Novas evidências surgiram da extração forçada de órgãos que ainda ocorre na China, desta vez de um documentário de televisão sul-coreano, apesar do pronunciamento oficial chinês de que esses abusos terminaram.
Um programa chamado “Reportagem Investigativa 7”, transmitido na TV Chosun, uma rede de cabo pertencente a um dos maiores jornais da Coreia do Sul, o Chosun Ilbo, fez uma investigação incógnita sobre o fenômeno de turistas médicos sul-coreanos viajando para a China para cirurgias de transplante de órgãos. O segmento foi exibido na Coreia do Sul em 15 de novembro.
A equipe do programa viajou para um hospital na cidade de Tianjin, no Nordeste da China, sob o pretexto de que eles estavam fazendo consulta sobre uma cirurgia para um paciente sul-coreano com doença renal que necessitava de transplante.
O repórter, com uma câmera secreta, filmou suas interações com a equipe do hospital, que o informou que um órgão de correspondência pode ser encontrado em poucas semanas. Se a família do paciente estiver disposta a doar dinheiro adicional para a instituição de caridade do hospital, o período de espera pode ser acelerado e o paciente pode receber um órgão correspondente mais cedo, disse uma enfermeira ao repórter. O documentário não especificou precisamente quando os incidentes ocorreram, embora pareça ter sido no início de 2017.
Leia também:
• Mais de 2,6 milhões assinam petição apoiando processo legal contra ex-líder chinês Jiang Zemin
• Regime chinês assassinou cerca de 1,5 milhão para extração de órgãos, aponta relatório
De onde poderiam vir os órgãos, que parecem estar prontamente disponíveis sob demanda?
Com base em reportagem extensa e premiada do Epoch Times no passado, uma das principais fontes de órgãos seriam os prisioneiros de consciência que são mantidos nas prisões da China por sua fé. Isso inclui principalmente os praticantes do Falun Gong, uma prática espiritual que o regime chinês proibiu e persegue severamente desde 1999. Os órgãos provavelmente são extraídos à força de seus corpos, causando sua morte no processo.
Outros grupos-alvo para a extração forçada de órgãos incluem os muçulmanos uigures, que foram submetidos a testes de sangue generalizados e cadastramento de DNA, bem como indivíduos que são simplesmente sequestrados nas ruas da China.
O regime chinês afirmou consistentemente que os órgãos provêm de prisioneiros executados. Mas o número crescente de transplantes de órgãos realizados excede o número de execuções que inclusive diminuiu significativamente nos últimos anos. A explicação oficial está longe de ser suficiente para esclarecer o nível de atividade de transplante observável, especialmente considerando que o sistema de doação voluntária de órgãos do país é mínimo. De acordo com as crenças tradicionais chinesas, perturbar o cadáver de uma pessoa após a morte é um tabu.
O documentário também observa essas discrepâncias, citando relatórios anteriores de pesquisadores independentes, e chega às mesmas conclusões sobre a probabilidade de existir um banco de órgãos de prisioneiros que seriam mortos por demanda para cirurgias de transplante.
Mas o programa apresenta evidência rara e concreta, diretamente da equipe hospitalar chinesa e dos médicos sul-coreanos, que a extração forçada de órgãos prossegue inalterada ainda hoje, alimentada em parte por estrangeiros desesperados para prolongarem suas vidas com cirurgias de transplante.
As autoridades chinesas prometeram que o uso de prisioneiros como fonte de órgãos cessaria a partir de janeiro de 2015. Essas promessas e alegações subsequentes de reforma levaram a um endosso marcante do sistema de transplante da China pela Organização Mundial da Saúde e pela Sociedade de Transplante. O relatório de investigação sul-coreano parece desacreditar as alegações chinesas.
Relatos hospitalares
O documentário estima que, desde 2000, cerca de dois mil sul-coreanos vão à China para cirurgia de transplante a cada ano, um número significativamente maior do que os dados de um estudo recentemente publicado na revista médica “Transplantation“, realizado com centros de transplante sul-coreanos que acompanharam seus pacientes que fizeram uma cirurgia na China. O documentário não explica como obteve a estimativa, embora pareça ser uma extrapolação baseada em dados investigativos reunidos por repórteres.
A equipe visitou um hospital em Tianjin conhecido por ser popular entre os turistas médicos sul-coreanos, mas não o identificou pelo nome. Com base nas imagens filmadas do hospital e sua descrição, ele coincide com o 1º Hospital Central de Tianjin que o Epoch Times relatou anteriormente. O hospital possui um edifício inteiro de vários andares dedicado ao transplante de órgãos, que em certo período tinha uma capacidade de 500 leitos.
Leia também:
• Como os médicos na China se tornaram assassinos (Vídeo)
• O Partido e a profissão: abuso de transplante de órgãos na China
Ao chegar ao hospital, o repórter incógnito foi saudado por uma enfermeira falando coreano que o conduziu ao redor para conhecer a ala. Uma paciente sul-coreana que tinha acabado de passar por uma cirurgia de transplante comentou ao repórter que esperou dois meses por um órgão correspondente. O filho da paciente disse ao repórter que demorou cerca de duas horas a partir do momento da remoção de órgão até sua chegada ao hospital. Ele também disse que o hospital cobrava preços diferentes para grupos diferentes.
O repórter perguntou quantas cirurgias de transplante o hospital geralmente executa. A enfermeira respondeu que no dia anterior houve três cirurgias de rim e quatro de fígado. Se este fosse o volume diário médio de transplante no hospital, ele realizaria cerca de 2.500 transplantes por ano. Porém, não está claro qual é a média diária real de transplantes no hospital.
Depois que a enfermeira e um médico de transplante analisaram os registros médicos do suposto paciente sul-coreano e confirmaram que o paciente era adequado para cirurgia, o repórter perguntou por quanto tempo o paciente teria que esperar até a cirurgia. A enfermeira respondeu que isso depende, mas alguns pacientes esperam apenas uma semana, duas semanas ou 50 dias. Ela então acrescentou que se alguém desejasse acelerar o processo e ser priorizado para um órgão, poderia doar dinheiro para a instituição de caridade do hospital, obviamente além da taxa da cirurgia. Quando perguntado quanto deveria ser doado, ela respondeu 10 mil yuanes (aproximadamente US$ 1.500).
Numa troca de dar arrepios, o repórter perguntou se o suposto paciente poderia receber o órgão de um jovem. A enfermeira disse que o hospital escolhe apenas órgãos de jovens.
A enfermeira também mostrou ao repórter uma ala especialmente para estrangeiros, revelando que um quarto espaçoso e bem mobilado pertencia a um paciente do Oriente Médio cuja taxa da cirurgia era “paga pelo consulado”.
Ela também informou o repórter que muitos parentes de pacientes ficam num hotel próximo pertencente ao hospital, um prédio de 16 andares.
A equipe do programa também visitou o hotel e falou com um casal sul-coreano, um dos quais era um paciente de transplante que havia recentemente completado a cirurgia. O casal disse que um andar era apenas para pacientes sul-coreanos e seus parentes. O casal tinha um visto de três meses.
Alegações de experimentos com seres humanos
O programa também examinou os relatos de que o desgraçado ex-chefe da polícia de Chongqing, Wang Lijun, supervisionou experiências humanas mórbidas para pesquisar métodos de transplante de órgãos que melhor preservariam a condição dos órgãos, o que foi primeiramente documentado pelo grupo sem fins lucrativos Organização Mundial para Investigar a Persecução ao Falun Gong (WOIPFG).
A equipe do documentário foi ao hospital e laboratório de pesquisa de Chongqing, outrora supervisionado por Wang Lijun, e encontrou projetos pendurados na parede para uma máquina que causaria lesões no tronco cerebral para induzir morte cerebral, similar a um dispositivo patenteado sob o nome de Wang Lijun e descoberto pela WOIPFG. As patentes da máquina de Wang Lijun estão disponíveis online, identificada como uma “máquina principal para causar lesões no tronco cerebral“.
Quando o repórter perguntou sobre o propósito da máquina, a equipe do laboratório confirmou que a máquina poderia ser usada num ser humano para induzir-lhe morte cerebral, conservando os outros órgãos no corpo saudáveis.
Cumplicidade dos médicos na Coreia do Sul
Pacientes sul-coreanos são encaminhados aos hospitais chineses por médicos em seu país nativo. A equipe do programa visitou um hospital em Seul, onde um médico admitiu ter recomendado a seus pacientes no passado que visitassem o hospital de Tianjin, embora ele não faça mais isso. Quando perguntado sobre as preocupações com a fonte dos órgãos, o médico se recusou a comentar.
Em outro hospital não identificado, um médico disse que sabia que os órgãos na China eram de “prisioneiros perseguidos por sua fé”. O dilema ético levou-o a parar de recomendar pacientes para irem à China. Quando perguntado se ele se arrependeu de suas decisões anteriores, ele disse que não, pois o paciente precisava da cirurgia de transplante para viver.
Um pedido de resposta da Sociedade de Transplante da Coreia não foi respondido a tempo da publicação da matéria.
Preocupações para a Coreia do Sul
No ano passado, uma fonte anônima que se identificou como um ex-funcionário no 1º Hospital Central de Tianjin escreveu no Epoch Times sobre sua experiência.
“Muitos dos pacientes de transplante estrangeiros vieram à China procurando um fígado ou um rim. A maior parte desses estrangeiros eram sul-coreanos”, diz o relato. A fonte também explicou como os pacientes foram encaminhados para o hospital. “Um conhecido médico sul-coreano de um dos maiores hospitais da Coreia do Sul apresentaria seus pacientes a um intermediário. Este intermediário então encaminharia esses pacientes para o hospital de Tianjin.”
Em 2015, David Matas, um dos pesquisadores independentes mais proeminentes que documentou a evidência de extração forçada de órgãos na China, suscitou preocupações quanto à falta de transparência em relação à origem dos órgãos na China, numa conferência da indústria médica realizada em Seul, Coreia do Sul.
Em julho passado, várias organizações internacionais de saúde assinaram uma carta pela “reforma das doações e transplantes de órgãos” na China, incluindo a Organização Mundial da Saúde (OMS), a Pontifícia Academia de Ciências do Vaticano (PAS) e a Sociedade de Transplante (TTS), informou o jornal estatal chinês Global Times.
Perguntado sobre se a PAS mudará sua posição em relação ao sistema da China à luz do documentário, o Dr. Francis Delmonico, especialista em transplantes e acadêmico da PAS, não abordou diretamente a evidência no documentário sul-coreano sobre a continuação dos abusos, em vez disso ele respondeu: “A postura do PAS é apoiar a reforma na China que é consistente com a Declaração da PAS, e assinada por colegas chineses na Cimeira da PAS.”