Por Michael Washburn
A Associação de Tênis Feminino (WTA) anunciou na última semana sua decisão de não realizar torneios na China no próximo ano, em resposta ao silenciamento da tenista de Pequim, Peng Shuai, que realizou alegações de assédio sexual contra o ex-vice-premiê Zhang Gaoli, assim, a associação tornou-se o mais recente sinal de aumento da consciência mundial às violações do regime comunista.
A campeã de duplas do Grand Slam e a atleta olímpica, Peng Shuai, está longe dos holofotes públicos desde suas explosivas acusações contra o sênior ex-oficial chinês, as quais são de natureza particularmente sensível na era do movimento #MeToo. Uma série de órgãos governamentais em todo o mundo exigiu provas do bem-estar de Peng, enquanto a WTA, em seu anúncio, realizou fortes objeções ao seu desaparecimento da vida pública.
“Não vejo como posso pedir aos nossos atletas para competir lá, quando Peng Shuai não tem permissão para se comunicar livremente e aparentemente foi pressionada a contradizer sua alegação de assédio sexual”, declarou Steve Simon, CEO da WTA, no dia 1º de dezembro.
A organização pode perder mais de US $1 bilhão em receitas de torneios no vasto mercado chinês, e sua decisão é uma forte demonstração de que os princípios éticos devem vir antes dos lucros.
A decisão da WTA pode ter um impacto real na conduta de Pequim, afirmaram os observadores após o anúncio. Além disso, pode apontar o caminho a seguir, tratando-se a respeito da complicada questão de realizar negócios em um país cujo regime autoritário viola cronicamente os direitos humanos, a liberdade de expressão e as obrigações dos tratados internacionais.
A WTA ofereceu um exemplo do tipo de proibição que pode realmente funcionar. Não é apenas mais uma empresa que precisa de mão de obra barata. As partidas de tênis não são fábricas que produzem roupas ou sapatos e sustentam milhares de chineses de baixa renda. Uma proibição direcionada dessa natureza, implementada por uma organização de alto reconhecimento, pode se provar mais eficaz do ponto de vista político e econômico e socialmente viável do que uma retirada generalizada de corporações de todos os tamanhos e perfis, afirmam os especialistas.
Conscientização crescente
A WTA é a única grande organização esportiva a implementar tal proibição em resposta às preocupações com os direitos humanos na China. Sua ação contrasta fortemente com muitas corporações globais que permaneceram em silêncio sobre as violações de Pequim ou se curvaram às crescentes demandas de censura do regime.
Muitas multinacionais parecem intimidadas por acontecimentos como a retaliação de Pequim, no início deste ano, contra varejistas de roupas como Nike, H&M e Adidas por temerem a conscientização quanto ao trabalho forçado de uigures nas regiões de cultivo de algodão de Xinjiang, para não mencionar as terríveis penalidades resultantes em 2019 de um tweet enviado pelo então gerente geral do Houston Rockets, Daryl Morey, elogiando os manifestantes pró-democracia em Hong Kong. O tweet custou, a National Basketball Association, o enorme mercado de esportes da China.
No entanto, a proibição da WTA veio junto a outras declarações públicas apontadas por jogadores e organizações de grande importância na indústria esportiva global, como o jogador do Boston Celtics, Enes Kanter, que nos últimos meses utilzou o Twitter para denunciar o regime comunista por suas violações aos direitos humanos, incluindo sua repressão em Hong Kong, Tibete, e seu assassinato de prisioneiros de consciência por seus órgãos.
Em meio a esses desenvolvimentos, alguns podem se perguntar se outras empresas e franquias deveriam aumentar a pressão imitando o movimento da WTA. Especialistas que acompanharam o envolvimento da China e de corporações globais com o país, afirmam que a mudança da WTA pode muito bem ter um impacto em Pequim devido à alta importância da WTA e aos seus milhões de fãs, mas a resposta à segunda pergunta não é um simples sim ou não.
Em vez disso, as empresas devem tomar decisões caso a caso e determinar qual é o passo apropriado, devido à natureza de seu relacionamento com o mercado chinês e com o trabalho na China, e as prováveis consequências em todos os níveis – diplomático, político, comercial e social.
Viabilidade
Corporações globais que possuem fábricas na China e vendem para o vasto mercado não estão necessariamente sendo cúmplices das violações aos direitos humanos e não é evidente que sua retirada ajudaria as milhões de pessoas que lutam na China. Existe um papel para o engajamento construtivo, afirmam alguns especialistas.
“Se as corporações estrangeiras ficassem de fora de todos os países que desrespeitam os direitos humanos, incluindo maltratar seus trabalhadores, o comércio global seria essencialmente paralisado”, declarou Jane Golley, Diretora do Centro Australiano sobre a China no Mundo na Universidade Nacional da Austrália.
No caso da China, em particular, haveria prejuízos para um grande número de trabalhadores pobres que já estão sofrendo nas mãos do PCC.
“Recusar-se a envolver-se com a China iria impor altos custos para a porção (desconhecida) dos uigures e outros trabalhadores chineses que escolheram voluntariamente trabalhar em fábricas que fornecem nossos produtos, devido a essa ser a melhor opção para sustentar suas famílias”, afirmou Golley.
“Certamente, toda empresa – e também todos os consumidores – deve ser incentivada a tomar decisões éticas e também deve ser responsabilizada quando não as fizer. Mas isso requer engajamento construtivo e a busca pela verdade, e não afastar-se completamente dela”, ela continuou.
Robert Atkinson, presidente da Information Technology and Information Foundation, um think tank com sede em Washington, também declarou que desistir seria um erro. Visto que quando as empresas americanas podem vender para a China, isso é benéfico para os Estados Unidos, afirmou.
“A ideia de que devemos cortar as vendas para a China por causa de questões de direitos humanos é equivocada”, declarou Atkinson. “Não há razão para esperar que essa ação tenha qualquer efeito sobre as práticas de direitos humanos na China e, em segundo lugar, a menos que outras nações também tomem medidas, o resultado será simplesmente transferir as vendas de empresas dos EUA para empresas de outras nações”.
Influência
Justine Nolan, professora da University of New South Wales em Sydney e diretora do Instituto dos Direitos Humanos da Austrália, enfatizou a necessidade de proceder caso a caso.
No caso da província de Xinjiang, o uso generalizado de trabalho forçado para produzir produtos como painéis solares e algodão é uma preocupação particular, devido à falta de divulgação do regime quanto às práticas trabalhistas e a falta de acesso por observadores externos à região.
Em Xinjiang, afirma Nolan, o engajamento construtivo pode ter impacto geral limitado. Portanto, nesse caso específico, há um argumento para uma empresa se retirar da região e levar seus negócios para outro lugar, declarou. Mas essa não é uma solução universal.
“Geralmente, este deve ser o último recurso porque o objetivo é mudar as práticas de uma forma que melhore a vida dos trabalhadores e, mais comumente, isso pode ser feito apoiando relacionamentos de longo prazo com fornecedores que possuem essa premissa e apoiam a mudança no local de trabalho”, afirmou Nolan.
Não minimiza a gravidade da situação dos direitos humanos na China ao afirmar que o engajamento construtivo com entidades chinesas gerou frutos para algumas empresas que foram inteligentes em equilibrar o lucro com a preocupação aos direitos humanos e as condições de trabalho.
“Kathmandu tem tentado fazer isso ao mesmo tempo que consolida sua cadeia de produção. Outland Denim é um modelo diferente, onde eles são menores, mas seguiram um modelo de propriedade de fábrica para controlar as condições de produção, mas agora também estão olhando mais seriamente para sua cadeia de produção de volta à fonte”, observou Nolan, referindo-se a duas empresas de roupas australianas.
Proibição da WTA
O resultado da análise de especialistas é que não existe uma abordagem única para a questão da realização de negócios na China, mas há espaço para uma estratégia bifurcada, dependendo da natureza e do perfil de uma determinada empresa ou franquia. Por sua vez, Nolan percebe potencial para certos tipos de empresas se unirem a outras nesta questão e agirem em conjunto.
“Onde algumas empresas estão sendo destacadas – como o Celtics ou, como já aconteceu antes, algumas empresas de vestuário que operam na China – o ideal seria encontrar o apoio da indústria / setor como um todo, estabelecendo uma postura clara de apoio aos direitos humanos, não como um extra opcional, mas como parte da abordagem usual de negócios. Há uma certa segurança nos números”, afirmou Nolan.
Mas, no caso de uma franquia tão proeminente e respeitada como a WTA, implementar uma proibição de eventos na China, mesmo sendo prejudicial aos lucros, pode realmente ser um meio eficaz de informar Pequim que seus abusos crônicos possuem consequências. Isso poderia ajudar a convencer o PCC de que as apostas são altas demais para continuar seu comportamento flagrante.
“Corporações poderosas e ricas podem ter mais opções do que indivíduos. A recente decisão da WTA de proibir torneios na China na sequência da alegação de Peng Shuai contra Zhang Gaoli é um bom exemplo”, relatou Golley. “Certamente isso deve prejudicar o governo chinês, assim como os fãs chineses de Peng e do esporte. E não é óbvio, para mim, como eles poderiam promover retaliação”.
Golley expressou esperança de que a ação da WTA possa resultar em uma melhoria aos direitos humanos na China a longo prazo, junto com a esperança de que não tenha o efeito colateral infeliz de exacerbar a situação atual de Peng.
Na opinião de Atkinson, do ITIF, é importante que organizações como a NBA mostrem coragem moral e deixem claro que a NBA não retaliará contra membros da NBA, como Enes Kanter, que falam o que pensam sobre a China. “Ao mesmo tempo, o governo dos EUA também precisa deixar claro que apoiará organizações que não curvem-se ao governo chinês”, afirmou ele.
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