Reportagem investigativa: um hospital construído para matar – parte 3

21/05/2020 20:20 Atualizado: 22/05/2020 08:30

Números Inventados

Que números se sobressaem em meio a este caleidoscópio de atividade?

O hospital deseja fazer-nos crer que quando sua nova central de transplantes entrou em operação, dando-lhes centenas de leitos adicionais e instalações muito mais sofisticadas, não houve aumento na taxa de transplantes.

O único dado oficial para o período pós-2006 é um número total de 5.000 transplantes efetuados até 2010 e 10.000 até 2014 — um aumento linear e uniforme.

Mas os fatos revelam uma outra narrativa: relatos pessoais de receptores coreanos de órgãos apontam que a ocupação dos leitos excedia em muito as capacidades do hospital; registros de obras demonstram a necessidade de expansão contínua após 2006; Encontram-se currículos impressionantes entre os membros das equipes hospitalares, ostentando milhares de transplantes realizados por pouco mais de 100 médicos.

“…o grande número de transplantes de órgão, os quais, aparentemente, continuam a ocorrer em Tianjin e demais localidades na China, precisa possuir uma fonte alternativa de órgãos, a qual precisa ser explicada.” – Dr. Jacob Lavee, presidente | Sociedade de Transplantação de Israel

Com a utilização dos 500 leitos para transplantes de rim e fígado no Centro de Transplante de Órgãos do Oriente, operando próximo ou além de sua capacidade entre 2007 e 2013, e uma estadia média de um mês por paciente, o número total de transplantes poderia ter sido de até cerca de 50.000. Claro, apenas estimativas muito ambíguas são possíveis dadas as muitas incógnitas. O Epoch Times disponibilizou uma tabela das possibilidades do número agregado de operações.

[Os dados oficiais sobre transplantes cumulativos de fígado estão em vermelho. Em amarelo, estão representadas as possibilidades de transplantes de fígado e rim e cumulativos, de acordo com informações oficiais de ocupação do leito, com a suposição de uma estadia média de um mês. ]

Qualquer que seja destas estimativas, extrapola em muito o total de 10.000 transplantes de fígado ao longo de 15 anos relatado em fontes oficiais. Este número por si só já apresenta um dilema curioso, carente de explicações — entretanto, os números compilados a partir das taxas de ocupação dos leitos são muito mais altos do que qualquer fonte de órgãos possa justificar.

Certamente, não há como saber se os trabalhadores do hospital estão ou não mentindo simplesmente nos documentos para as obras de renovação do prédio. Entretanto, não está claro que propósito o hospital teria para inventar os dados de seus planos de renovação, submetidos a um banco de dados nacional anos após o investimento ter sido empenhado, e a construção concluída, pelas autoridades municipais. A área construída ou o número de leitos são infraestruturas tangíveis que não podem ser facilmente falsificadas, e as taxas de ocupação de leitos, de duas fontes oficiais separadas, mostram a mesma trajetória ascendente de uso intenso do final de 2006 até o final de 2013.

Há muitas ressalvas a essas estimativas, no entanto, inclusive o fato de que o número de execuções sugerido pelas taxas de ocupação de leitos não é claro. A correlação provavelmente não é 1:1, dado que a doação de um único rim, a um parente, por exemplo, não é fatal nem antiética. O Primeiro Hospital de Tianjin certamente se envolveu em transplantes desta natureza. Além disso, uma morte pode produzir múltiplos órgãos transplantados.

Dadas as diversas variáveis e amplas incógnitas, seria imprudente sugerir uma estimativa ferrenha do número de execuções que pode haver ocorrido para fomentar os negócios do Primeiro Hospital. Ainda assim, qualquer que seja o dado, as implicações se mantêm as mesmas: É necessário que haja uma fonte de órgãos oculta, incógnita.

Então, de onde vieram os órgãos

Não Há Explicação nos Prisioneiros

A única fonte considerável de órgãos da China ao longo destes anos foi, de acordo com a narrativa oficial, prisioneiros executados.

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Em entrevista com a China Health News em janeiro de 2015, Huang Jiefu, o oficial do governo que atua como porta-voz das políticas chinesas de transplante diz: “Durante um longo período, a China não conseguiu estabelecer um sistema nacional de doações… Da década de 1980 até 2009, houveram somente 120 casos de doações feitas por cidadãos. A China é o país com a taxa de doação mais baixa do mundo”.

O número de execuções na China é um segredo de estado e números não são disponibilizados, mas estimativas há muito são realizadas por organizações terceiras. Estas variam entre 12000 e 2400 por ano durante o período em questão, de acordo com o Duihua, uma organização de direitos humanos sediada nos Estados Unidos e dedicada à China.

“É verdade que o suprimento de órgãos é bastante abundante na China, em comparação com o dos países ocidentais.” – Anúncio online veiculado no website do Primeiro Hospital Central

Em uma suposição para análise, se a pena de morte para toda a nação totalizasse 6,000 vítimas, o número de execuções ocorrendo em Tianjin equivaleria a cerca de 42 (dada uma população de 7 milhões e uma distribuição uniforme de execuções). Se o número de execuções nacional fosse de 5,000, seriam somente 35 execuções em Tianjin.

Mas muitos prisioneiros não são doadores de órgãos aptos por sua pressão sanguínea, abuso de drogas, idade e outras maledicências desqualificantes. Procedimentos para execuções envolvem tribunais e prisões locais, os quais tem seu próprio relacionamento com hospitais e médicos, conforme indicado pelos abundantes testemunhos de oficiais chineses e desertores. A natureza de isolamento e distanciamento dos processos burocráticos chineses indica que não é como se o Primeiro Hospital de Tianjin pudesse obter a partir de qualquer execução ocorrendo em qualquer lugar da China.

Em particular, as crescentes estatísticas do Primeiro Hospital não foram um fenômeno isolado: dúzias, se não centenas de outros hospitais dedicados a transplantes na China estiveram estabelecendo programas de treinamento para cirurgiões, construindo novas instalações e anunciando sua habilidade de entrega de órgãos em bom estado a receptores em solicitações rápidas – semanas, ou meses no mais tardar.

Em 2014, o Xinhua, uma mídia estatal, noticiou que nos últimos anos haviam mais de 600 hospitais na China competindo e digladiando-se pelo suprimento de órgãos. Todos esses centros de transplante também precisavam de órgãos.

E há então os perturbadores anúncios no website do hospital, os quais foram desde então removidos.

“É verdade que as fontes de fornecimento de órgãos são bastante abundantes na China em comparação com as dos países ocidentais”, uma página arquivada no site anuncia alegremente em 2008, em inglês, obviamente endereçando “turistas de transplante” estrangeiros.

No guia para possíveis receptores é colocada a questão: “Quais são os procedimentos iniciais ao chegar?”. A resposta: “Uma vez coletados os seus dados, o hospital iniciará a buscar por toda a China um órgão que corresponda”.

“Esta linha por si só é tão chocante”, disse Maria Fiatarone Singh, a professora da Universidade de Sydney que integra o conselho do “Doctors Against Forced Organ Harvesting” em uma entrevista por telefone. “Procuraremos por todo o país pelo seu órgão”, ela segue. “Procurar por seu órgão? Vasculhar o país por um doador quando não há registro de doadores. O que isto significa? Significa que eles estão com certeza procurando pela pessoa que possam matar para sua cirurgia. É simplesmente revoltante. É até difícil de acreditar”.

Em um documentário recente, exatamente com este título – “Difícil de Acreditar” – Arthur Caplan, o diretor fundador da divisão de medicina ética no Centro Médico da Universidade de Nova Iorque, explica o contraste em termos mais ríspidos: “Nos EUA, na Europa, você tem de estar morto primeiramente para ser um doador de órgãos. Na China, eles te tornam morto”.

Este rápido pareamento a partir do que aparenta ser um banco de doadores pré-selecionados é consistente tanto com o uso de prisioneiros condenados à morte quanto com a colheita de órgãos de prisioneiros de consciência.

Mas quando vem à tona a questão do volume, prisioneiros condenados à morte simplesmente não seriam o suficiente para sustentar a espécie de fornecimento necessária para Tianjin.

É claro, por si só isto não comprova nada – exceto que os órgãos precisariam estar vindo de algum outro lugar.

Reconhecer isso é o fundamental primeiro passo em qualquer exploração que venha a ocorrer do problema: se os órgãos não são de doadores voluntários ou criminosos executados, então eles precisam ser originários de alguma outra fonte.

Professor Jacob Lavee, diretor da Unidade de Transplante de Coração no maior centro médico de Israel, o Centro Médico de Sheba (Alex Ma/Epoch Times)
Professor Jacob Lavee, diretor da Unidade de Transplante de Coração no maior centro médico de Israel, o Centro Médico de Sheba (Alex Ma/Epoch Times)

“Qualquer um que esteja, minimamente que seja, familiarizado com os rumos da doação de órgãos no mundo não pode aceitar as alegações de milagrosamente substituir um gigantesco e bem estabelecido banco de órgãos de prisioneiros executados no período de um ano com órgãos doados voluntariamente”, disse Jacob Lavee, o presidente da Sociedade de Transplantes de Israel e diretor da unidade de transplante cardíaco no centro médico da Universidade de Tel Aviv, em um e-mail.

Lavee continua: “se efetivamente o uso de órgãos de prisioneiros formalmente executados foi amenizado, o imenso número de transplantes que, aparentemente, continuam a ocorrer em Tianjin e demais localidades na China, requer uma fonte alternativa de órgãos, a qual precisa ser explicada”.

É nesta brecha que envolvem-se pesquisadores responsáveis por alegações de um genocídio em massa oculto e amplamente ignorado. Juntamente a vastidões de outras evidências, eles descrevem um crime contra a humanidade, no qual os médicos posicionam-se ao lado dos assassinos; a causa da morte é a própria cirurgia, dado que os órgãos tem seu sangue drenado e bombeia-se para dentro deles químicos para preservá-los.

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David Matas, o coautor de um relatório fundamental quanto á colheita de órgãos perpetrada contra o Falun Gong, comentou em uma entrevista por telefone: “O que esta pesquisa faz é propor a pergunta; não responde à pergunta. Mas coloca em dúvida as respostas estabelecidas que foram dadas”.

A Pergunta Proibida

Há uma pista em potencial quanto à origem dos órgãos em uma das muitas funções que o Dr. Shen Zhongyang ocupou: ele está no website do Hospital Geral das Forças Armadas Policiais de Pequim, onde serviu como diretor do departamento de transplantes de órgãos, vestindo fardamento paramilitar completo. A Polícia Armada Popular é um exército interno com contingente de 1,2 milhões, utilizado ao redor do país e mobilizado para conter insurgências.

O obstáculo mais fundamental ao realizar transplantes de órgão em grande escala é encontrar uma fonte de doadores. Dado que a China não possuía nenhum sistema de transplante aberto ao público e voluntário, conexões políticas, frequentemente intermediadas por terceiros, consistiam na única forma de adquirir corpos.

Como o próprio Huang Jiefu pontuou em uma entrevista no início de 2015: “Nosso país é muito grande. Esta fonte de utilizar órgãos de prisioneiros, este tipo de situação naturalmente viria a incorrer em todo tipo de problemas obscuros e complexos. Sabe o que quero dizer? Tornou-se sujo.  Tornou-se imundo e intratável. Tornou-se uma área extremamente sensível e complicada, basicamente uma área proibida”. Ele então culpou o abuso de transplantes de órgãos na China à Zhou Yongkang, o deposto ex-chefe de segurança. Prisioneiros de consciência, claro, jamais foram mencionados.

Teorias sobre como o Primeiro Hospital Central de Tianjin tornou-se um fluxo de órgãos, portanto, giram em torno de seus vínculos políticos, incluindo os de Shen Zhongyang, que se tornou um membro do pretenso corpo de conselheiros do Partido Comunista, a Conferência Consultiva Política Popular da China. Shen é também um membro do comitê em atividade do Partido Democrático dos Camponeses e Trabalhadores Chineses, um dos oito partidos políticos legalizados na China que geram uma fachada de democracia enquanto estritamente são regidos pelas diretrizes do PCC.

Mas é seu título paramilitar que é mais significativo para o fornecimento de órgãos, dado que hospitais militares e paramilitares estão conectados ao aparato de segurança que detém centenas de milhares de prisioneiros políticos e acredita-se que estejam envolvidos em muito do tráfico ilegal de órgãos humanos

Um punhado de investigadores vem rastreando o vínculo entre estes órgãos e o setor militar há anos. Em seu livro de 2014 “The Slaughter: Mass Killings, Organ Harvesting, and China’s Secret Solution to its Dissident Problem”, o jornalista americano Ethan Gutmann organiza uma vastidão de evidências, coletadas ao longo de quase uma década, para mostrar que praticantes de Falun Gong, uma disciplina espiritual tradicional, tem sido alvos primários para a colheita de órgãos.

Praticantes de Falun Gong exigindo que o ex-presidente chinês Jiang Zemin seja levado à justiça em uma vigília à luz velas frente ao Consulado da China em Los Angeles no dia 15 de outubro de 2015, dedicada àqueles mortos durante 16 anos de perseguição na China (Benjamin Chasteen/Epoch Times)
Praticantes de Falun Gong exigindo que o ex-presidente chinês Jiang Zemin seja levado à justiça em uma vigília à luz velas frente ao Consulado da China em Los Angeles no dia 15 de outubro de 2015, dedicada àqueles mortos durante 16 anos de perseguição na China (Benjamin Chasteen/Epoch Times)

Falun Gong, uma prática para cultivar a si próprio envolvendo exercícios e ensinamentos morais, vem sendo perseguida na China desde 1999, após o líder do Partido Comunista Chinês à época, Jiang Zemin, declará-la um desafio à autoridade partidária. Por volta do final da década de 1990, o número de pessoas praticando parecia exceder o de membros do Partido Comunista.

Centenas de hospitais por toda a China, como o Primeiro Hospital Central de Tianjin, todos presenciaram um incisivo pico nos transplantes de órgão em 2000, o ano após o início da perseguição em julho de 1999.

“Não há neste momento uma distribuição nacional de órgãos. Não há um sistema de doação de órgãos. A resposta oficial é a pena de morte”, diz David Matas. “Mas então você tem problemas de tamanho dos órgãos e compatibilidade de tipos sanguíneos, hepatite na prisão, tempos de espeta muito curtos, tudo isso”.

Sem nenhuma explicação oficial para o amontoado de perguntas sem respostas, suspeitas, e crescentes provas circunstanciais, “você acaba sendo levado novamente ao que eu, David Kilgour e Ethan Gutmann temos dito”, afirma Matas. “Que são prisioneiros de consciência”. Ele continua: “quanto maior a escala, mais necessária é uma explicação, e essa explocação não está vindo a público. Não nenhuma outra fonte óbvia”.

Gutmann, questionado sobre qual ele pensava ser a provável fonte dos órgãos de Tianjin, replicou em uma entrevista por telefone: “Eu acho que a maioria destes órgãos são oriundos do Falun Gong”. Ele complementou: “Houve um grande grupo encarcerado de praticantes de Falun Gong, entre meio milhão a um milhão de detentos circulavam habitualmente pelo sistema de laogais ao longo de todo este período”, utilizando-se do terno chinês para referir-se ao sistema de campos de trabalho.

(L–R) David Kilgour (L) with David Matas (C) and Ethan Gutmann (R), author of 'The Slaughter: Mass Killings, Organ Harvesting, and China's Secret Solution to Its Dissident Problem.' (Simon Gross/Epoch Times)
(Da esquerda para a direita) David Kilgour, David Matas e Ethan Gutmann, autor de “The Slaughter: Mass Killings, Organ Harvesting, and China’s Secret Solution do Its Dissident Problem” (Simon Gross/Epoch Times)

“Esta é a única fonte em potencial, numericamente, de onde podem estar obtendo. Pode haver alguns muçulmanos uigures e tibetanos nisto também, apesar de as tacas de desaparecimento não serem tão altas para estas comunidades”.

As entrevistas de Gutmann realizadas com centenas de refugiados apontam que um em cada cinco e, ocasionalmente, dois em cada cinco detentos praticantes de Falun Gong eram submetidos a testes sanguíneos enquanto em reclusão. Aqueles libertos de campos de trabalho também descrevem o desaparecimento dos praticantes testados. Em ligações secretamente gravadas com investigadores internacionais desde 2006, médicos e enfermeiras na China, acreditando estar falando com outros médicos ou com parentes de indivíduos com necessidade urgente de um novo fígado, reconheceram que obtém seus órgãos a partir dos praticantes de Falun Gong.

Em seu livro, Gutmann descreve que ao ouvir pela primeira vez sobre os exames médicos, sua entrevistada, uma adepta refugiada do Falun Gong, não lhes deu muita importância. “O que ela estava descrevendo era terrível e inexplicável – ao invés de um médico seguindo com um exame de rotina, era mais como se estivesse escolhendo um corpo fresco… Eu lembro de sentir um arrepio incomum conforme minha segura e protetora capa de ceticismo caia por um instante”.

Exames de Sangue de Tianjin

Assim como em campos de trabalho através do país, há relatos pessoais de prisioneiros de consciência em Tianjin sendo selecionados para testes de sangue e urina durante o período no qual o Primeiro Hospital Central de Tianjin esteve em seu pico de operações.

Estes registros são retirados do Minghui.org uma fonte de informação em primeira mão quanto ao Falun Gong na China. Artigos no website são comumente enviados por praticantes de Falun Gong e seus amigos e familiares, frequentemente documentando suas experiências sob a perseguição. O website é amplamente utilizado por acadêmicos e pesquisadores de direitos humanos estudando a prática ou sua repressão, e é considerado uma fonte confiável para obter discernimento quanto à comunidade do Falun Gong na China.

A Prisão Feminina de Tianjin, a uma curta jornada do Primeiro Hospital Central de Tianjin. Praticantes detidas na prisão informam haver sido submetidas a testes sanguíneos (Minghui.org)
A Prisão Feminina de Tianjin, a uma curta jornada do Primeiro Hospital Central de Tianjin. Praticantes detidas na prisão informam haver sido submetidas a testes sanguíneos (Minghui.org)

Ao pesquisar o Minghui.org pelas palavras “retirar sangue”, “exame físico” e “exame de sangue” em chinês, cada uma pareada com a palavra “Tianjin”, encontram-se 119; 393 e 69 registros respectivamente, apesar de alguns possivelmente serem duplicatas.

Um típico caso, enviado em 9 de novembro de 2007, intitula-se “A perseguição que testemunhei e sofri na Prisão Feminina de Tianjin”. Bem como muito do material enviado ao Minghui, o relato é anônimo, por motivos óbvios. Ele diz: “O Terceiro Esquadrão na prisão especificamente alvejava o Falun Gong… o líder das tropas de cada grupo do Terceiro Esquadrão em diferentes setores da prisão convocava os praticantes de Falun Gong um por um e lhe aplicava exames de sangue e de urina. Não eram chamados os prisioneiros criminosos. O líder do esquadrão disse ser por quererem cuidar dos prisioneiros vinculados ao Falun Gong”. A prisão está a cerca de 30 minutos de viagem do hospital.

A autora, refletindo sobre sua experiência, escreve: “Eu ainda me pergunto onde estes praticantes que desapareceram acabaram indo”.

Outros casos de testes sanguíneos são relatados no Campo de Reeducação pelo Trabalho de Qingbowa. Qingbowa está a 23 minutos de viagem do Primeiro Hospital Central de Tianjin. O Campo de Reeducação pelo Trabalho de Shuangkou é outro campo no qual, de acordo com relatos publicados via Minghui, praticantes de Falun Gong noticiam haver recebido exames de sangue enquanto detidos. Shuangkou está também a cerca de 30 minutos de viagem do Primeiro Hospital Central de Tianjin. A praticante de Falun Gong Hua Lianyou conta que seu sangue foi extraído em junho de 2013 na Prisão de Binhai, que fica a cerca de 45 minutos do Primeiro Hospital Central de Tianjin. Xu Haitang, uma praticante de Falun Gong, conta que seu sangue foi extraído em junho de 2006 no Campo de Trabalho para Mulheres em Banqiao, que está a aproximadamente 90 minutos de distância.

A Doctors Against Forced Organ Harvesting (N. do T.: “Médicos Contra a Colheita Forçosa de Órgãos”, em tradução livre), associação de defesa médica, conduziu sua própria análise preliminar quanto a estes relatos de testes sanguíneos publicados via Minghui, escrevendo: “Ao examinar os testemunhos de sobreviventes, foi evidenciado que os exames médicos não foram ocorrências isoladas. Enquanto casos isolados como referência poderiam não ser significantes, estes dados revelam um número expressivo de relatos de vítimas que não são eventos únicos, e sugerem um uso sistemático de diversos exames médicos impostos a praticante de Falun Gong detidos”.

É claro, nada disso é prova de que os exames de sangue incorriam no propósito de pareamento para transplante de órgãos.

Mas também é verdade que a verdadeira razão para testes de sangue e de urina não é clara, e pode mesmo ser confusa: Indivíduos encarcerados estão, afinal de contas, na prisão devido a uma campanha advinda dos mais altos escalões do Partido Comunista para erradicar seu sistema de crença. Eles são costumeiramente sujeitados a tortura, choque elétricos e espancamentos em sua detenção, em tentativas de fazê-los renunciar a sua fé. O Falun Gong foi achincalhado pela mídia estatal, havendo incitação contra seus adeptos, desumanizados, escarnecidos, declarados inimigos de Estado. Milhares de mortes por tortura foram relatadas, e nenhuma investigação ou punição ocorre devido à natureza da campanha, sancionada pelo Estado. Então, por que oficiais das prisões extrairiam sangue para o bem dos detentos?

Esse é o contexto que levou analistas a acreditar que os testes sanguíneos e desaparecimentos enquanto em reclusão de praticantes de Falun Gong, bem como a explosão no número de transplantes que ocorreu logo após a perseguição começar, são muito provavelmente explicados por colheita de órgãos em grande escala.

O Estranho Silêncio

Mesmo se a comunidade médica internacional desejasse se ausentar de conclusões precipitadas quanto a um gigantesco crime contra a humanidade, poder-se-ia ao menos esperar uma exigência por maior atenção e investigação quanto à fonte dos órgãos e a que ponto prisioneiros de consciência foram alvejados. Este seria, afinal de contas, um dos mais perturbadores crimes perpetrados em massa no século XXI.

De fato, algumas instituições e indivíduos de respeito deixaram claro que observam um sério problema, e que a ideia de colher órgãos de praticantes de Falun Gong não deve ser relegada ao plano de ficção científica ou teoria da conspiração. O Comitê das Nações Unidas contra a Tortura disse em 2008: “O Estado deve imediatamente conduzir ou comissionar um investigação independente quanto às alegações de que alguns praticantes de Falun Gong foram […] utilizados para fins de transplante de órgãos e tomar medidas, conforme apropriado, para garantir que aqueles responsáveis por tais abusos sejam processados e punidos”.

Arthur Caplan, o especialista em ética no Centro Médico da Universidade de Nova Iorque, cedeu seu nome a uma petição de 2012 solicitando à Casa Branca que “investigue e condene publicamente a colheita de órgãos de adeptos do Falun Gong na China”. Em uma entrevista à época, disse: “Eu acredito que não se pode ficar calado quanto a matar por órgãos. É hediondo demais. É simplesmente errado demais. Viola todas as ideias de direitos humanos”.

Dr. Arthur Caplan, diretor da Divisão de Bioética do Centro Médico Langone, da Universidade de Nova Iorque. Em 2012 Caplan foi um dos proponentes de uma petição solicitando ao governo estadunidense que investigasse a prática do Partido Comunista Chinês de matar prisioneiros de consciência por seus órgãos (Universidade de Nova Iorque)
Dr. Arthur Caplan, diretor da Divisão de Bioética do Centro Médico Langone, da Universidade de Nova Iorque. Em 2012 Caplan foi um dos proponentes de uma petição solicitando ao governo estadunidense que investigasse a prática do Partido Comunista Chinês de matar prisioneiros de consciência por seus órgãos (Universidade de Nova Iorque)

O recente documentário “Human Harvest” (N. do. T.: “Colheita Humana”, em tradução livre), que diretamente endereça a questão da colheita de órgãos de praticantes de Falun Gong, recebeu um prestigioso Peabody Award em 2014, o equivalente para o gênero de um Prêmio Pulitzer. O recebimento de um Peabody requer apoio unânime de 17 membros de seu conselho que, em sua síntese do documentário, descreveram um “altamente lucrativo, monstruoso sistema de doação forçada de órgãos”.

Alguns países, incluindo Israel e Taiwan, adotaram legislação destinada a prevenir que seus cidadãos viagem à China para receber órgãos, após os relatórios de colheita de órgãos de praticantes de Falun Gong emergirem.

Tudo isto torna a reação de algumas das pessoas de destaque no contexto dos transplantes internacionais de órgãos – o tipo de indivíduo cujo aval geraria apoio público o suficiente às acusações para impulsionar uma maior censura internacional e maior demanda por uma investigação – especialmente estarrecedora. Eles não vêm apresentando curiosidade alguma quanto à questão de crimes contra a humanidade, adotando ao invés uma postura complacente, parte de um esforço kissingeriano para fomentar o projeto da reforma da indústria de transplantes na China.

Dr. Francis Delmonico, o antigo diretor da Transplantation Society e anteriormente o principal intermediário internacional com a China em questões de transplante, escreveu em um e-mail: “Meu único comentário é incentivar que o Primeiro Hospital Central de Tianjin de disponibilize dados verificáveis”. A palavra “único” estava destacada em negrito.

Médicos como Jeremy Chapman, antigo diretor da Transplantation Society que habita em Sydney, e o Dr. Michael Millis, um cirurgião especializado em fígados na escola médica da Universidade de Chicago que trabalhou juntamente a oficiais chineses, também demonstraram pouco interesse em perseguir as perguntas difíceis. Quando pressionados quanto ao Falun Gong ser a principal fonte de órgãos, Millis pontuou em uma entrevista com Martina Keller, uma jornalista da revista alemã Die ZEIT, que “essa não é minha esfera de influência. Há muitas coisas no mundo que não são meu foco ou interesse”.

“”Este tipo de curiosidade importa. Primeiramente, porque a verdade importa; perigos morais importam; direitos humanos importam; e as vidas dos explorados, mesmo que mortos, importam. Eles possuem sobre nós uma reivindicação moral”” -Kirk Alisson, diretor do Programa de Direitos Humanos e Saúde | Universidade do Minnesota

O atual diretor da Transplantation Society, Dr. Philip O’Connel, e o intermediária com a China da Organização Mundial da Saúde, Dr. Jose Nuñez, não responderam a e-mails. Os fundamentos para transplante de órgãos da OMS requerem que todo o processo de transplantar o órgão seja transparente e aberto a escrutínio – Ainda assim, oficiais da OMS fizeram pouco para afirmar tais demandas públicas na China.

Respondendo à relativa escassez de atenção prestada por médicos à questão dos órgãos em flta, Kirk Alisson, diretor do Programa de Direitos Humanos e Saúde na Universidade do Minesota, escreveu em um e-mail: “Este tipo de curiosidade importa. Primeiramente, porque a verdade importa; perigos morais importam; direitos humanos importam; e as vidas dos explorados, mesmo que mortos, importam. Eles possuem sobre nós uma reivindicação moral”.

Dr. Lavee, o respeitado cirurgião cardiovascular, escreveu em um e-mail: “Eu me sinto envergonhado que meus colegas ao redor do mundo não sintam, como eu, o dever moral de solicitar que a China abra seus portões para uma investigação e meticulosa inspeção  independente de seu atual sistema de transplantes pela comunidade internacional de transplantes”.

Completou: “Como filho de um sobrevivente do Holocausto, sinto-me obrigado a não repetir o terrível erro cometido pela delegação de visita da Cruz Vermelha ao campo de concentração nazista de Theresinstadt em 1944, afirmando que era um agradável campo de recreação”.

Sophia Fang contribuiu na pesquisa para esta reportagem

Atualizações em 13 de fevereiro de 2016: As fontes de dados oficiais quanto aos números cumulativos de transplante de fígado foram esclarecidas: a estimativa de 5,000 ao fim de 2010 é oriunda de um discurso por Shen Zhongyang no website da unidade de táticas de guerra política do Partido Comunista Chinês, o Departamento da Frente Unida do Trabalho, não do perfil de Shen no website oficial do governo municipal de Tianjin. O website é ao invés fonte do número cumulativo de 10,000 transplantes de fígado até 2014. Maiores informações de identificação foram disponibilizadas quanto ao documento de 22 páginas do Banco de Dados de Construção e Remodelação da China, utilizado para referenciar dados de ocupação de leitos para transplantes de fígado e rins. Maiores informações foram disponibilizadas quanto à média de tempo de internação para um receptor de órgãos em centros de transplantes chineses, o que levou a uma cadeia de estimativas diferentes para o número cumulativo de transplantes que potencialmente ocorreram. Um link foi disponibilizado levando a uma planilha que tabula esta cadeia de estimativas e um gráfico foi adicionado demonstrando uma projeção do número cumulativo de transplantes em potencial dada a premissa de uma estadia de um mês, contraposta com os dados oficiais. Um parágrafo que fazia menção a Shen Zhongyang haver realizado múltiplos transplantes de fígado em um único paciente foi removido por somente existir uma ocasião informada de Shen haver feito isto, portanto, não sendo uma adição substancial ao número de transplantes feitos. Uma outra forma de pesquisar o website Minghui.org – diretamente através da interface do site, ao invés de por uma ferramenta de busca do google – foi utilizada, e uma série de outros termos, não apenas “exame de sangue”, foi utilizada. Este proporcionou uma menor, mas mais precisa estimativa do número de exames sanguíneos ou físicos ocorridos em campos de trabalho próximos a Tianjin. A tradução usada no artigo original do termo “抽血” significando “teste de sangue” foi alterada para “retirar sangue”, que é mais preciso.

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