Desafiando a censura chinesa na era das redes sociais

27/09/2017 21:30 Atualizado: 27/09/2017 21:30

Há quase 20 anos, as manchetes dos jornais perguntavam se a Internet iria libertar a China. O teste aconteceu com Li Hongkuan, um ativista pela democracia muito confiante em si mesmo e de fala rápida, que utilizou o primeiro provedor de correio eletrônico dissidente chinês, enviando notícias sem censura a centenas de milhares de endereços.

Agora, Li está de volta com isso, mas já não utiliza o e-mail. Na era das redes sociais, ele diz que existe uma ferramenta muito mais poderosa para minar o regime do Partido Comunista Chinês: o WeChat.

Chamado de “Weixin” em chinês, o WeChat conta com 700 milhões de usuários ativos em nível nacional, o que faz dele a plataforma de redes sociais mais popular do país. Na China, onde Facebook, Instagram e Twitter estão bloqueados, o WeChat preenche essa lacuna em um pacote conveniente. Também pode ser usado para pagar itens em livrarias, chamar o táxi, enviar dinheiro para amigos, pagar contas em restaurantes, ler notícias e reservar uma sala de karaokê.

Ele tem outra diferença fundamental em relação a outras aplicações de redes sociais: suas comunicações são consideradas “privadas”. Ou seja, em vez de espalhar as ideias para um lugar público, como o Twitter, as comunicações no WeChat são limitadas àqueles que são amigos no aplicativo. O próprio experimento da China com uma plataforma semelhante ao Twitter, o Sina Weibo, levou ao notório castigo da repressão nos últimos anos, forçando a dissidência a se tornar clandestina.

A natureza privada do WeChat constitui ao mesmo tempo uma ajuda e um obstáculo para alguém como Li. Ele vive nos Estados Unidos há décadas, mas ainda é movido pela vontade de despertar um anseio de democracia entre seus compatriotas.

Sua privacidade significa mais liberdade: ideias a favor da democracia, discursos contra o Partido e questões sociais sensíveis podem ser ventiladas. Ao instalar recentemente o aplicativo, uma das primeiras mensagens recebidas por um jornalista foi de um praticante de Falun Gong, uma disciplina espiritual tradicional chinesa que tem sido perseguida desde 1999. Parece que, enquanto os outros usuários não informarem o remetente, muitas coisas podem ser comunicadas.

A desvantagem para Li é o alcance muito mais limitado, a fragmentação de potenciais comunidades on-line. Os grupos de discussão do WeChat não podem ter mais do que 500 pessoas.

Li Hongkuan mostra uma lista de salas de bate-papo existentes na rede social chinesa WeChat, em Flushing, Nova York, em 4 de outubro (Matthew Robertson/Epoch Times)
Li Hongkuan mostra uma lista de salas de bate-papo existentes na rede social chinesa WeChat, em Flushing, Nova York, em 4 de outubro (Matthew Robertson/Epoch Times)

No entanto, Li está bastante feliz operando dentro dessa estrutura. Sentado em uma cadeira do hotel Sheraton, no denso bairro chinês de Flushing, no Queens, Li fez uma demonstração de como ele usa o aplicativo para desafiar os que estão na China para que olhem com outros olhos o Regime Chinês.

“Como terminal o insano sistema de roubo de terras?” Ele é dono de uma das publicações que compartilha. Outra manchete instrui os cidadãos chineses a mudarem o nome de seu WiFi em casa para “liberdade e democracia, ou outras palavras que transmitam valores universais”. Os vizinhos do mesmo prédio de apartamentos veriam as mensagens em sua rede Wi-Fi como “oponham-se à perseguição totalitária, oponham-se à ditadura violenta” ou “Os valores universais são o futuro da China”.

Mensagens com temas semelhantes continuam em uma onda infinita.

“Você espalha a verdade e eles pouco a pouco passarão a reconhecê-la”, disse Li. “No começo, podem interpretar mal, mas trocando idéias entre si, ajudam a que novas ideias se produzam”.

Ele faz uso da propaganda oficial como “o sonho chinês” para se referir ao “sonho americano”, e como os dois poderiam ter uma semelhança maior. Ele também reproduz eventos de imprensa para destacar o caráter insustentável do regime do Partido.

Sua ideia central é semear e passar ideias subversivas e, em seguida, confiar que os participantes das salas de bate-papo as retransmitam a um público cada vez maior, a fim de divulgar a dissidência. Mas, se houver um interesse generalizado nisso, também é a questão central.

“Enquanto as pessoas não denunciam o que você diz, não importa. Ninguém relata mais dessas coisas”, disse Li. Mas, claro, a ideia geral é complicada. A maioria fica feliz apenas por usar o WeChat para conversar com amigos e reservar salas de karaoke; outros temem a vigilância.”

Michael Zhang, um trabalhador simpático às ideias pró-democracia que recentemente imigrou da China para os Estados Unidos, foi um espectador da nossa conversa no Sheraton e foi perguntado a ele o que ele pensa de tudo isso.

“Eu não uso o WeChat”, disse ele. “É monitorado. O regime comunista machucaria minha família!”

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