BRASÍLIA, Senado – O Senado aprovou o processo de impeachment da presidente Dilma Rousseff, nesta quinta-feira (12), após uma luta de meses que despertou fúria no país com relação à corrupção e à decadência econômica, lançando o maior país da América Latina em uma turbulência política poucos meses antes dos Jogos Olímpicos de Verão.
Militantes pró-Dilma enfurecidos chamaram o movimento de golpe de Estado e ameaçaram realizar protestos e greves em grande escala. Seus inimigos, por sua vez, afirmaram que ela descumpriu a lei, e que os profundos problemas políticos, sociais e econômicas do país só poderiam ser combatidos com ela nos bastidores.
A votação foi de 55 votos a favor e 22 votos contra, significando que o vice-presidente Michel Temer assumirá como presidente interino após esta quinta-feira, 12 de maio de 2016, enquanto Dilma estiver suspensa. O Senado tem 180 dias para a realização de um julgamento e decidir se a ex-presidente deve ser permanentemente afastada do cargo.
“Alguém pensou que iríamos chegar a 2018 com alguma recuperação sob este governo? Impossível, disse José Serra, candidato da oposição que perdeu a eleição para Dilma Roussef em 2010, lançando-a ao poder. “O impeachment é apenas o começo da reconstrução”.
O impeachment de Dilma terminará com 13 anos de governo do Partido dos Trabalhadores, que é creditado por tirar milhões da pobreza extrema, mas vilipendiado por estar ao volante quando bilhões foram desviados da empresa petrolífera estatal Petrobras.
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Os analistas dizem que Dilma se complicou de uma forma delicada e uma reticência velada ao trabalhar com os legisladores que podem ter alienado possíveis aliados. Rousseff, no entanto, sugeriu que o sexismo no Congresso, dominado por homens, desempenhou um importante papel no impeachment.
Temer, um político de 75 anos, prometeu cortar gastos e privatizar vários setores controlados pelo Estado. Durante semanas, ele foi discretamente estruturar seu novo gabinete na expectativa de assumir a presidência. Os aliados de Rousseff se irritaram e o acusam de estar tramando um complô para derrubá-la.
Durante o debate, Humberto Costa, líder do Partido dos Trabalhadores no Senado, expôs uma foto de Rousseff de seus dias como um jovem guerrilheira marxista de 1964 a 1985, período de ditadura no país. A imagem mostrava procedimentos militares contra ela.
Costa considerou a votação pelo processo de impeachment no Senado como sendo um ato injusto contra Dilma, e que o impeachment foi tramado pelas classes dirigentes tradicionais do Brasil para reafirmar seu poder sobre o país e reverter as políticas do partido dos trabalhadores em favor dos pobres.
“A elite brasileira, a classe dominante, que continua a tratar este conselho como se fosse seu domínio hereditário, não aprecia a democracia”, disse Costa.
Dilma, aos 68 anos de idade, foi acusada por uma suposta utilização incorreta do orçamento federal. Críticos afirmam que ela usou truques de contabilidade para esconder os déficits acumulados no intuito de apoiar um governo em apuros. Primeira mulher presidente do Brasil, tendo sido torturada durante a ditadura do país, ela criticou frequentemente a pressão pelo impeachment como sendo um golpe moderno, argumentando que ela não tinha sido acusada de um crime sequer e que os presidentes anteriores fizeram coisas semelhantes.
Quando o recurso do impeachment foi introduzido no ano passado no Congresso, este era geralmente visto como um tiro no escuro: em fevereiro, consultorias como a Eurasia estavam prevendo que este não seria nem sequer aprovado pelo comitê da Câmara dos Deputados.
No entanto, a pressão foi aumentando ao longo de vários meses, com brasileiros enfurecidos diante de numerosos escândalos de corrupção ligados à Petrobras e os anúncios diários de perdas de empregos, que adicionaram crescente desespero. A economia deverá contrair quase 4% após um igualmente lúgubre ano de 2015. A inflação e o desemprego estão oscilando em torno de 10%, destacando um declínio acentuado após um crescimento estelar durante mais de uma década.
A ação do Senado veio depois que a Câmara dos Deputados votou, no mês passado, a favor do impeachment.
As pesquisas disseram que a maioria dos brasileiros são a favor do impeachment de Dilma Rousseff, embora eles também sugiram que o público está cauteloso sobre aqueles que estarão na linha de sucessão da Presidência da República.
Temer está envolvido no esquema de corrupção da Petrobras assim como Renan Calheiros, o Presidente do Senado, que agora é o 2º na linha de sucessão. O ex-presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha, que tinha sido segundo na linha, foi suspenso do cargo este mês em decorrência de alegações de obstrução da justiça e corrupção.
Dilma negou veementemente que o seu truque de prestidigitação financeira, realizado durante seu mandato, foi um crime e argumentou que tais manobras foram usadas por presidentes anteriores sem repercussões. Ela ainda salientou que, ao contrário de muitos a favor do impeachment, ela não enfrenta quaisquer alegações de corrupção pessoal.
Rousseff disse que o processo de impeachment equivale a um golpe destinado a desfazer os programas sociais que retiraram cerca de 35 milhões de brasileiros da pobreza extrema nos últimos anos.
Temer, do PMDB, afirma que irá expandir os programas sociais populares, embora ele também tenha sinalizado que o rigor fiscal é necessário para recuperar o Brasil de sua atual precária situação econômica.
Somando-se às preocupações econômicas dos brasileiros, a investigação (operação Lava-Jato) de um esquema de propina de bilhões de dólares na Petrobras tem envolvido dezenas de políticos de elite e empresários em todo o espectro político. Embora a própria Dilma não tenha sido envolvida, altos funcionários do PT foram acusados, repercutindo negativamente em sua reputação.
A presidente “está tendo que pagar por tudo”, disse o senador Telmario Mota de Oliveira, argumentando que os problemas do Brasil não devem ser todos creditados a ela.