O estado de Nova Iorque criou uma comissão que reconhece “a terrível injustiça da escravidão” e terá a tarefa de analisar seu legado, a discriminação racial e econômica subsequente contra pessoas de ascendência africana, o impacto sobre os vivos e possíveis reparações.
A governadora Kathy Hochul sancionou nesta terça-feira o projeto de lei que criou a Comissão Comunitária de Recursos de Reparações do estado, “para corrigir os erros do passado”.
“Temos a obrigação moral de levar em conta todas as partes de nossa história compartilhada como nova-iorquinos, e essa comissão marca um passo fundamental para esses esforços”, explicou a governadora em evento na sede da Sociedade História de Nova Iorque, em Manhattan.
A nova lei reconhece o “importante papel que a instituição da escravidão desempenhou no assentamento e na história de Nova Iorque”, estabelece a comissão de nove membros com experiência nas áreas de estudos africanos e americanos, sistema jurídico criminal, direitos humanos, direitos civis, organizações de reparação e outras áreas relevantes.
Hochul lembrou que, há mais de 400 anos, os primeiros escravos “foram violentamente sequestrados, roubados de suas famílias e lares e levados acorrentados para a costa do que viria a se tornar os Estados Unidos da América”.
“Esses povos escravizados literalmente construíram grande parte de nossa nação com seu suor, seu sangue e sua dor”, enfatizou.
Ela também lembrou que Nova Iorque é, há muito tempo, o centro do comércio americano: Wall Street, bancos, transporte, seguros, “os motores econômicos de todo o país, e eles prosperaram porque podiam comercializar mercadorias produzidas por escravos”.
A governadora observou que Wall Street foi um mercado de comércio de escravos por mais de um século que, embora tenha sido fechado quando a escravidão foi abolida em 1827, “o estado continuou sendo um ator dominante no comércio ilegal de escravos”.
Antes da Revolução Americana, havia mais africanos escravizados na cidade de Nova Iorque do que em qualquer outra cidade, exceto Charleston, na Carolina do Sul.
“Ex-escravos e seus filhos e os filhos deles em toda a nossa nação têm sido assombrados por gerações pelo racismo e pela privação de direitos”, disse Hochul, observando que a reparação agora proposta pelo projeto de lei “significa mais do que simplesmente oferecer às pessoas um pedido de desculpas 150 anos depois, permite uma conversa, um debate razoável sobre o futuro”.
O reverendo negro dos direitos civis Al Sharpton disse que a criação da comissão não se trata de emitir um cheque, mas de começar a curar as cicatrizes.
A comissão se reunirá nos próximos seis meses e terá um ano para publicar um relatório.
Um estudo da Human Rights Watch (HRW) deste ano observa que o governo dos EUA ainda não criou uma comissão para estudar o legado da escravidão e desenvolver propostas de reparação.
Enquanto isso, Boston (em Massachusetts) votou no ano passado pela criação de uma comissão para estudar reparações aos seus residentes negros pelo papel da cidade na escravidão e seu legado de desigualdade.
Em 2021, Evanston (em Illinois) se tornou a primeira cidade dos EUA a aprovar um programa de pagamento para seus residentes negros para compensá-los pela discriminação histórica nas políticas habitacionais.
Discussões sobre medidas semelhantes também foram iniciadas em outros estados dos EUA.