Entenda a estratégia chinesa de investimento no estrangeiro

01/07/2016 11:38 Atualizado: 03/07/2016 12:50

Nos últimos 20 anos, o investimento tem sido uma das principais estratégias econômicas da China. O investimento chinês no exterior tem crescido muito rapidamente nos últimos anos, atingindo 123,12 bilhões de dólares em 2015. Até meados de abril de 2016, outros 110 bilhões de dólares foram investidos no estrangeiro. Para os investidores estrangeiros, no entanto, a China não é mais um destino atraente, e para os chineses o investimento no exterior é mais uma forma de encontrar um refúgio do que buscar retornos elevados.

A verdadeira razão por trás das saídas de capitais da China é tentar evitar ou minimizar perdas substanciais na desaceleração econômica que enfrenta o país.

Investimento estrangeiro deixa a China

Desde 2009, a grande maioria dos investidores estrangeiros na China tem reduzido seus investimentos, saído completamente do mercado chinês ou desinvestido. Apenas na cidade manufatureira de Dongguan, 72 mil empresas fecharam entre 2008 e 2012. Em 2014, pelo menos outros quatro mil negócios fecharam e, em outubro de 2015, mais de duas mil empresas com financiamento de Taiwan partiram de Dongguan, deixando cinco milhões de trabalhadores desempregados.

O investimento estrangeiro tem recuado de diferentes maneiras, mas por uma única razão: as fábricas na China não são mais rentáveis. Um tempo atrás, as Câmaras de Comércio dos Estados Unidos e da União Europeia na China publicaram um relatório reclamando sobre a deterioração do ambiente de investimento da China. Uma queixa dos EUA foi que a China havia estabelecido “restrições” para limitar as empresas norte-americanas na China. Estas restrições incluíam o governo chinês lançar uma série de investigações sobre empresas estrangeiras e usar sua lei de segurança nacional para limitar o uso de tecnologias estrangeiras, o que danificou seriamente a confiança das empresas estrangeiras. Ambos os relatórios citaram uma longa lista de dados para ilustrar seus argumentos.

Como se para apoiar estas queixas, no final de maio de 2016, cinco prestigiadas empresas globais de manufatura anunciaram planos para desinvestir ou sair da China: entre elas, a Chicheng Communication, a maior produtora de coberturas metálicas para telefones móveis do mundo; Dongguan Xinda, o fabricante da mascote das Olímpiadas de Londres; Triumph International, uma conhecida empresa alemã em Yancheng, província de Jiangsu; e uma subsidiária de iluminação da Philips em Shenzhen.

Investimentos chineses no estrangeiro

A maioria do investimento chinês no exterior é feita por empresas estatais. Embora, de acordo com alguns relatos, 90% destes investimentos tenham resultado em perdas, é a estratégia do regime solucionar o problema da alta dependência da China de recursos externos.

O capital privado chinês também tem buscado projetos de desenvolvimento e altos lucros em outros países. Em 2011, as empresas privadas foram responsáveis por apenas 11% do investimento chinês no exterior. Mas em 2015 esse valor subiu para 41,2%. No entanto, observando os projetos e países de destino dos investimentos, torna-se evidente que o objetivo principal do capital privado chinês indo para o estrangeiro visa à segurança econômica e não o investimento industrial.

De acordo com o Relatório do Mercado de Investimento Estrangeiro da China de 2015, o investimento no exterior da China em imóveis cresceu 41,5% em 2015, para um recorde de 21,37 bilhões de dólares. A Malásia absorveu a maior fatia do capital chinês de investimento destinado ao desenvolvimento da terra, ou cerca de 2,52 bilhões de dólares, seguida por Hong Kong, Estados Unidos, Austrália e Singapura.

Em abril deste ano, o Grupo Rhodium e a Comissão Nacional de Relações EUA-China emitiram em conjunto o relatório “Novos Vizinhos—Atualização de 2016”. O documento observa que a partir do final de 2015, o número de empresas de financiamento chinês nos Estados Unidos atingiu mais de 1.900, espalhando-se por 362 dos 435 distritos eleitorais e empregando diretamente cerca de 90 mil funcionários em tempo integral nos EUA. As áreas principais de investimento são imóveis, finanças, tecnologia, cinema e entretenimento, e energia.

O relatório não mencionou que há um grande número de investimentos feitos no âmbito do Programa Investor Imigrante EB-5. Por exemplo, os projetos da Roda Panorâmica de Nova York em 2014, com um financiamento total de 380 milhões de dólares, recebeu investimento de centenas de chineses.

Os EUA atraem o maior volume do capital chinês, muito dele fluindo por meio do Programa Investor Imigrante EB-5. Até ao final do terceiro trimestre de 2015, o Serviço de Cidadania e Imigração dos EUA (USCIS) havia aprovado 6.498 aplicações do tipo EB-5, e a grande maioria era de investidores chineses.

Podemos concluir que o verdadeiro propósito da saída de capitais chineses da China é para resguardar-se contra crises econômicas. Se você acha que os pontos acima não são fortes o suficiente, aqui está outra notícia fresquinha: em maio, as importações da China por meio de Hong Kong aumentaram 242% ano-a-ano. Aqueles que estão cientes das atividades de lavagem de dinheiro da China sabem que este negócio de importação e exportação é fictício, e tem o objetivo na verdade de mover ativos para o estrangeiro.

A transferência de ativos para o estrangeiro resulta em perdas no mercado de câmbio, e o mercado de câmbio pode se tornar um grande problema para a economia chinesa. Isso levanta a questão se o governo chinês realmente incentiva o investimento no exterior.

O governo chinês definitivamente não quer essas saídas de capital privado em larga escala. Os planejadores financeiros do regime compreendem que a rápida perda de reservas cambiais produzirá riscos nos principais mercados, incluindo ações, títulos, imóveis, obrigações, fundos privados, etc., e eles também aumentam os riscos para o setor financeiro da China.

Mas há várias razões por que o governo chinês não pode colocar restrições às saídas de capital. Em primeiro lugar, Pequim ainda está fazendo esforços para atrair o investimento estrangeiro. Assim sendo, o regime não pode proibir a saída de dinheiro. Em segundo lugar, aqueles que têm enormes volumes de dinheiro para transferir são membros do Partido Comunista e seus familiares. Então, os políticos chineses só podem colocar restrições em outras áreas, como planejar a coleta de impostos sobre as transações financeiras para estabilizar a volatilidade do mercado de capital e evitar riscos financeiros.

Em resumo, o investimento de capital chinês inundando o mundo, que supostamente incentivaria a economia chinesa, não está tendo um resultado tão bom quanto o apontado pela mídia ocidental. Há ressentimento e frustração se acumulando por trás da estratégia de Pequim de “ir ao estrangeiro”.

He Qinglian é uma proeminente autora e economista chinesa. Ela vive atualmente nos Estados Unidos e é autora do livro “The Fog of Censorship: Media Control in China” entre outros. Ela escreve regularmente sobre questões sociais e econômicas da China contemporânea.