Cortes de impostos e maiores tarifas nos EUA ameaçam moeda da China

01/01/2018 23:18 Atualizado: 01/01/2018 23:18

Sete foi a linha limite. Mas o yuan ou renminbi, a moeda chinesa, nunca cruzou essa linha em relação ao dólar dos EUA. Ela só chegou a 6,96 yuanes por dólar em 16 de dezembro de 2016, antes de começar uma queda impressionante até 6,5 no meio deste ano.

2016 foi um ano ruim para a economia chinesa. O crescimento foi lento e o mundo estava preocupado que a China finalmente aterrissaria da forma mais difícil, como muitos têm previsto há anos. E mais do que o crescimento do PIB ou qualquer outra métrica, a moeda chinesa era o barômetro de se a China poderia manter as coisas estáveis (a estabilidade é o mantra do regime comunista) ou sofreria uma crise de deflação da dívida.

Se a moeda chinesa declinasse de valor, isso significaria que os cidadãos e as empresas estavam movendo seu dinheiro para fora do país em grande quantidade porque já não acreditavam no sonho chinês.

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Outra medida do quão ruim as coisas iam na segunda maior economia do mundo era as saídas ou fuga de capital. De acordo com o Instituto de Finanças Internacionais (IIF), um recorde de US$ 725 bilhões deixou a China em 2016, pressionando a moeda e o mercado interbancário chinês.

Tentando deter a maré, o banco central vendeu volumes recordes de moeda estrangeira. As reservas cambiais chinesas, US$ 4 trilhões no seu apogeu em 2014, caíram para US$ 3 trilhões, e os analistas começaram a questionar se isso era suficiente para financiar a maior economia comercial do mundo.

Então, milagrosamente a tempo para o 19º Congresso Nacional de 2017 do Partido Comunista Chinês, tudo isso parou. O yuan nunca ultrapassou o limite de 7, as reservas de câmbio nunca caíram abaixo de 3 bi, e a fuga de capital diminuiu graças a regulamentos draconianos, tornando mais difícil para indivíduos e empresas transferirem dinheiro para fora do país.

Dólar fraco

Mas algo mais ajudou a China a fortalecer sua moeda para reduzir as saídas de capital e equilibrar suas reservas cambiais: um dólar fraco.

O dólar não recuou apenas em relação ao yuan. Ele declinou contra praticamente todos os seus principais parceiros comerciais em 2017, caindo 12% em relação ao seu pico de 2 de janeiro até seu patamar de 4 de setembro.

Um dólar fraco pressiona o yuan e torna menos desejável que os chineses invistam em ativos dos EUA se eles podem perder dinheiro com o câmbio. Um dólar fraco faz as participações chinesas em outras moedas estrangeiras valerem mais a pena.

Mas o dólar fraco deve reverter seu curso em 2018 e, para a China, isso significa o retorno das incertezas de 2016.

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As moedas movem-se por uma infinidade de razões, mas a queda deste ano no dólar teve três pilares principais. O primeiro era político.

Depois que o dólar aumentou 8% na sequência da eleição do presidente Donald Trump em novembro passado, ele caiu quando ficou claro que Trump não conseguiria aprovar rapidamente sua agenda “América primeiro”, que incluía cortes de impostos e endurecer as regras de comércio com a China e o México.

O segundo pilar era a política de juros do Federal Reserve, o banco central dos EUA. O Fed estava atrasado em seu calendário de aumento das taxas programado para 2016 e 2017, o que decepcionou as expectativas do mercado que esperava por taxas de juros mais altas e maior rendimento para o dólar americano.

O terceiro pilar era a economia. Em relação às expectativas, os Estados Unidos apresentaram desempenho inferior aos mercados emergentes, incluindo a China e até a Europa e o Japão no primeiro semestre do ano.

Dólar forte

Todos esses fatores mudaram em favor do dólar no último trimestre, e será difícil para a China competir.

Trump conseguiu cumprir as promessas-chave de sua campanha na última etapa de 2017. Sua lei de reforma fiscal é uma benção para as corporações nacionais e internacionais, tornando mais competitivo investir nos Estados Unidos novamente. A lei também incentiva as empresas a retornarem ao país trilhões em dinheiro offshore. Embora este dinheiro provavelmente não venha da China, ele fortalecerá o dólar e punirá indiretamente o yuan.

A China, por outro lado, tornou-se cada vez menos competitiva em termos de impostos (seu imposto corporativo é de 45%), bem como de salários ou de mão de obra mais baratos. Sua principal vantagem hoje em dia é em escala [de produção industrial]. De acordo com uma reportagem do Wall Street Journal, a China já está preparando um plano de contingência para combater as reformas de Trump, aumentando as taxas de juros, apertando os controles de capital e microgerenciando a moeda, intervindo nos mercados de câmbio.

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Os impostos mais baixos para empresas e indivíduos nos Estados Unidos também devem impulsionar uma economia já muito melhorada e, portanto, tornar novamente os ativos dos EUA, como ações e imóveis, mais atraentes para os investidores e compradores estrangeiros.

Mas os Estados Unidos também estão ameaçando a China no comércio, cujo superávit comercial de US$ 309 bilhões em 2017 oferece um apoio substancial ao yuan.

No final de novembro, os Estados Unidos entraram num processo legal na Organização Mundial do Comércio (OMC) como o terceiro partido num caso que a China iniciou contra a União Europeia (UE) também em novembro. A China reclama que, apesar de algumas disposições da OMC, a UE não lhe concedeu status de “economia de mercado” 15 anos após a China aderir a OMC. Os Estados Unidos rejeitam os argumentos da China e ficaram do lado da UE.

Em 18 de dezembro, Trump acusou a China de desafiar o poder americano e roubar sua propriedade intelectual ao revelar sua Estratégia de Segurança Nacional. “Os Estados Unidos não tolerarão mais a agressão econômica ou práticas comerciais injustas”, diz o documento, sem mencionar a China pelo nome.

Se a gestão Trump seguir adiante com suas afirmações e usar a investigação sobre o roubo da propriedade intelectual pela China nos termos da Seção 301 da Lei de Comércio de 1974 para impor sanções à China, um superávit comercial menor prejudicará as exportações chinesas e a moeda ao mesmo tempo. Embora uma guerra comercial seja dispendiosa para ambos os lados, a China tem mais a perder aqui.

Independentemente da política, o Federal Reserve também está começando a aumentar suas taxas de juros, tornando o dólar mais atraente nos mercados internacionais. Em 13 de dezembro, o banco central elevou sua taxa de referência de 0,25% para 1,50% em sua reunião do último mês de 2017.

Os chineses prontamente responderam à medida, com o Banco Popular da China aumentando sua taxa de referência de 0,05% para 3,25%. Mas a empresa de pesquisa Capital Economics acredita que isso não conseguirá mudar o jogo e que as condições financeiras na China ainda são relativamente instáveis.

“Apesar disso, não estamos convencidos da narrativa das políticas de controle [da China]. Um movimento de cinco pontos base nas taxas é muito pequeno para ter um impacto significativo”, escreveu a empresa numa nota aos clientes.

No entanto, se a China não cumprir seu cronograma de reforma mais cedo do que o previsto, ela viverá 2016 novamente.