Regime chinês faz cerco à indústria de semicondutores dos EUA

18/01/2018 18:36 Atualizado: 13/03/2018 08:25

No centro da economia moderna está o semicondutor, e os Estados Unidos é o líder mundial na produção de microchips. Agora, a China está buscando por todos os meios, sujos ou não, desafiar a preeminência dos EUA.

Um tribunal em San Jose, Califórnia, é o último campo de batalha nesta guerra industrial em andamento. Em 30 de novembro, quatro ex-engenheiros da Applied Materials Inc., uma empresa americana que fornece equipamentos e software para a fabricação de chips de semicondutores, foram indiciados por roubarem projetos de chips da empresa e tentarem usá-los para iniciarem uma startup chinesa, de acordo com a Bloomberg.

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Os quatro homens – Liang Chen, Donald Olgado, Hsu Weiyung e Robert Ewald – baixaram dados, incluindo mais de 16 mil projetos, da base interna de dados de engenharia da empresa. As informações roubadas também incluíram detalhes sobre a fabricação em grande escala de bolachas semicondutoras usadas na alimentação de televisores de tela plana e smartphones.

Eles foram acusados em 15 de dezembro e, se condenados, podem enfrentar até 10 anos numa prisão federal.

Atividades de “soma zero”

Os chips estão por trás de tudo, desde aparelhos eletrônicos, como celulares e computadores, até equipamentos militares, como mísseis balísticos e satélites. A demanda por chips com alto poder de computação só aumentou com a necessidade de suportar o crescimento rápido de indústrias de tecnologia, como a computação em nuvem e criptomoeda como bitcoin.

Os chips são produzidos transformando bolachas de substrato de silício em circuitos integrados. Fabricar a geração atual de chips mais poderosos requer processos de alta tecnologia que são segredos fortemente protegidos de empresas como Intel, IBM, Taiwan Semiconductor Manufacturing Company e Samsung.

O Conselho de Assessores de Ciência e Tecnologia, um grupo consultivo do presidente dos Estados Unidos, emitiu um relatório intitulado “Garantindo a Liderança de Longo Prazo dos EUA em Semicondutores“, em janeiro de 2017, pouco antes do então presidente Barack Obama deixar o cargo.

O relatório advertiu sobre as atividades de “soma zero” da China para avançar sua própria indústria de semicondutores, incluindo o roubo de propriedade intelectual tanto “secreta e abertamente”. Uma das táticas é sujeitar as empresas de tecnologia norte-americanas que operam na China a avaliações de segurança, que o relatório diz que podem ser usadas para “obter acesso ao conhecimento detalhado das tecnologias de semicondutores”. Outra tática chinesa é forçar a transferência de tecnologia em troca do acesso ao mercado chinês, de acordo com o relatório.

Por último, mas não menos importante, o relatório apontou que as empresas chinesas, com o financiamento do Estado, conspiram para depreciar o valor das empresas estrangeiras que desejam adquirir, usando táticas de manipulação comercial, antes de comprar essas empresas quando os preços das ações caem.

Essas táticas fazem parte de uma estratégia de longo prazo do regime chinês de roubar propriedade intelectual. De acordo com um relatório de 2017 da Comissão sobre o Roubo da Propriedade Intelectual dos EUA, a China ainda é o maior ladrão de propriedade intelectual do mundo, com 87% de todos os produtos falsificados que entram nos Estados Unidos provenientes da China.

AMEC

A China atualmente está atrás dos Estados Unidos e de muitos outros países na fabricação de chips mais avançados. Suas fundições de semicondutores ainda estão mais de uma geração atrás da tecnologia de processamento mais avançada.

No entanto, como o relatório aponta, a China planeja estar num “nível avançado mundial [de capacidade de semicondutores] em todos os principais segmentos da indústria até 2030”.

Atualmente, o país não possui empresas de equipamentos semicondutores de primeiro nível, que são empresas que fornecem equipamentos diretamente aos fabricantes de equipamentos, mas possui uma empresa de segundo nível chamada Advanced Micro-Fabrication Equipment Inc. (AMEC).

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O relatório falhou em mencionar como a AMEC surgiu. O fundador e CEO da empresa, Gerald Zhiyao Yin, que obteve um doutorado em química física da Universidade da Califórnia-Los Angeles, costumava ser o vice-presidente sênior da Applied Materials, responsável pelo departamento de gravação por plasma da empresa.

Yin contribuiu com 86 patentes enquanto trabalhava na Applied Materials, de acordo com uma reportagem de 6 de dezembro do portal de notícias chinês Tencent. Mais tarde ele desistiu do emprego e voltou à China, levando consigo um grupo de mais de 30 engenheiros seniores para estabelecer a AMEC. Hoje, os principais produtos da empresa são máquinas de gravação por íons e sistemas MOCVD. Ambos os dispositivos são essenciais para a produção de chips.

De acordo com vários relatos da mídia chinesa, Yin uma vez apresentou o seguinte como motivo para ir aos Estados Unidos: “Eu só estudei até agora para que um dia eu possa voltar à minha pátria, para permitir que os chips chineses tenham um lugar no mundo.”

Batalhas na Justiça

A AMEC conseguiu fabricar máquinas de gravação avançadas desde 2008, um movimento que resultou em processos de patentes da Applied Materials e Lam Research Corp., um fornecedor de equipamentos de processamento de semicondutores com sede em Fremont, Califórnia. De acordo com a revista eletrônica online EE Times, em janeiro de 2010, a AMEC e a Applied Materials resolveram todos os litígios, na sequência de um processo iniciado pela Applied Materials acusando a AMEC de apropriação indevida de segredos comerciais. O caso da Lam foi indeferido.

Em janeiro de 2011, um tribunal chinês rejeitou o apelo da Lam sobre a decisão de um tribunal de primeira instância de janeiro de 2009 que havia indeferido uma ação de violação de patente em relação a uma das máquinas de gravação química da AMEC. Os tribunais chineses são notórios por proteger empresas chinesas.

Os chips de hoje estão ficando cada vez menores em tamanho. Um dos motivos para isso é o tamanho reduzido dos aparelhos eletrônicos. Outro é a necessidade de maior poder de computação; chips menores possuem maior potência e eficiência.

Em junho, a IBM, em parceria com a Samsung e a GlobalFoundries, anunciou que desenvolveu um processo para a construção de chips de 5 nanômetros. Segundo a IBM, esses chips mais recentes serão 40% mais rápidos do que os chips atuais. Se operarem na mesma velocidade que os chips de hoje, os novos chips economizarão 75% de energia.

Alguns meses antes, em abril de 2017, a AMEC anunciou seus próprios avanços no processo de produção de chips de 5 nanômetros, com planos para lançar uma nova ferramenta de gravação de 5 nanômetros até o final de 2017.

Em 11 de dezembro, a AMEC registrou outra vitória judicial, de acordo com o DigiTimes, um jornal focado na indústria de TI e com sede em Taipei. Um tribunal superior da província da Fujian, na China, ordenou uma liminar contra uma subsidiária da Veeco, uma fabricante de equipamentos de processo de semicondutores com sede em Nova York e que tem operações em Xangai. A injunção impediu a empresa de importar, fabricar e vender três modelos de seus conjuntos MOCVD, bloqueando assim um produto-chave de um concorrente da AMEC do mercado chinês.

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