Democracias começam a reagir à infiltração e subversão do regime chinês

08/01/2018 18:16 Atualizado: 08/01/2018 19:51

A tentativa de décadas do regime chinês de influenciar a política de outras nações pode ter encontrado um obstáculo significante em 2017. Desde a Austrália até os Estados Unidos, alguns países começaram a despertar para a dolorosa percepção de que as portas que voluntariamente abriram para a China visando o intercâmbio comercial e cultural permitiram também a invasão do regime chinês às suas instituições políticas e modo de vida.

A preocupação com a influência ilegítima do regime chinês veio à tona recentemente na Austrália, o país que faz parte da rede de alianças dos EUA e que é talvez o maior dependente da China. A China é o maior parceiro comercial da Austrália, tanto em termos de importação como exportação. Pelo menos 8% dos australianos são de etnia chinesa e mais de 200 mil estudantes chineses estariam estudando na Austrália a qualquer momento.

Em 2017, a mídia australiana publicou uma série de reportagens investigativas de alto perfil e relatos sobre o controle e a influência do Partido Comunista Chinês sobre as instituições políticas, empresas e academia da Austrália, bem como os estudantes chineses que estudam no país. As reportagens mudaram as conversas na Austrália sobre as relações com a China.

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O rosto da subversão da política australiana pode ser exemplificado por Sam Dastyari, um ex-senador que representava a região de Nova Gales do Sul. Ele renunciou em 12 de dezembro, depois que detalhes surgiram sobre as doações que ele recebeu de empresas de propriedade do bilionário chinês Huang Xiangmo.

Huang, até recentemente, era chefe do Conselho Australiano para a Promoção da Reunificação Pacífica da China, com sede em Sydney, que tem vínculos com o Departamento de Trabalhos da Vanguarda Unida, um aparato fundamental do regime chinês para promover sua agenda de subversão e controle tanto internamente na China como no estrangeiro.

Os críticos acusaram que, em troca de dinheiro, Dastyari assumiu posições pró-China, inclusive aceitando e reconhecendo as reivindicações do regime sobre o Mar do Sul da China, que é compartilhado e disputado por várias nações.

Entre esses críticos está o primeiro-ministro australiano Malcolm Turnbull, que disse: “Sam Dastyari é um caso muito claro de alguém que literalmente aceitou dinheiro de pessoas intimamente associadas ao governo chinês e, em troca disso, fez declarações de políticas essencialmente chinesas.”

China, infiltração, subversão, Partido Comunista Chinês - Sam Dastyari, ex-senador do Partido Trabalhista Australiano, desculpa-se publicamente em Sydney, Austrália, em 6 de setembro de 2016, depois que surgiram detalhes sobre seus vínculos com o regime chinês (William West/AFP/Getty Images)
Sam Dastyari, ex-senador do Partido Trabalhista Australiano, desculpa-se publicamente em Sydney, Austrália, em 6 de setembro de 2016, depois que surgiram detalhes sobre seus vínculos com o regime chinês (William West/AFP/Getty Images)

O problema para a Austrália é que Dastyari não está sozinho em aceitar dinheiro do regime chinês. A Australian Broadcasting Company indicou 13 pagamentos entre novembro de 2014 e junho de 2016 feitos pelas empresas de Huang a políticos australianos.

Em 7 de dezembro, Turnbull introduziu um conjunto de leis destinadas a combater a influência estrangeira na política australiana.

O regime chinês respondeu severamente às críticas de Turnbull sobre sua interferência na política da Austrália, o que levou Turnbull a afirmar a soberania da Austrália, respondendo: “E assim dizemos; ‘Australianos, levantem-se!’”

Reação

A penetração do regime chinês também provocou sinais de alarme na vizinhança da Austrália, a Nova Zelândia, cujo serviço de inteligência emitiu um alerta em dezembro de que a crescente influência política de Pequim no país representa uma ameaça à segurança nacional.

Um país após o outro, reações similares começaram contra a influência do regime chinês. A Alemanha tradicionalmente manteve-se calada sobre a influência do regime chinês, mas a agência de inteligência do país relatou recentemente que a China está tentando se infiltrar nas instituições políticas e empresas alemãs usando perfis falsos de redes sociais.

Nos Estados Unidos durante o ano passado, os meios de comunicação e o estabelecimento político mostraram preocupação com a suposta interferência russa nas eleições presidenciais de 2016. No entanto, a preocupação com a influência da China nos Estados Unidos está crescendo.

As operações de influência da China no exterior, particularmente nos Estados Unidos, foram amplamente cobertas pelo Epoch Times em reportagens anteriores.

Modo de operação da China

Entre aqueles que chamam a atenção para a ameaça representada pelo regime chinês está o analista Gordon Chang, um especialista em China e no Leste da Ásia. Ele disse que os chineses podem se mover pacientemente para subverter outros países porque acreditam que “o tempo está do seu lado”.

O pensamento estratégico chinês, tanto historicamente como nos dias atuais, foi moldado fundamentalmente pelos ensinamentos do antigo estrategista chinês Sun Tzu, cuja estratégia preferida de ganhar uma guerra era subjugar o inimigo sem realmente lutar em batalhas onerosas contra ele.

A estratégia, muitas vezes descrita como “guerra política”, coloca uma grande vantagem na exploração de qualquer política ou ferramenta fora da definição tradicional de poder militar “rígido” para atingir os objetivos políticos, econômicos e diplomáticos desejados.

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Essa exploração oportunista pode ocorrer por meios políticos, sociais, comerciais, econômicos, legais, psicológicos, culturais e outros, de acordo com Michael Tsai, ex-ministro da defesa de Taiwan. Tsai comparou a experiência de Taiwan com a dos Estados Unidos e disse que ambos os países têm sido os principais alvos das operações de guerra política da China há décadas.

Uma parte crítica da guerra política da China é a estratégia da frente ou vanguarda unida, que envolve o comprometimento de indivíduos e instituições críticas que estão fora do alcance direto do regime chinês. Ao enganar esses elementos estrangeiros, ou explorar suas fraquezas, o regime chinês manipula-os para servirem seus comandos, frequentemente agindo contra seu próprio interesse ou o interesse de seus países de origem.

Controle da mídia

“As tentativas do governo chinês de orientar, comprar ou coagir a influência política e controlar a discussão de tópicos ‘sensíveis’ são amplas e representam sérios desafios nos Estados Unidos e para nossos aliados com ideias afins”, disse o senador Marco Rubio (R-Fla ), numa audiência de 13 de dezembro da Comissão Executiva do Congresso sobre a China (CECC), intitulada “O braço longo da China: exportando o autoritarismo com características chinesas”.

Controlar a opinião pública é um dos principais objetivos da Vanguarda Unida da China, disse Glenn Tiffert, um estudioso visitante da Instituição Hoover que testemunhou na audiência da CECC. Tiffert disse que as fontes chinesas internas descrevem regularmente a opinião pública como um “campo de batalha” onde a luta política deve ser travada e conquistada.

De acordo com Tiffert, a China não busca controlar a opinião pública simplesmente por meio da conquista dos corações e das mentes dos americanos, ela também exerce pressão nos bolsos dos americanos em suas operações de influência. Na maioria das vezes, a China reconhece que pode subjugar muitas pessoas e organizações americanas simplesmente exercendo pressão econômica e compelindo-as a apoiar a agenda de Pequim.

O recurso do mercado chinês é usado para convencer as empresas americanas a abandonarem seus princípios. Na audiência da CECC, Shanthi Kalathil, do National Endowment for Democracy, apontou o exemplo da Apple, que recentemente sucumbiu à pressão do regime chinês e removeu os aplicativos da sua loja chinesa de aplicativos que ajudam os usuários chineses a contornarem o “Grande Firewall”, o sistema do regime que supervisiona e censura a internet.

China, infiltração, subversão, Partido Comunista Chinês - Julie Bishop, a ministra australiana das relações exteriores, fala com seu homólogo chinês Wang Yi, em Pequim, em 17 de fevereiro de 2016 (Fred Dufour/AFP/Getty Images)
Julie Bishop, a ministra australiana das relações exteriores, fala com seu homólogo chinês Wang Yi, em Pequim, em 17 de fevereiro de 2016 (Fred Dufour/AFP/Getty Images)

Rubio apontou os exemplos de websites de redes sociais, como LinkedIn e Facebook, os quais concordaram em censurar seu conteúdo para ter acesso ao mercado chinês.

Em outro caso, o medo de um processo judicial do regime chinês levou a editora australiana Allen & Unwin a adiar a publicação de um livro que, ironicamente, detalha a campanha de influência do regime chinês na Austrália.

Springer Nature é descrita pelo Publisher’s Weekly como o maior editor de livros acadêmicos do mundo. Springer removeu mais de mil artigos sensíveis de seus periódicos sobre temas que o regime chinês julgaria “sensíveis”. Springer provavelmente o fez não só para cumprir as diretrizes de censura da China e, portanto, garantir seu acesso ao mercado na China, mas também para cortejar o gigante chinês de tecnologia Tencent, com o qual recentemente fez parceria.

Numa entrevista anterior, a professora Lynette Ong, uma especialista em China e Ásia da Universidade de Toronto, disse ao Epoch Times: “A parceria entre uma grande empresa de mídia chinesa e a Springer provavelmente significará que a Springer Nature não terá dúvidas em censurar seu conteúdo dentro ou fora da China por razões comerciais ou políticas.”

Como resultado, as publicações acadêmicas ocidentais confiáveis podem agora apresentar mensagens aprovadas por Pequim, sem que os leitores tenham conhecimento.

Controle de acadêmicos e estudantes

Painéis do Congresso dos EUA, como o CECC, sugeriram repetidamente investigar a crescente rede de Institutos Confúcio da China em universidades americanas, uma presença que o representante estadunidense Chris Smith (R-N.J.) descreveu como sendo essencialmente um “malware acadêmico” nos Estados Unidos.

Os Institutos Confúcio fornecem instrução em língua e cultura chinesas em faculdades e universidades fora da China. Eles são financiados por Pequim, o qual controla a contratação dos funcionários.

De acordo com Shanthi Kalathil em seu testemunho perante a CECC, os Institutos Confúcio são conhecidos por “desconsiderarem os princípios fundamentais da liberdade acadêmica” e por sua “capacidade de atuar como um braço do Estado chinês dentro dos campi acadêmicos”. Os institutos servem naturalmente como ferramentas principais para divulgar a propaganda do regime chinês nos Estados Unidos e em outros países.

A China também esteve discretamente envolvida no financiamento de alguns dos institutos de reflexão (think tanks) e escolas de pós-graduação de elite na América. Um artigo de novembro na Foreign Policy informou que a Faculdade de Estudos Internacionais Avançados da Universidade Johns Hopkins, uma das principais instituições de relações internacionais do país, recebeu financiamento para uma professora com bolsa e um projeto de pesquisa da Fundação de Intercâmbio China-Estados Unidos (CUSEF), uma organização registrada como agente estrangeiro da China.

Um bilionário chinês vinculado aos militares do regime doou US$ 10 milhões para a Faculdade de Governo Kennedy da Universidade de Harvard, de acordo com uma reportagem do Wall Street Journal.

Controle pela coerção

Quando a China não alcança seus objetivos por meio da decepção ou suborno, ela recorre à coerção para fazer o trabalho. Tiffert disse que é amplamente reconhecido que o governo chinês cultiva informantes entre seus cidadãos que estudam no exterior e que os estudantes chineses na América estão dolorosamente conscientes das consequências que eles ou suas famílias podem sofrer se esses agentes do regime informarem sobre eles.

Por exemplo, em 2008, uma estudante chinesa da Universidade Duke foi vilipendiada na China e sua família ameaçada depois de tentar mediar a relação entre a relação entre grupos pró-Tibet e pró-China no campus.

Em 2017, uma graduanda da China na Universidade de Maryland foi coagida a desculpar-se publicamente após o seu comentário inicial em seu discurso de graduação, quando ela elogiou a vida nos Estados Unidos, se tornou viral na China. Ela foi acusada de ser uma “traidora” pela mídia estatal chinesa.

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O regime chinês também amplia sua coerção àqueles nos Estados Unidos que identifica como obstáculos à sua guerra política. Por exemplo, o regime visa os praticantes da disciplina espiritual do Falun Gong, um grupo que tem sido perseguido brutalmente na China, mas que tem demonstrado determinação em expor os crimes do regime chinês, disse Levi Browde, diretor-executivo do Centro de Informação do Falun Dafa.

Browde disse que ao longo dos anos, houve casos documentados em que o regime chinês empregou bandidos para intimidarem fisicamente e assaltarem os praticantes do Falun Gong nos Estados Unidos. Os diplomatas chineses também usaram meios econômicos e políticos para tentar forçar os funcionários e instituições dos Estados Unidos a não se envolverem com o Falun Gong, ou falarem ou agirem em defesa do Falun Gong. As autoridades federais, estaduais e locais várias vezes publicaram as tentativas torpes do regime de coagi-las.

Chamado crescente por coalizão liderada pelos EUA

Em última análise, a objeção aos esforços do regime chinês para influenciar outros países é uma resposta à natureza do próprio regime. O Partido Comunista Chinês cometeu crimes contra a humanidade desde que assumiu o poder na China e, nas últimas décadas, cometeu esses crimes na perseguição ao Falun Gong e a minorias étnicas e religiosas na China. O regime comunista nega a seu povo a democracia e o estado de direito, ao mesmo tempo que suprime os ativistas da democracia e reforça a vigilância e a censura dentro da China a dimensões paranoicas. No cenário mundial, o regime engana no comércio internacional e rouba a propriedade intelectual de outras nações amplamente, e falha em cumprir os acordos internacionais que assinou.

À medida que o regime chinês tenta expandir sua esfera de influência, as democracias do mundo veem que seus próprios princípios e formas de vida estão sob ataque.

A declaração desafiadora de Turnbull em 9 de dezembro de que o povo australiano enfrentará o desafio da China foi ecoada pelos membros do Congresso dos EUA.

Os presidentes da CECC, Rubio e Smith, emitiram declarações apoiando a posição australiana e pedindo que o governo dos Estados Unidos tome medidas mais assertivas para enfrentar as ameaças impostas pela China, embora ainda não esteja claro que medidas a gestão Trump pode tomar a este respeito.

“Aliados de longa data [dos EUA], a Austrália, a Nova Zelândia e o Canadá foram abalados por escândalos envolvendo operações de influência patrocinadas pelos chineses visando políticos, empresas e instituições acadêmicas”, disse Smith. “Todos os aliados democráticos com ideias afins devem apoiar seus esforços para erradicar esses elementos destinados a corromper ou cooptar as instituições políticas e acadêmicas australianas.”

Num artigo de opinião recente, Rubio também pediu uma aliança americana mais forte com a Austrália, o Japão e a Índia. Uma aliança das quatro democracias “semelhantes”, conhecida como Diálogo Quadrilateral de Segurança (ou “Quad”), foi proposta pelo primeiro-ministro japonês Shinzo Abe em 2007, mas foi ignorada após protestos da China.

O ressurgimento da ideia, uma década após a insistência veemente da China de que o regime comunista não representa ameaça para as quatro democracias, foi ironicamente impulsionado, pelo menos em parte, por uma revolta comum contra a própria influência política do regime.

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