central desempenharia ao reunir a “riqueza de informações” sobre pessoas desaparecidas que foram coletadas por diferentes agências.
Ele também enfatizou que há consenso entre os que trabalham com essa questão sobre a necessidade de comunicação constante com as famílias dos desaparecidos e uma campanha de divulgação para coletar dados genéticos de dezenas de milhares de parentes que residem dentro e fora da Ucrânia.
Artur Dobroserdov, comissário para Pessoas Desaparecidas da Ucrânia, alertou que, embora a invasão russa tenha começado em 2022, “a agressão já começou em 2014 e, como consequência, há muitas pessoas que foram mortas, feitas prisioneiras ou desapareceram”.
“Agora entendemos a magnitude do problema. Essas crianças são o nosso futuro. Precisamos fazer o que pudermos para trazê-las de volta. Entendemos que, com o passar do tempo, muitas coisas mudam, até mesmo os nomes e sobrenomes dessas crianças, porque (a Rússia) faz todo o possível para que elas esqueçam suas raízes e seus parentes”, declarou Dobroserdov.
Ele observou que as informações confiáveis sobre pessoas desaparecidas diminuem com o tempo e é crucial que os dados sejam registrados e armazenados adequadamente porque no futuro, as fontes primárias podem não existir mais ou podem ser distorcidas, não refletindo a situação real.
Kateryna Rashevska, especialista jurídica do Centro Regional de Direitos Humanos, alertou que a deportação ilegal nunca ocorre isoladamente de outras violações dos direitos das crianças cometidas durante os conflitos e que, segundo ela, uma vez sob controle russo, a essas crianças é imposta a nacionalidade russa, um sistema de educação formal e informal com elementos de doutrinação política e militarização.
Ela lembrou que essa prática viola vários direitos da criança, como o direito ao uso de sua própria identidade e idioma nacional, à educação – dado o contexto de doutrinação – e à família – ao remover a criança de seu contexto familiar e não permitir que ela seja recuperada de seus pais adotivos russos.
A tecnologia disponível pode ajudar a rastrear essas pessoas desaparecidas tanto no curto prazo quanto por décadas.
Sara Huston, cofundadora da DNA Bridge, uma organização que trabalha para reunir famílias por meio do uso do DNA, disse que, se usada em colaboração com a sociedade civil, a infraestrutura que ajuda as famílias enlutadas pode ser adaptada para reunir membros vivos da família, e por isso pediu um sistema global de bancos de dados de material genético.