Pesquisa sobre trepadeira que imita plantas de plástico garante prêmio IgNobel a biólogo brasileiro

Por Igor Iuan
13/11/2024 14:35 Atualizado: 13/11/2024 14:35

O biólogo Felipe Yamashita, de 33 anos, foi premiado com o IgNobel 2024 na categoria Botânica por sua pesquisa sobre a Boquila trifoliolata, uma trepadeira nativa da selva valdiviana, no sudoeste do Chile, que possui a habilidade de imitar as folhas de plantas ao seu redor — até mesmo de plástico.

Realizado na Universidade de Bonn, na Alemanha, o estudo desafia os paradigmas da biologia, ao propor que a planta pode ser capaz de perceber seu ambiente de maneira bastante peculiar.

A pesquisa começou em 2019 e chamou atenção quando Yamashita, em colaboração com o botânico amador norte-americano Jacob White, demonstrou que a Boquila não apenas imita as folhas de outras plantas vivas, mas também as de plástico.

Este fenômeno de mimetismo, observado na natureza para evitar predadores, chamou atenção quando a trepadeira começou a replicar até mesmo objetos não biológicos, como plantas artificiais postas ao seu alcance.

O prêmio IgNobel, concedido anualmente pela revista de humor científico Annals of Improbable Research — traduzido como “Anais da Pesquisa Improvável” — reconhece descobertas curiosas e, muitas vezes, inusitadas.

O nome da premiação vem da junção do prestigiado Prêmio Nobel com a palavra anglófona ignoble (ignóbil, em português).

A edição deste ano foi a primeira a ocorrer presencialmente desde a pandemia, e Yamashita recebeu o prêmio com uma nota simbólica de 10 trilhões de dólares zimbabuanos, o equivalente a cerca de 2,18 reais.

Plantas com “olhos”?

O estudo do biólogo envolve a teoria de que a Boquila pode usar uma forma primitiva de percepção visual, para ajustar suas folhas ao formato das plantas vizinhas. Isso questiona a visão tradicional de que as plantas apenas reagem a estímulos químicos.

Segundo o biólogo, a trepadeira pode ter uma espécie de “visão”, usando células especializadas nas folhas que agem como lentes. Esse conceito remonta à teoria de ocelos, proposta no início do século XX, que sugere que plantas podem ter estruturas semelhantes aos olhos dos animais.

A pesquisa também levanta questões sobre a comunicação entre plantas, um campo de destaque nos últimos anos.

Yamashita e seu orientador, o eslovaco Frantisek Baluska, argumentam que a Boquila pode perceber sinais de luz e usar hormônios como a auxina para moldar suas folhas de acordo com a presença de outros vegetais — ou objetos inanimados, como plantas de plástico.

Porém, a descoberta não veio sem controvérsias. O biólogo peruano Ernesto Gianoli, que foi o primeiro a estudar o mimetismo da Boquila em 2014, questiona os métodos e conclusões de Yamashita, sugerindo que a mudança nas folhas da trepadeira pode ser explicada por fatores como iluminação e disposição dos vasos.

Mesmo assim, ele admite que o fenômeno é complexo e pode haver múltiplas camadas envolvidas. Apesar das críticas, o estudo de Yamashita e Baluska segue ganhando atenção, e novos experimentos, como um teste recente com fotografias de plantas de espécies asiáticas, podem trazer mais revelações.

Se confirmado, esse fenômeno poderá revolucionar a forma como entendemos as capacidades sensoriais das plantas, oferecendo novas perspectivas para a biologia vegetal.

O IgNobel, embora de tom humorístico, já foi trampolim para cientistas cujas descobertas mais tarde receberam reconhecimento mundial, como o russo Andre Geim, que venceu o Nobel de Física por estudos com grafeno. Resta saber se a pesquisa de Yamashita trará outras impactantes descobertas.