Ameaça de mísseis chineses é motivo central da retirada dos EUA de tratado nuclear

Permanecer fora do pacto permitiu que a China expandisse rapidamente seu arsenal de mísseis como parte de uma estratégia militar

07/02/2019 23:45 Atualizado: 08/02/2019 07:17

De Frank Fang, Epoch Times

A ameaça da China e seu formidável arsenal de mísseis é um dos maiores obstáculos para a defesa dos Estados Unidos sob o Tratado de Força Nuclear de Alcance Intermediário (INF), segundo um relatório recém-publicado no Congresso.

A China não é signatária do tratado, no entanto, “permanecer fora do pacto permitiu que a China expandisse rapidamente seu arsenal de mísseis como parte de uma estratégia militar destinada a combater a potência militar dos Estados Unidos e seus aliados na Ásia”, foi explicado em um relatório à Comissão de Revisão Econômica e de Segurança EUA-China, publicado em 28 de janeiro, onde foram analisadas as implicações da retirada dos Estados Unidos do tratado – apenas quatro dias antes da administração de Trump anunciar formalmente que suspenderia suas obrigações sob o tratado e começaria o processo de se retirar formalmente.

Com as restrições do INF nos Estados Unidos, Washington é incapaz de defender seus interesses na região asiática, de acordo com o relatório.

O tratado INF foi assinado pelo ex-presidente norte-americano Ronald Reagan e pelo secretário-geral soviético Mikhail Gorbachev em 1978, proibindo ambos os países de instalar mísseis balísticos e de cruzeiro lançados no solo com alcance entre 310 e 3.410 milhas. Esta distância restringe os mísseis dos Estados Unidos de alcançar a Ásia.

O anúncio do governo Trump, em 1º de fevereiro, explicou que os Estados Unidos decidiram retirar-se do tratado após meses de negociações fracassadas, solicitando que a Rússia desmantelasse seus mísseis balísticos 9M729 que os Estados Unidos dizem violar o pacto.

Embora o presidente Donald Trump e outros funcionários tenham inicialmente citado a capacidade dos mísseis da China como uma justificativa para se retirar do tratado – uma observação feita durante o relatório do USCC – durante uma ligação telefônica com jornalistas no dia 1º de fevereiro, um funcionário do governo negou tal conexão. “Para os Estados Unidos, isso realmente não tem nada a ver com a China. Isto é apenas sobre a violação da Rússia deste tratado”.

No dia seguinte, a Rússia anunciou que também suspenderia a participação no tratado.

Ameaça chinesa sob as restrições do INF

O relatório do USCC apontou que 95% do inventário da China de mais de 2.000 mísseis balísticos e de cruzeiro – que inclui curto alcance (entre 310 e 620 milhas), alcance médio (620 e 1.860 milhas) e alcance intermediário (1.860 e 3.410 milhas) – violaria o Tratado INF, se a China fosse signatária.

Embora a maioria desses mísseis chineses esteja equipada com ogivas convencionais, algumas são ogivas nucleares e outras são “de dupla capacidade”, o que significa que o míssil pode ser equipado tanto com uma ogiva convencional quanto com uma ogiva nuclear, segundo o relatório.

Sem as restrições do INF, Pequim acumulou mísseis com a estratégia militar capazes de manter “as forças dos Estado Unidos em risco caso optem por intervir em um conflito regional”, disse o relatório.

O USCC pintou uma situação hipotética para os Estados Unidos, sob restrições do INF.

Se um conflito regional eclodisse sobre Taiwan ou ilhas disputadas no Mar do Leste ou no Mar da China Meridional, a China poderia evitar ou derrotar a intervenção dos Estados Unidos “visando as instalações militares dos Estados Unidos até Guam, juntamente com os recursos navais e aéreos que operam no mar”.

O regime chinês considera a ilha independente de Taiwan como parte de seu território e ameaçou o uso da força militar para uni-la ao continente.

O relatório observou que, se os Estados Unidos não pudessem intervir, os aliados dos Estados Unidos na região da Ásia ficariam em desvantagem durante um conflito, devido ao “grande número de mísseis chineses e à velocidade com que poderiam ser lançados”.

Além disso, a China também seria capaz de impedir a intervenção americana se os políticos dos Estados Unidos “se tornassem relutantes ao continuar seu confronto ou sustentassem perdas adicionais” como resultado do dano inicialmente infligido por mísseis chineses.

Qualquer sinal de que os Estados Unidos estejam menos dispostos a intervir serviria ao objetivo final de Pequim: intimidar e coagir os países da região asiática, de acordo com o relatório.

Resposta da China

Quando perguntado por repórteres sobre a suspensão dos Estados Unidos em 2 de fevereiro, Geng Shuang, porta-voz do Ministério das Relações Exteriores da China, disse que “a China se opõe à retirada dos Estados Unidos” e advertiu que a retirada “pode desencadear uma série de conseqüências adversas”.

Quando perguntado se a China concordaria em negociar um novo tratado multilateral sobre controle de armas para substituir o INF, Geng disse: “A China se opõe à multilateralização deste tratado”, acrescentando que o regime chinês acredita que é imperativo “manter e implementar o tratado existente em vez de criar um novo. ”

As palavras de Geng foram conservadoras em comparação à crítica contundente da mídia estatal chinesa para denunciar a decisão dos Estados Unidos.

Xinhua, em um editorial publicado em 2 de fevereiro, equiparou a retirada dos Estados Unidos à “abertura de uma caixa de Pandora”, uma vez que “prejudicaria seriamente a paz e a segurança global”.

“A retirada dos Estados Unidos deixa toda a raça humana com uma perspectiva negativa à medida que antecipam o século 21”, disse o jornal estatal Global Times em editorial em 2 de fevereiro. O artigo também reiterou a oposição de Pequim a “qualquer forma de multilateralização sob o INF, ou qualquer outra forma de multilateralização exigida por Washington”.

A razão por trás da cautela de Pequim em relação a qualquer estrutura multilateral foi declarada no relatório do USCC.

“Implícita na posição oficial da China [sobre a multilateralização sob INF] é uma avaliação de que a adesão dos Estados Unidos e da Rússia ao Tratado INF, enquanto a China permanece fora do pacto, cria uma assimetria nos regimes de controle de armas que Pequim aproveita e, portanto, quer manter”, disse o relatório.

Ramificação

Em última análise, os Estados Unidos teriam uma grande vantagem caso se retirassem do INF: os planejadores de defesa dos Estados Unidos teriam a opção adicional de colocar mísseis terrestres nos territórios de seus aliados e parceiros na Ásia para impedir ações agressivas de Pequim, segundo o relatório.

“Isso  forçaria a China a se concentrar em destruir mais alvos em um conflito, diluindo assim a quantidade de poder de fogo que o Exército Popular de Libertação poderia dedicar a qualquer alvo específico”, disse o USCC, acrescentando que isso “complicaria o planejamento militar chinês”.

A China já representa uma ameaça para os aliados dos Estados Unidos na Ásia. SD Pradhan, ex-presidente do Joint Intelligence Committee da Índia e ex-vice-conselheiro nacional de segurança, escreveu em editorial publicado no jornal indiano de língua inglesa The Times of India, que a China já está colocando “sistemas de armas em sua periferia e suas bases no Oceano Índico”, em conexão com sua política externa da iniciativa “Um Cinturão, Um Caminho”(OBOR).

Com a retirada dos INF dos Estados Unidos, a China poderia decidir acelerar esse processo, disse Pradhan.

Pequim lançou o OBOR em 2013, com o objetivo de construir rotas comerciais que ligam a China, o Sudeste Asiático, a África, a Europa e a América Latina financiando projetos de infraestrutura em mais de 60 países.

Pradhan também advertiu que a Índia precisa continuar monitorando o desdobramento de mísseis da China no Tibete, bem como a possibilidade da China colocar novos mísseis em territórios paquistaneses.

Independentemente de como a China poderia reagir após a retirada dos Estados Unidos, a China já demonstrou sua disposição de usar mísseis para intimidação, de acordo com o relatório do USCC, como quando lançou mísseis nas águas de Taiwan durante a crise do Estreito de Taiwan de 1995-1996.

A China havia disparado os mísseis para intimidar os cidadãos taiwaneses pouco antes da ilha realizar suas primeiras eleições presidenciais em 1996.

A revista bimestral dos Estados Unidos, National Interest, em um artigo publicado em 4 de janeiro, identificou mísseis balísticos como uma das cinco armas que a China poderia usar em uma guerra contra Taiwan. Um dos mísseis chineses, o DF-16, tem um alcance de 1.000 quilômetros (cerca de 620 milhas), pode carregar uma ogiva de 1.500 quilos (cerca de 3.307) e possui uma capacidade de manobra que pode escapar da interceptação por sistemas de mísseis antibalísticos.