“Violência obstétrica”: MPF e entidades repudiam orientação do ministério da Saúde de abolir termo

Órgão Federal diz que termo tem conotação inadequada

10/05/2019 16:16 Atualizado: 10/05/2019 16:16

Por Migalhas

Um despacho do Departamento de Ações Programáticas Estratégicas do ministério da Saúde tem causado polêmica ao informar que o posicionamento oficial do órgão é que o termo “violência obstétrica” tem conotação inadequada e, portanto, “estratégias têm sido fortalecidas para a abolição do seu uso”.

Veja aqui o despacho.

Acerca do despacho, MPF, OAB e a Anadef — Associação Nacional dos Defensores Públicos Federais — repudiaram a orientação do órgão Federal.

O MPF emitiu recomendação (29/2019) para que o ministério se abstenha de empregar quaisquer ações voltadas especificamente à abolição do uso da expressão “violência obstétrica”.

Segundo o parquet Federal, o inquérito civil que trata do tema (1.34.001.007752/2013-81) conta com 1.952 páginas em seus autos principais com dezenas de denúncias apresentadas por mulheres e documentos técnicos encaminhados por diversas entidades tratando do atendimento ao parto no país.

O documento, assinado pela procuradora da República Ana Carolina Previtalli Nascimento, argumenta que as conclusões do despacho do ministério da Saúde “contrariam farto material probatório produzido pelo Ministério Público Federal que demonstra sérias violações aos direitos fundamentais das mulheres durante atendimento obstétrico, com a prática de atos de violência contra as mulheres, física, verbal e emocional, independentemente da intenção de causar dano dos profissionais envolvidos”.

Veja a recomendação.

A Ordem, por sua vez, sustenta que o despacho claramente fere os direitos fundamentais das mulheres, as políticas públicas de identificação, prevenção e erradicação da violência contra a mulher e o interesse público.

E a Anadef, enfática, julga a extinção do termo “um verdadeiro preciosismo político, visto que a justificativa do Governo Federal foi associá-lo ao viés ideológico”:

“A cinco dias do Dia das Mães, é inquestionável o retrocesso nos direitos das mulheres promovido pelo Ministério da Saúde com a medida, que está na contramão do trabalho realizado pela Organização Mundial de Saúde (OMS), pautado na redução da mortalidade materna, em muitos casos provocada pela violência obstétrica.”

Confira abaixo as manifestações.

OAB

A Ordem dos Advogados do Brasil, por meio da Comissão Nacional da Mulher Advogada e da Comissão Especial de Direito Médico e da Saúde, vem a público repudiar o despacho proferido no dia 3 de maio de 2019, pelo Ministério da Saúde, que busca abolir o uso do termo “violência obstétrica”, por considerá-lo impróprio.

Tal postura dificultará a identificação da violência de gênero ocorrida durante a assistência do ciclo gravídico-puerperal, impactando negativamente a saúde pública. Ressalte-se que a violência de gênero ocorrida contra a mulher em estabelecimento de saúde, público ou privado, durante a sua assistência, é considerada um agravo de saúde pública e deve ser objeto de notificação compulsória, conforme disposto na lei federal nº 10.778/2003.

O ato de amenizar condutas violentas cometidas contra as mulheres, sem observar casos específicos e o reflexo do despacho no mundo jurídico, fere o artigo 20 da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro. Também contraria fortemente as políticas públicas de proteção e erradicação da violência contra a mulher e a Convenção de Belém do Pará, além da já citada Lei Federal nº 10.778/2003.

A medida também constitui ato de censura contra importantes atividades científicas desenvolvidas em todo país sobre o tema, por limitar a utilização de dados e evidências nos programas que serão desenvolvidos pelo Ministério da Saúde.

O despacho, portanto, claramente fere os direitos fundamentais das mulheres, as políticas públicas de identificação, prevenção e erradicação da violência contra mulher e o interesse público.

Comissão Especial de Direito Médico e da Saúde do Conselho Federal da OAB

Comissão Nacional da Mulher Advogada do Conselho Federal da OAB

Anadef

A Associação Nacional dos Defensores Públicos Federais (Anadef) repudia com veemência o despacho do Ministério da Saúde que abole o termo “violência obstetríca”, usado para definir casos de violência física ou psicológica contra mulheres e recém-nascidos na gestação ou na hora do parto.

A Anadef julga a extinção do termo um verdadeiro preciosismo político, visto que a justificativa do Governo Federal foi associá-lo ao viés ideológico. A cinco dias do Dia das Mães, é inquestionável o retrocesso nos direitos das mulheres promovido pelo Ministério da Saúde com a medida, que está na contramão do trabalho realizado pela Organização Mundial de Saúde (OMS), pautado na redução da mortalidade materna, em muitos casos provocada pela violência obstétrica.

Para os defensores e defensoras federais, a violência obstétrica continua sendo qualquer ato de irresponsabilidade ou agressão praticado contra gestantes e o bebê durante o atendimento nas maternidades. A Anadef se solidariza com todas as mães do Brasil e reafirma a sua luta contra qualquer violência à mulher, seja ela física, psicológica, verbal, simbólica e/ou sexual.

Associação Nacional dos Defensores Públicos Federais