Após urânio brasileiro, China avança sobre o lítio boliviano com acordo de US$ 1 bilhão

Construção de plantas no Salar de Uyuni expande domínio chinês no mercado estratégico e acende alertas sobre dependência econômica da Bolívia.

Por Matheus Andrade
28/11/2024 13:11 Atualizado: 28/11/2024 13:11

A Bolívia anunciou na terça-feira (26) um acordo de US$ 1 bilhão com a CBC Investments, uma subsidiária da gigante chinesa de baterias CATL, para construir duas plantas de produção de lítio no Salar de Uyuni.

“A Bolívia está negociando com as maiores empresas, com as mais importantes, e este é um contrato fundamental (…) é de suma importância para o país por toda a geração de investimentos e recursos provenientes da exportação de carbonato de lítio, que nos gerará resultados ao longo dos próximos anos”, comemorou Luis Arce, presidente da bolívia.

A China tem buscado garantir acesso a recursos estratégicos, como o lítio e urânio, para sustentar sua indústria tecnológica e militar. O acordo também é uma tentativa da Bolívia de alavancar suas reservas de lítio e se posicionar no mercado global.

Com a CATL sendo a maior fabricante de baterias de íons de lítio do mundo, a China tem todo o interesse em garantir o controle das fontes de lítio.

Esse controle é crucial para que o Partido Comunista Chines (PCCh) possa manter sua vantagem competitiva na produção de baterias e na indústria de veículos elétricos.

Assim, o investimento no Salar de Uyuni não deve ser visto apenas como uma ajuda ao desenvolvimento boliviano, mas como uma peça importante em um jogo geopolítico maior.

A crescente participação chinesa na mineração boliviana está alinhada aos planos de Pequim de dominar a cadeia de produção de baterias e assegurar o controle de recursos fundamentais para a transição energética mundial.

No entanto, o envolvimento chinês no setor levanta preocupações sobre como isso pode afetar a soberania da Bolívia e sua capacidade de decidir sobre seus próprios recursos naturais.

Embora a estatal boliviana Yacimientos de Litio Bolivianos (YLB) tenha uma participação majoritária de 51%, garantindo certo controle sobre as reservas, a dependência de financiamento e tecnologia chineses deixa o país vulnerável.

Segundo Eduardo Gamarra, professor de política e relações internacionais da Universidade da Flórida (FIU), em um artigo focado nos riscos e na estratégia do país asiático em investir em mineração na América Latina, “a China se aproveitou das circunstâncias da região, conseguiu penetrar em economias precárias que não tinham acesso ao crédito convencional, prometendo investimentos e empréstimos, como a Bolívia, que já deve US$ 6 bilhões à China, mas isto será cobrado”.

A China já é um grande parceiro comercial dos países latinos e tem usado investimentos em infraestrutura e mineração como ferramentas para garantir acesso a recursos estratégicos.

Expansão da China e o “Triângulo do Lítio”

A China tem se empenhado em assegurar fontes de lítio na América do Sul, região que abriga as maiores reservas mundiais do mineral, abrangendo a Bolívia, o Chile e a Argentina – o chamado “Triângulo do Lítio“.

O envolvimento da CBC Investments é outra demonstração do interesse chinês em garantir uma fonte confiável de lítio para a sua crescente demanda interna e monopólio mundial, especialmente para a produção de baterias para carros elétricos.

Em janeiro de 2024, o consórcio chinês CATL BRUNP & CMOC também assinou um contrato de QUUS$ 1 bilhão com a Bolívia para construir usinas de extração de lítio. Na Argentina, a Tibet Summit Resources Co Ltd. investirá US$ 2,2 bilhões em projetos de lítio. A Ganfeng Lithium também anunciou operações no país.

No Chile, um parque industrial de lítio será construído em Antofagasta com um investimento superior a US$ 2 bilhões. O projeto é liderado pelo Tsingshan Holding Group. A Tianqui Lithium adquiriu 24% da SQM para exportar lítio para a China.

As plantas de produção construídas no Salar de Uyuni, uma das maiores reservas de lítio do mundo, têm a meta de produzir 35 mil toneladas métricas de carbonato de lítio anualmente.

Conforme reportado pelo Epoch Times Brasil, os interesses da China não estão apenas nos países hispânicos, mas também no Brasil. A China Nonferrous Trade Co. Ltd., subsidiária do China Nonferrous Metal Mining Group, adquiriu a maior reserva de urânio do país, localizada no estado do Amazonas.

Porém o histórico da China Nonferrous de negócios com o Irã — estado considerado patrocinador estatal de terrorismo pelo governo americano – gera receios internacionais.

A presença russa

A China não é a única potência interessada nas reservas de lítio da Bolívia.

Em 2024, o país também assinou um contrato de US$ 976 milhões com a Uranium One Group, de propriedade da estatal russa Rosatom, para desenvolver outra planta de extração de lítio no Salar de Uyuni.

Esse projeto buscava produzir 14 mil toneladas métricas de lítio por ano, quantidade agora atualizada para 25 mil toneladas, consolidando a presença russa no setor de recursos minerais na América do Sul.

Os investimentos russos e chineses representam, sem dúvida, uma tentativa de explorar as vastas reservas de lítio da Bolívia, a maior do mundo, estimadas em cerca de 24,6% da reserva total da terra.