Por Kevin Cohen, Defesanet
A era global não é uma novidade. Governos, indústrias e diferentes populações em todo o mundo têm se beneficiado com a internet nas últimas décadas. Pessoas agora podem ter as mesmas oportunidades de aprender e acessar informações, onde quer que estejam. Mesmo assim, ainda há desafios sociogeográficos que dificultam essas oportunidades para muitas comunidades fora das cidades.
Na América Latina, apesar de grandes avanços no processo de urbanização, ainda há centenas de milhões de pessoas sem acesso à internet. No Brasil, o IBGE estima que 63,4 milhões não estejam conectadas à internet. São, em sua maioria, pessoas que vivem fora das cidades, como em áreas rurais, florestas, zonas de fronteira, pequenas comunidades e quilombos.
Atualmente, apenas 0,63% do território brasileiro consiste de áreas urbanas, como mostram dados da Embrapa, mas é nesta pequena porção que a maioria dos provedores de internet (ISP) concentram seus esforços e investimentos. Nas regiões rurais e de difícil acesso, a conectividade de qualidade é mais escassa, tanto de banda larga como de telefonia móvel.
Investimentos em infraestrutura terrestre de telecomunicações, como antenas de rede 4G e cabeamento de fibra óptica, podem custar dezenas de milhões, deixando de ser economicamente viável ou interessante para esses provedores.
O atendimento às comunidades mais distantes dos grandes centros e de baixa renda acaba sendo marginalizado, pois os moradores não conseguem pagar os preços praticados. Dados do IBGE mostram que alguns estados menos urbanizados registraram uma renda per capita pouco acima da metade do salário mínimo nacional, como o Maranhão, com R$ 597.
E um estudo recente da Organização das Nações Unidas aponta que justamente os 20% mais pobres do país têm cinco vezes menos chances de estarem conectados.
No entanto, há uma grande oportunidade de desenvolvimento com essa população mais carente. O Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) mostrou que o crescimento de 1% no acesso à internet gera um crescimento de 0,19% no PIB do país. Isso porque traz novas oportunidades de educação e negócios pela inclusão digital, impulsionando o crescimento econômico do país.
Programa focado nos desatendidos
Visando solucionar essa lacuna digital nas comunidades desatendidas, uma das maiores apostas está na internet via satélite, que oferece conexões de alta qualidade com a vantagem de preços acessíveis, tanto para o investimento em infraestrutura pelas ISPs como no preço final para o consumidor. As antenas podem ser instaladas em poucas horas e com investimentos mínimos, abaixo de 1.000 dólares para cada ponto.
Um exemplo é o modelo do programa inédito de Wi-Fi Comunitário da Viasat, lançado em 2017 com foco inicial na América Latina. A proposta é instalar um kit de internet via satélite em comunidades de difícil acesso e a partir de 150 moradores, em média. Para comercializar o serviço, a empresa optou por um modelo de parcerias locais com pequenos comércios, empresas e residências, que recebem os equipamentos necessários e se tornam revendedores de pacotes de baixo custo por hora ou por franquia.
O primeiro projeto foi realizado no México, onde a Viasat já instalou cerca de 3.000 pontos de acesso de Wi-Fi Comunitário desde 2017, atendendo a centenas de milhares de pessoas de baixa renda no país.
O kit completo é gratuito e instalado por parceiros locais, que geralmente atendem áreas demarcadas pela Viasat e fora do alcance de sinal de telefonia móvel. Os equipamentos são fabricados pela Viasat, e o kit é composto de antena e LNB de banda Ka, modem e um transmissor de sinal Wi-Fi, com alcance de até 500 metros, de acordo com o local.
Com o equipamento instalado, os revendedores já podem gerar senhas de acesso de pacotes de dados por hora ou por uso, com custos atuais a partir de 10 pesos por hora no México. A internet é oferecida aos mexicanos pelos satélites em órbita da Viasat, como o Viasat-2, que oferece o serviço com velocidades que podem ultrapassar 50 Mbps. No Brasil, o valor deve ficar entre R$ 2,00 e R$ 3,00 para o acesso de 1 hora.
Uma destas comunidades é a vila de Cacalutan, nas montanhas de Nayarit, a algumas horas da cidade de Guadalajara. O vilarejo, com cerca de 450 moradores, foi conectado pela primeira vez em 2018. Antes disso, quem quisesse se conectar a internet ou a uma linha de telefonia precisava viajar para cidades vizinhas.
Uma das moradoras, Ester Garcia Lopez, é dona de um dos poucos comércios locais e passou a ser uma revendedora de Wi-Fi Comunitário. Durante a semana ela vende cerca de 65 senhas de acessos por dia, recebendo um percentual mensal dessas vendas.
Em outra comunidade próxima, Los Mezquites, com cerca de 150 habitantes, as vendas são menores, mas nos fins de semana chegam a atingir mais de 30% dos moradores, com picos de até 50 senhas geradas por dia. Atualmente, eles podem fazer tudo na própria comunidade — desde as tarefas escolares, e-commerce, redes sociais e telemedicina, até ligações e conversas com familiares distantes, que vivem em outros estados ou países, tudo via internet satelital de alta velocidade.
A partir de 2020, a Viasat iniciará o lançamento de uma constelação de 3 satélites de banda Ka, VS-3, com capacidade de 1 terabyte cada, possibilitando velocidades acima de 100 Mbps, o que possibilita streamings de 4K em altíssima definição, entre outras aplicações. O Brasil e todo o continente americano serão os primeiros a se beneficiar desse sinal. Os outros dois satélites seguirão para cobrir Europa, Oriente Médio, África e Ásia e Pacífico, unificados em uma cobertura global.
Isso significa que a população dessas comunidades em qualquer lugar do mundo, por mais distante que estejam, podem fazer uso de seus próprios dispositivos móveis, como smartphones, para se conectarem à rede satelital. Somente no Brasil, por exemplo, estima-se que hajam 220 milhões de smartphones ativos, segundo dados da FGV/EAESP — ou mais de um dispositivo ativo por habitante.
No Brasil
Já foram identificadas cerca de 40 mil comunidades que poderiam ser atendidas pelo Wi-Fi Comunitário no país. São locais com baixa ou nenhuma conectividade de internet e muitos sequer com serviços de telefonia. Com extensões continentais, conectar todos os brasileiros se tornou um desafio, porém nada impossível.
Em Pacaraima (RO), por exemplo, cidade de cerca de 12 mil moradores na fronteira com a Venezuela, a internet via satélite serviu para ajudar na mobilização de esforços federais e estaduais diante da crise humanitária na região com a imigração em massa de refugiados venezuelanos, conectando escolas, postos de saúde e postos de fronteira na cidade. As antenas da Viasat foram instaladas em poucas horas e a cidade se conectou pela primeira vez à internet de alta velocidade.
Assim como Pacaraima, dezenas de milhares de outras comunidades podem se beneficiar de uma solução que ajudará a democratizar a conectividade, algo que foi proposto no país pela PEC 185/15, que coloca o acesso à internet entre os direitos fundamentais do brasileiro. Quando estamos todos conectados, o mundo fica maior e a população mais unida com os mesmos direitos e oportunidades.
Kevin Cohen, diretor geral de Wi-Fi Comunitário da Viasat