O primeiro-ministro australiano Malcolm Turnbull disse que não se omitirá em defender os interesses de seu país após as críticas de Pequim sobre comentários anteriores feitos sobre relatos de interferência chinesa nos assuntos da Austrália.
Falando aos jornalistas no sábado, Turnbull rejeitou as críticas do porta-voz do Ministério das Relações Exteriores da China, Geng Shuang, que afirmou na sexta-feira que o líder australiano estava comentando sobre “reportagens irresponsáveis de algumas mídias australianas”.
Um dia antes, Turnbull disse que levava muito a sério os relatos na mídia sobre a intromissão chinesa na política australiana e na comunidade mais ampla.
“Estamos bastante insatisfeitos com essas observações e apresentamos representações severas com o lado australiano”, afirmou Geng Shuang.
Em resposta aos comentários de Geng Shuang, Turnbull disse que iria “se levantar” pelos australianos.
“A China moderna foi fundada em 1949 com estas palavras: ‘O povo chinês levantou-se.’ Era uma afirmação de soberania, era uma afirmação de orgulho”, disse Turnbull, informou a ABC, enquanto ele alternava entre mandarim e inglês.
“E nós nos levantamos e dizemos, ‘Povo australiano, levante-se!’”, disse ele.
Embora a exatidão histórica das referidas palavras de 1949 tenha sido negada ou duvidada por especialistas em China, os comentários de Turnbull têm sido vistos como uma forte reprovação às críticas de Pequim em meio a preocupações generalizadas com a interferência do Partido Comunista Chinês nos assuntos australianos.
Reportagens da mídia resultaram no governo federal introduzindo leis mais duras contra a interferência estrangeira, o que também irritou Pequim.
O analista de defesa Malcolm Davis, do Australian Strategic Policy Institute, disse à ABC que Pequim estava tentando intimidar a Austrália reclamando sobre qualquer referência à sua intromissão na política doméstica.
“Eles estão tentando nos intimidar e o que temos de entender é que os relatos de infiltração chinesa e das tentativas de manipulação na política australiana e no debate político australiano são legítimos”, disse Davis.
“Os chineses estão buscando interferir no nosso processo político.”
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Ele disse que Pequim visa conquistar uma vantagem estratégica em relação aos EUA.
“Em última análise, seu objetivo é que a Austrália se torne mais pró-China e menos pró-EUA, que se alinhe a Pequim e se distancie dos Estados Unidos e, por fim, acabe com a aliança”, disse Davis.
“Todos entendem as motivações da China, a diferença agora e que começamos a resistir contra isso.”
Joe Hockey, o atual embaixador da Austrália nos Estados Unidos, disse a um fórum em Canberra na semana passada que “isso é uma questão séria, pois representa uma ameaça para o que muitos australianos lutaram e morreram, ou seja, uma democracia livre, transparente e aberta”, relatou a ABC.
Hockey disse que foi repetidamente abordado por autoridades americanas preocupadas com os relatos de que Pequim está tentando influenciar os políticos australianos atuais e antigos por meio de doações, de acordo com reportagem da ABC.
“Trata-se de se intrometer nas eleições de outro país e, sim, isso é tratado muito seriamente”, disse ele.
“Os americanos abordam essa questão comigo o tempo todo porque isso também está diretamente relacionado a qualquer mudança potencial de seu aliado mais próximo em relação à China.”
Hockey disse que a situação na Austrália está sendo observada “atentamente” pela administração dos EUA.
A Organização Australiana de Inteligência de Segurança (ASIO) informou pela primeira vez os chefes administrativos de ambos os principais partidos políticos sobre as conexões preocupantes entre os doadores políticos e o Partido Comunista Chinês em 2015.
Sam Dastyari
No centro de várias reportagens recentes sobre a interferência chinesa nas questões australianas está o senador do Partido Trabalhista Australiano (ALP), Sam Dastyari. Ao longo das últimas semanas, houve ampla cobertura da mídia a respeito do apoio de Dastyari a certas políticas de Pequim.
Entre as matérias mais recentes, Dastyari supostamente pressionou a porta-voz de assuntos exteriores de seu próprio partido, Tanya Plibersek, para não encontrar-se com um ativista da democracia em Hong Kong, informou a Fairfax Media na segunda-feira.
Dastyari teria pressionado Plibersek em várias ocasiões durante 2015 para não encontrar-se com o professor Joseph Cheng Yu-shek, um ativista da democracia chinesa, porque isso chatearia as pessoas na “comunidade chinesa”. Apesar da pressão, Plibersek encontrou-se com Cheng durante sua visita a Hong Kong.
Ao longo das últimas semanas, o governo federal pediu a Dastyari que se demitisse.
O senador também recebeu cobertura negativa da mídia sobre um discurso de 2016 quando apoiou publicamente os movimentos expansivos e agressivos de Pequim no Mar do Sul da China. Seus comentários eram contraditórios à política do seu partido e do governo australiano sobre o assunto.
Entre outras, as reportagens mais recentes sobre a questão dizem que a ASIO acredita que 10 candidatos políticos em eleições recentes para governos locais e federal têm vínculos com agências de inteligência chinesas.
A ASIO disse que um desses candidatos foi eleito para o cargo e atualmente ainda está lá, informou The Weekend Australian no sábado, 9 de dezembro. O artigo disse que a ASIO os identificou, mas não nomeou quem eram.