Enquanto o primeiro-ministro canadense Justin Trudeau visita a China numa missão comercial que visa aprofundar os laços com o país comunista, um ex-prisioneiro de consciência tem se pronunciado sobre um plano sinistro do regime chinês.
He Lizhi, atualmente residindo em segurança em Toronto, no Canadá, em março de 2000, quando ainda estava na China, foi sequestrado pela polícia devido a suas crenças espirituais e, mais tarde, durante sua prisão domiciliar, foi forçado a assistir a um vídeo interno confidencial do Partido Comunista Chinês (PCC) com o objetivo de “transformá-lo”.
O vídeo revelou o plano do PCC a respeito da liberdade de crença em todo o mundo, e a experiência afetou He Lizhi seriamente.
A gravação mostrou uma palestra dada por Ye Xiaowen, o chefe da Administração Estatal para Assuntos Religiosos (AEAR), às autoridades do Partido e dos diferentes ministérios do Conselho Estatal.
A apresentação da palestra ocorreu alguns meses após o então líder chinês Jiang Zemin iniciar uma campanha nacional de perseguição à disciplina espiritual tradicional do Falun Gong em 1999, mas encontrou resistência de altos funcionários do Partido, muitos dos quais inclusive praticavam a disciplina na época.
O chefe da AEAR foi encarregado de apresentar uma “conferência teórica” a altos funcionários para convencê-los de que a erradicação do Falun Gong é o que o Partido precisava fazer para alcançar seu objetivo final: a eliminação da religião e da espiritualidade da face da Terra e a extinção do conceito de Deus nas mentes das pessoas.
Ye Xiaowen explicou no vídeo que a razão pela qual o governo chinês ainda tolerava a liberdade religiosa em sua Constituição é uma tática temporária “enganadora” para não alienar excessivamente as muitas minorias na China que compartilham diferentes crenças e também ocupam grande parte da massa terrestre do país, recordou He Lizhi.
Mas o objetivo final, segundo Ye Xiaowen, é erradicar a espiritualidade, não apenas na China, mas em todo o mundo, e “educar” todos os cidadãos chineses para se tornarem ateus, isto é, aderir à religião do Estado.
“Mesmo no ambiente de lavagem cerebral da China, fomos ensinados a acreditar que o comunismo é bom porque ele promete que você terá tudo o que quiser. Eu nunca percebi que o Partido estava planejando eventualmente eliminar a liberdade de crença, e que as pessoas não teriam mais o conceito espiritual de Deus, e que o divino seria erradicado da mente das pessoas”, comentou He Lizhi.
Ele acrescentou que ficou estupefato porque o vídeo deixou claro que o regime quer “erradicar a crença espiritual do mundo”.
“Quando eu soube que o PCC estava visando eliminar a crença espiritual, meu primeiro pensamento foi que, na realidade, eles estavam querendo destruir a humanidade. É por isso que eu fiquei tão chocado.”
Os superiores de He Lizhi em seu local de trabalho (ele era um engenheiro civil premiado em Pequim) queriam que ele assistisse ao vídeo porque esperavam que isso o convencesse de abandonar sua prática do Falun Gong e assim “resgatá-lo” da campanha de perseguição do PCC, que poderia eventualmente destruir sua carreira, sua família e seu futuro.
‘Um lobo em pele de cordeiro’
Pouco depois que o PCC iniciou sua campanha de perseguição em julho de 1999, a Agência 610, um órgão de inteligência similar a Gestapo nazista, foi criada com a função específica de erradicar o Falun Gong, ou seja, identificar, capturar e enviar para campos de trabalhos forçados centenas de milhares de adeptos.
Muitos morreram sob tortura, muitos tiveram suas carreiras e famílias destruídas e, conforme revelado mais tarde por anos de investigações exaustivas, muitos foram executados para abastecer a indústria de transplante de órgãos na China, uma política enormemente lucrativa sancionada pelo regime chinês.
Um relatório divulgado no ano passado por pesquisadores canadenses e americanos demonstrou que este genocídio por órgãos, que teria realizado entre 60 e 100 mil transplantes forçados de órgãos desde 2000, é dirigido pelo Partido Comunista Chinês e conduzido pelos militares por meio de sua rede instituições estatais, hospitais e profissionais de transplante.
Tornou-se assim uma missão de suma importância para He Lizhi e outros adeptos do Falun Gong contrariarem pacificamente a propaganda dirigida contra a disciplina que tanto os beneficiou e cujos princípios orientadores são a verdade, a compaixão e a tolerância. Então, em cada oportunidade que lhe é concedida, He Lizhi começou a contar a conhecidos ou mesmo estranhos sobre os benefícios do Falun Dafa e sobre as mentiras do regime chinês. Depois de apelar publicamente pelo Falun Gong em março de 2000 na China, ele e sua esposa foram sequestrados pela polícia e detidos.
Os superiores bem-conectados de He Lizhi ficaram preocupados com ele e não queriam ver sua carreira e vida destruídas. Eles esperavam que vendo o vídeo isso o convencesse de que o PCC não permitiria a existência do Falun Gong. Mas He Lizhi não tinha qualquer intenção de abandonar a disciplina e sua fé e, por fim, ele sofreu três anos e meio de prisão por causa de suas crenças.
“O propósito de eles me mostrarem o vídeo era deixar claro para mim que a perseguição ao Falun Gong não era apenas uma decisão expedita e temporária, mas era algo decidido pelo Partido Comunista em consonância com seu objetivo de longo prazo e sua meta final”, disse ele.
He Lizhi finalmente foi libertado da prisão graças a uma campanha internacional de direitos humanos. Mas muitos prisioneiros de consciência não são tão afortunados; existem centenas de milhares de praticantes do Falun Gong que ainda estão presos na China e correm o risco de serem mortos por seus órgãos.
Ele disse que espera que os governos democráticos do mundo, incluindo o Canadá que tenta no momento promover um acordo de livre comércio com Pequim, não sejam enganados pela fachada pública apresentada pelo regime, chamando o PCC de “um lobo em pele de cordeiro”.
Ele acrescentou que se preocupa com o fato de que, com a China ganhando crescente influência internacional nos últimos anos, o regime possa um dia conseguir acabar com a liberdade de crença no mundo.
“Isso seria uma coisa terrível, já que as pessoas precisam ter liberdade para ter sua fé e suas crenças”, disse ele.