Perseguição ao Falun Gong na China enfraquece 18 anos após apelo decisivo

23/04/2017 07:00 Atualizado: 21/04/2017 15:46

Um ambiente seguro para praticar exercícios lentos e suaves e para meditar, isso foi tudo o que os praticantes do Falun Gong, uma prática espiritual tradicional chinesa, estavam pedindo quando se reuniram perto da sede da liderança chinesa em Zhongnanhai em 25 de abril de 1999.

No entanto, o apelo pacífico de 10 mil praticantes foi usado oportunisticamente pelo então líder chinês Jiang Zemin como uma desculpa para eventualmente lançar a mais recente, e possivelmente a mais brutal, campanha de perseguição do Partido Comunista Chinês (PCC).

A política oficial não mudou desde que Jiang clamou ter “derrotado” o Falun Gong há 18 anos, embora a campanha do Partido seja amplamente considerada como um grande fracassado.

Horrores da perseguição

O regime chinês inicialmente endossou o Falun Gong, também conhecido como Falun Dafa, após ter sido apresentado pela primeira vez ao público em 1992 por seu fundador, o Sr. Li Hongzhi. O Sr. Li recebeu prêmios de várias organizações estatais, incluindo o Ministério da Segurança Pública, pela eficácia do seu qigong (prática energética) em ajudar o povo chinês a manter-se saudável e a elevar sua moral.

A prática envolve fazer exercícios meditativos e viver de acordo com seus ensinamentos, baseados nos princípios de verdade, compaixão e tolerância. O Falun Dafa se espalhou rapidamente de boca em boca e em 1999 havia 70 a 100 milhões de praticantes na China, de acordo com estimativas oficiais e praticantes.

À medida que o número de pessoas praticando o Falun Gong se tornou maior do que os membros do Partido Comunista, o apoio oficial à prática transformou-se em vigilância.

Problemas então foram fabricados. A polícia subitamente prendeu 45 praticantes do Falun Gong na cidade costeira de Tianjin, a cidade portuária de Pequim, em 23 de abril de 1999, provocando o apelo em Zhongnanhai dois dias depois.

Aproveitando a oportunidade para usar o evento em seu favor, Jiang Zemin classificou o evento como um “cerco” e “o incidente político mais sério desde o 4 de junho”, referindo-se aos protestos dos estudantes pró-democracia de 1989 que o regime suprimiu com um massacre sangrento. Numa carta distribuída ao Politburo na noite de 25 de abril, Jiang Zemin expressou o temor de que o “marxismo, materialismo e ateísmo” promovidos pelo Partido não pudessem derrotar os ensinamentos do Falun Gong.

Três meses depois, Jiang Zemin iniciou uma campanha extremamente opressiva para eliminar o Falun Gong.

Nos primeiros anos da perseguição, todo o país foi bombardeado com propaganda de ódio contra o Falun Gong. Crianças em escolas corriam o risco de serem expulsas se se recusassem a participar na demonização do Falun Gong. As autoridades chinesas prometeram riquezas e promoções na carreira para aqueles que não questionassem ter sangue nas mãos.

Praticantes do Falun Gong foram presos por se recusarem a desistir de sua fé ou por compartilharem com seus concidadãos o que é o Falun Gong e como ele era perseguido. Uma vez presos, eles foram enviados para campos extralegais de trabalhos forçados ou outras instalações de detenção.

A maioria foi detida sem a formalidade de um processo judicial. Aqueles que foram levados ao tribunal foram processados ​​por distribuir ou possuir materiais do Falun Gong usando uma lei penal que os advogados chineses consideram vaga e inconstitucional.

De acordo com relatos de organizações de direitos humanos, os praticantes são geralmente submetidos ao pior tratamento entre prisioneiros ou detentos em campos de trabalhos forçados. O Minghui.org, um centro de informações especializado na perseguição ao Falun Gong, está repleto de relatos de praticantes que sofreram torturas de estilo medieval, espancamentos brutais e privação do sono. Mulheres praticantes enfrentam agressões sexuais, incluindo estupro em grupo por outros presos ou guardas.

Os praticantes do Falun Gong em detenção também compõem a maior parte dos prisioneiros de consciência que têm seus órgãos extraídos enquanto ainda estão vivos, a fim de abastecer o lucrativo comércio de órgãos do regime chinês, de acordo com um relatório de 2016 do jornalista investigativo Ethan Gutmann, do ex-secretário de Estado canadense (para Ásia-Pacífico) David Kilgour e do advogado internacional de direitos humanos David Matas. Esse relatório estima que a cada ano entre 60 e 100 mil chineses tiveram seus órgãos removidos à força no período de 2000 a 2015.

O Congresso dos Estados Unidos e o Parlamento Europeu aprovaram resoluções condenando severamente o regime chinês pela extração forçada de órgãos.

“Rachaduras na repressão”

Num relatório recente sobre a situação da religião na China, a Freedom House, uma organização de direitos humanos baseada nos EUA, escreveu que considera “muito alto” ainda hoje o grau de perseguição do regime chinês contra o Falun Gong.

Mas o regime chinês não conseguiu aniquilar a prática. Baseando-se em documentos oficiais chineses e dados do Minghui, a Freedom House estima que entre 7 e 10 milhões de praticantes do Falun Gong ainda estão ativos na China, enquanto fontes do Falun Gong sugerem que a cifra está entre 20 e 40 milhões.

“O simples fato de que o Falun Gong sobreviveu ao ataque do PCC é impressionante e equivale a um verdadeiro fracasso do aparato repressivo do Partido”, diz o relatório da Freedom House.

O relatório também observa que desde que o líder chinês Xi Jinping tomou posse em 2012, vários fatores causaram “rachaduras na repressão” contra o Falun Gong.

A campanha anticorrupção do líder chinês Xi Jinping resultou na purgação de oficiais-chave que supervisionavam a perseguição ao Falun Gong, como Zhou Yongkang, o ex-chefe da segurança pública, e Li Dongsheng, o ex-chefe da Agência 610, um órgão extralegal do regime chinês criado por Jiang Zemin especificamente para conduzir a perseguição ao Falun Gong.

As instituições que coordenam a perseguição foram enfraquecidas. Por exemplo, a Agência 610 sofreu várias mudanças de liderança desde a queda de Li Dongsheng e foi inspecionada pela primeira vez pelo órgão anticorrupção do regime em 2016. E nenhuma nova campanha anti-Falun Gong substituiu a mais recente de 2013 a 2015.

Uma confluência dos fatores acima parece ser a razão pela qual o sistema jurídico do regime descartou alguns casos contra praticantes detidos. Esse fenômeno inédito, iniciado no final de 2016, resultou em mais de 17 casos negados por procuradorias e tribunais locais.

“Um pouco mais de espaço”

A situação na província de Liaoning, no nordeste da China, uma das regiões mais severamente perseguidas, é um exemplo disso.

Funcionários-chave de Liaoning, Wang Min, ex-secretário do PCC em Liaoning, e Su Hongzhang, chefe do Comitê de Assuntos Político-Legislativos (CAPL) em Liaoning, foram purgados em 2015 e 2016, respectivamente. Wang e Su foram identificados como diretamente envolvidos em casos de perseguição pela Organização Mundial para Investigar a Perseguição do Falun Gong (WOIPFG), um grupo baseado nos EUA.

O contato direto com funcionários legais parece ter desempenhado um papel na rejeição pela promotoria local do caso contra Li Shijin e Lin Youyan, duas praticantes do condado de Tieling, em Liaoning, que foram presas por entregarem calendários com informações sobre o Falun Gong.

Os advogados que representam Li e Lin explicaram aos funcionários legais que o regime não tem qualquer lei que proíba o Falun Gong, de acordo com Minghui. Familiares das praticantes deram testemunhos sobre os benefícios da prática às autoridades chinesas. Os funcionários então sugeriram que os familiares apresentassem um recurso legal, o que mais tarde levou ao cancelamento do caso.

Quando as duas praticantes estavam detidas, elas falaram sobre o Falun Gong a outros presos e guardas. De acordo com Minghui, “todos nas celas e guardas se despediram delas e lhes desejaram bem” quando de sua soltura em 17 de fevereiro.

Pelo menos três outros praticantes de Liaoning tiveram casos contra eles cancelados e foram libertados desde abril de 2017, de acordo com informes do Minghui.

No entanto, os casos de reversão permanecem ofuscados pela maior incidência de perseguição. Liaoning encabeça a lista de regiões onde praticantes foram processados ​​em março de 2017, com 31 dos 110 casos relatados.

Heng He, um comentarista político sênior da New Tang Dynasty Television, acredita que a situação contraditória que surgiu em Liaoning e em outras áreas da China se resume à política.

“A perseguição ao Falun Gong viu o surgimento de um enorme grupo de interesses dos perseguidores”, disse Heng. “Os benefícios políticos, financeiros e outros que esse grupo de perseguidores usufrui dependem totalmente da possibilidade de a perseguição continuar ou não.”

Por outro lado, funcionários do aparato anti-Falun Gong têm “pouca margem de manobra para fazer suas próprias escolhas” na ausência de um contínuo incentivo político de cima para baixo, explicou Heng He. E alguns, talvez sentindo uma mudança nos ventos sob a liderança de Xi Jinping, optaram por exercer sua humanidade.