De tempos em tempos, um vídeo online surge e se populariza na internet chinesa, geralmente com dois lados conflitantes: aldeões que se recusam a deixar suas casas, enfrentando policiais com bastões e equipes de demolição de moradias. Esses vídeos são frequentemente violentos, às vezes com os moradores sendo espancados, e até mortos. Um funcionário de habitação recentemente recebeu uma longa sentença por corrupção, fornecendo um vislumbre do porquê essa violência acontece com tanta frequência na China.
Ma Weirong, ex-chefe de seção da divisão de gerenciamento da indústria de construção civil no departamento de desenvolvimento imobiliário da cidade de Hangzhou, na província de Zhejiang, foi condenado a 20 anos de prisão pelo Tribunal Popular Intermediário de Hangzhou, por crimes de desfalque, suborno e abuso de poder, informou o site de notícias chinês Zhejiang Online em 21 de novembro.
O veredito veio depois que Ma Weirong tentou apelar sua sentença inicial (que era 20 anos de prisão) proferida por um tribunal de instância inferior no distrito de Gongshu, em Hangzhou. Esse tribunal considerou Ma culpado de lucrar ilegalmente com 19 unidades de habitação do governo.
Ma Weirong teve um longo mandato no aparato habitacional das autoridades locais, desde 1989.
No final da década de 1990, quando dirigia a divisão de gerenciamento de certificados do departamento de gestão de moradias do distrito de Gongshu, Ma Weirong aproveitou as brechas na administração desordenada das habitações do governo em Gongshu. Uma vez que ele podia mudar facilmente os nomes listados nos certificados de habitação que provavam propriedade, Ma colocou seu nome ou os de familiares em unidades de habitação vazias que em breve seriam derrubadas para construção de novas unidades. Ele então vendia as novas unidades a preço de mercado, embolsando todo o dinheiro.
Ma Weirong também conspirou com seu superior para lucrar ilicitamente. Quando um desenvolvedor imobiliário não pagou pelo espaço público num edifício do governo, o desenvolvedor ofereceu a Ma três unidades habitacionais em troca de cancelar o pagamento e os juros atrasados. Ma vendeu as três unidades habitacionais, fazendo 1,09 milhões de yuanes (cerca de US$ 164.414).
Para proteger-se ainda melhor, Ma Weirong ajudou seu superior a pôr seu nome, ou de seus familiares, em várias unidades de habitação do governo.
A regra de propriedade da terra do regime chinês, em que uma pessoa só pode obter os direitos de uso da terra por 70 anos mas nunca de fato possuir a terra, é uma grande brecha para a corrupção, frequentemente com funcionários do Partido Comunista Chinês (PCC) trabalhando em segredo com os desenvolvedores imobiliários. O governo local é o proprietário da terra, portanto, se assim o desejar, pode readquirir a terra repetidamente, e tomar o dinheiro ou ativos dos proprietários no processo.
Em março de 2016, um vídeo online de Wenquan, uma cidade da província de Henan, mostrou 300 vândalos empregados pelas autoridades locais envolvidos num combate corpo a corpo com os residentes locais quando as autoridades tentaram expulsá-los para abrir caminho para demolição de suas casas e reconstrução de novas unidades.
Às vezes, esses conflitos terminam tragicamente. Em julho de 2016, na vila do Monte Chazi, no centro da China, Gong Xuehui, um camponês de 60 anos, foi encontrado morto entre os escombros de sua casa após se recusar a sair e as equipes de demolição prosseguirem com os trabalhos sem piedade.
No Weibo, um serviço popular de microblogue da China, um internauta da província de Guangdong reagiu às recentes notícias com choque: “Apenas 20 anos [de sentença de prisão]!” Outro internauta da província de Hubei comentou: “E quanto ao seu superior? Ele também deve ser investigado.”
O internauta Chen Yulu, que se revelou como um ex-funcionário do departamento de propaganda da cidade de Zhangye, província de Gansu, acredita que a escala da corrupção é muito maior.
“Este fenômeno não se limita ao departamento de administração de habitação. Eu assumiria que há autoridades centrais de baixo escalão envolvidas na corrupção no processo de licitação [de habitação] e construção de habitações acessíveis”, escreveu Chen Yulu.