O Congresso Nacional decidiu, nesta terça-feira (28), manter o veto do ex-presidente Jair Bolsonaro a um dispositivo da Lei de Segurança Nacional (LSN) que criaria o “crime de fake news” e, na prática, instalaria a censura prévia no país. Foram 317 votos a favor da manutenção do veto de Bolsonaro, 139 contra e quatro abstenções. Além disso, todos os outros sete vetos do ex-presidente à LSN, que também estavam em avaliação, foram mantidos. O resultado foi considerado uma vitória esmagadora da oposição contra o governo Lula, bem como da liberdade de expressão no Brasil.
A sessão conjunta – Câmara e Senado – conduzida pelo presidente do Congresso Rodrigo Pacheco (PSD-MG), foi marcada por discussões acaloradas entre governo e oposição. Tanto o atual presidente da República quanto seu antecessor se articularam no Legislativo por semanas, pela manutenção e derrubada do veto. Assim que a votação se encerrou, os parlamentares vitoriosos gritaram repetidamente em coro: “Lula, ladrão, seu lugar é na prisão”!
Inalterada desde 1983, a LSN foi atualizada durante a gestão Bolsonaro, mais precisamente em setembro de 2021. Apesar de aprovada pelo Congresso, apresentou vários vetos por parte do então presidente da República. O principal deles, e que foi mantido hoje pelos parlamentares, diz respeito à liberdade de expressão.
O dispositivo vetado por Bolsonaro definia como crime “promover ou financiar campanha ou iniciativa para disseminar fatos que se sabe inverídicos, e que sejam capazes de comprometer a higidez do processo eleitoral” – descrição que o governo Lula e sua mídia alinhada entendem por “fake news”. A penalidade para o descumprimento deste artigo, caso tivesse sido aprovado no Congresso na época – e derrubado nesta terça – seria de um a cinco anos de detenção, além de multa.
O veto do ex-presidente teve como justificativa o fato de o texto não esclarecer qual conduta seria objeto de criminalização, ou seja, se seria julgado quem gerou ou compartilhou o suposto “fato inverídico”.
O caráter vago da expressão “que se sabe inverídicos” – pela necessidade de haver alguém para definir o que é verídico ou inverídico – também fragilizou a aprovação do artigo na época.
Vitória da oposição: veto de Lula para “saidinhas” é derrubado
O Parlamento também derrubou hoje (28) os vetos do presidente Lula (PT) que garantia as saídas temporárias de presos, mais conhecidas como “saidinhas”. Com a volta da proibição, o benefício não será mais concedido em feriados e datas comemorativas, como Natal e Dia das Mães. O veto foi derrubado pelos deputados por 314 a 126 votos, com duas abstenções. Quanto aos senadores, o veto foi cancelado por 52 a 11 votos, com uma abstenção.
A “guerra dos vetos” começou com uma tentativa de chantagem feita pela base do governo à oposição de Lula no Congresso. Em ano eleitoral, e devido à péssima repercussão na sociedade, havia uma forte expectativa de que os parlamentares derrubassem, por ampla maioria, o veto de Lula que ainda permitia as “saidinhas”.
Para impedir a perda deste favorecimento a criminosos condenados e evitar a derrota esmagadora, a base governista fez uma chantagem à oposição: esta não derrubaria o veto de Lula que permite as “saidinhas” e, em troca, o governo petista não tentaria cancelar o veto de Bolsonaro e consequentemente criar o “crime de fake news”.
Como a oposição não cedeu à tentativa de barganha, os lulistas conseguiram emplacar, em retaliação, a votação de ambos os vetos – tanto o de Bolsonaro quanto o de Lula – para o mesmo dia. E o ex-presidente, pelo menos até o momento, vem ganhando no Congresso a queda de braço contra o atual mandatário.
Governo Lula tentou instalar a censura no Congresso em abril
Em abril, a base de Lula tentou reabilitar o Projeto de Lei 2.630/2020, conhecido como PL das “fake news”, com a finalidade de conter as denúncias do caso Twitter Files Brazil. A denúncia trouxe à tona um compilado de e-mails trocados, entre 2020 e 2022, por funcionários do antigo Twitter (atual X) sobre decisões judiciais brasileiras que censuraram jornalistas, políticos e influenciadores. Os e-mails foram revelados pelo jornalista americano Michael Shellenberger, no dia 3 de abril deste ano.
Apesar da pressão da esquerda, o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), descartou a proposta na ocasião, após dialogar com os líderes da Casa.
Decisão do Congresso provoca debate sobre censura e STF
Aberto de ofício em 2020 pelo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes, o inquérito que tenta imputar a influenciadores, políticos, empresários e artistas o “crime de fake news” continua em vigor até hoje, sem prazo para conclusão. A situação provoca cada vez mais críticas por parte de especialistas em Direito Penal. Eles entendem que isso não é permitido a magistrados.
O ex-ministro do STF Marco Aurélio Mello é contrário ao inquérito. Segundo ele, as investigações miram manifestações críticas contra os ministros que, em seu entendimento, já estão protegidas pela liberdade de expressão e de pensamento. Parlamentares oposicionistas, que votaram contra a censura nesta terça-feira, estão sendo investigados por Alexandre de Moraes.