Prisões de cristãos na China durante época de Natal: uma nova era de perseguição religiosa?

Estimativas independentes sugerem que existem mais de 100 milhões de cristãos na China

28/12/2018 13:04 Atualizado: 28/12/2018 13:04

Por Jocelyn Neo

O aroma do Natal ainda está no ar de dezembro e o charme do novo ano está pronto para nos abraçar em pouco tempo. Mas a imagem geral de “fim do ano” do mundo continua a nos mostrar cenas bastante sombrias e, infelizmente, não poderemos corrigi-las tão cedo.

Por exemplo, enquanto pessoas de todo o mundo estão curtindo as férias com seus entes queridos, na China a história é completamente diferente. Recentemente, cristãos de igrejas domiciliares na China estão enfrentando mais uma vez prisões em massa e vigilância permanente por se recusarem a renunciar à sua fé.

Nos dias 9 e 10 de dezembro, um pastor e mais de cem paroquianos da Igreja da Aliança da Chuva Precoce, uma igreja protestante independente de Chengdu, província de Sichuan, ficaram sob custódia da polícia porque a igreja não estava registrada junto às autoridades chinesas. Apenas cinco dias depois disso, em 15 de dezembro, a cidade de Langfang, perto de Pequim, proibiu todas as atividades relacionadas ao Natal.

(Kevin Frayer/Getty Images)
(Kevin Frayer/Getty Images)

Conforme relatado em um artigo anterior do Epoch Times, o memorando das autoridades chinesas dizia: “Parar completamente as vendas de Papai Noel, árvores de Natal, maçãs de Natal e todas as outras vendas relacionadas ao Natal”. O memorando afirmava que, particularmente em 23 e 24 de dezembro e no dia de Natal, “cada agente da ordem pública deve fazer o seu trabalho” e “controlar estritamente qualquer tipo de propaganda e comércio, retirar e reprimir os vendedores ambulantes”.

Em 18 de dezembro, a polícia interrompeu uma aula bíblica na Igreja Rongguili, em Guangzhou. No início de setembro deste ano, outra igreja não registrada, a igreja de Sião em Pequim, foi fechada. O regime chinês oficialmente qualifica as igrejas não registradas na China como “igrejas clandestinas”.

Policial chinês armado monta guarda diante de uma árvore de Natal em frente a um complexo diplomático em Pequim, China, em dezembro de 2000 (Goh Chai Hin/AFP/Getty Images)
Policial chinês armado monta guarda diante de uma árvore de Natal em frente a um complexo diplomático em Pequim, China, em dezembro de 2000 (Goh Chai Hin/AFP/Getty Images)

Na repressão recentemente ocorrida, o pastor principal Wang Yi, da Igreja da Aliança da Chuva Precoce, que antes era ativista de direitos humanos, foi detido e preso por “incitar a subversão do poder do Estado”, segundo a notificação oficial que sua mãe recebeu das autoridades chinesas, relatou Human Rights Watch (HRW).

As autoridades chinesas saquearam e fecharam os escritórios da Igreja, uma escola bíblica, um jardim de infância, um seminário e casas dos frequentadores. Os membros da paróquia também foram forçados pela polícia a assinar um compromisso prometendo que não voltariam à igreja.

A congregação publicou uma carta de oração em sua página no Facebook, declarando que os três membros que mais tarde foram libertados foram espancados pela polícia enquanto estavam sob custódia. Além disso, um membro denunciou que foi privado de comida e água por 24 horas.

Em agosto deste ano, Wang Yu, uma proeminente advogada chinesa de direitos humanos que se encarregou de casos de cristãos perseguidos, disse à Reuters que teme que a situação se agrave quando a igreja de Sião, em Pequim, for desalojada. Em abril, as autoridades ordenaram que a igreja instalasse 24 câmeras de circuito fechado no prédio, um pedido que a igreja recusou.

秋雨圣约教会紧急代祷信息07号…

Posted by 秋雨圣约教会 on Monday, December 10, 2018

“Eles queriam colocar câmeras no santuário onde são realizados os cultos. A igreja decidiu que isso não é apropriado”, disse o pastor Jin Mingri à Reuters. “Nossos cultos representam um momento sagrado”.

Em setembro, as autoridades chinesas finalmente fecharam a “igreja domiciliar” de 11 anos de existência. A igreja havia dito anteriormente em uma de suas declarações que as autoridades chinesas até mesmo costumavam chamar a igreja de seita, um termo que o PCC usa frequentemente para difamar grupos religiosos e espirituais.

“Ser qualificado como uma seita, foi assim que tudo começou para o Falun Gong em 1999”, disse Wang à Reuters ao se referir à perseguição contra a disciplina espiritual também conhecida como Falun Dafa.

Falun Dafa é uma antiga disciplina de cultivo da Escola Buda, baseada nos princípios da Verdade, Compaixão e Tolerância. A prática de meditação pacífica e auto-aperfeiçoamento foi apresentada na China em maio de 1992 e tornou-se cada vez mais popular em poucos anos devido aos imensos benefícios que sua prática acarreta para a saúde. De acordo com relatos da mídia estatal, até o final da década de 1990, o número de praticantes chineses do Falun Dafa havia chegado a 100 milhões.

Em julho de 1999, o PCC lançou uma repressão brutal contra a disciplina, o que levou muitos praticantes do Falun Dafa a serem vigiados, presos e torturados sob custódia da polícia, com numerosos casos de morte. Investigações independentes revelaram que a atividade de extração forçada de órgãos financiada pelo PCC tem como fonte principal de órgãos as pessoas que são presas por suas crenças, principalmente praticantes do Falun Dafa, cristãos de igrejas domiciliares, budistas tibetanos e muçulmanos uigures.

Nesta foto de arquivo, praticantes do Falun Dafa realizam exercícios em Guangzhou, China, antes do início da perseguição (End Transplant Abuse in China)
Nesta foto de arquivo, praticantes do Falun Dafa realizam exercícios em Guangzhou, China, antes do início da perseguição (End Transplant Abuse in China)

Alguns dos métodos mais comuns de tortura física usados nesses prisioneiros presos por causa de suas crenças religiosas incluem espancamentos, choque com bastões elétricos, alimentação forçada, exposição ao calor e ao frio extremos, confinamento em minúsculas jaulas, uso de algemas por longos períodos e injeções de drogas perigosas.

O pastor Bob Fu, fundador e presidente da ChinaAid, uma organização cristã de direitos humanos, disse em um comunicado que o súbito ataque maciço contra membros da igreja “representa um aumento significativo da perseguição religiosa na China” e que esta escala maior de prisões mostra que o regime do líder Xi Jinping “está deliberadamente se tornando um inimigo dos valores universais, como a liberdade religiosa para todos”.

Ele acrescentou: “ChinaAid apela à comunidade internacional para que condene essas prisões arbitrárias de devotos religiosos inocentes e insta o regime chinês a libertá-los imediatamente”.

De acordo com o Conselho de Relações Exteriores, estimativas independentes sugerem que existem mais de 100 milhões de cristãos na China, um número que excede o de membros do Partido Comunista Chinês, levando a um aumento da repressão religiosa.

(China Photos/Getty Images)
(China Photos/Getty Images)

Embora os cristãos enfrentem uma repressão sem precedentes do regime comunista oficialmente ateu, sua fé permanece inabalável.

“As igrejas domiciliares acreditam que nossas necessidades espirituais e o conteúdo de nossa fé são governados por Deus”, disse Jin à Reuters. “O que precisamos é de liberdade para acreditar. Sem isso, não é fé real”.

愿赤县不赤基督是主,盼神州归神恩典为王。——王怡牧师

Posted by 秋雨圣约教会 on Sunday, June 3, 2018

Quarenta e oito horas depois de o pastor Wang ter sido preso, membros da igreja divulgaram uma declaração anteriormente escrita por ele e que ele havia instruído a divulgar, caso passassem por uma situação como essa.

O pastor Wang escreveu: “Estou cheio de raiva e desgosto por causa dessa perseguição contra a igreja praticada por esse regime comunista, pelo mal de privar seu povo da liberdade de religião e consciência”.

“Eu aceito e respeito o fato de que Deus permitiu que esse regime comunista governasse temporariamente”, escreveu ele. “Não importa de que crime o regime comunista me acuse, qualquer lixo que seja jogado contra mim […] eu nego tudo categoricamente.”