Governo destaca crescimento na produção de veículos, mas expansão de crédito e subsídios preocupam especialistas

Apesar da euforia com a alta no setor automotivo, medidas podem gerar bolhas econômicas e levar a uma crise financeira, com endividamento elevado e fragilidade no consumo.

Por Matheus de Andrade
06/09/2024 18:31 Atualizado: 07/09/2024 20:16

O governo federal, através do vice-presidente e ministro do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços, Geraldo Alckmin, comemorou o resultado positivo da indústria automotiva em agosto de 2024. Com 259.613 veículos produzidos, o mês representou a maior alta mensal desde 2019. Apesar disso, outros dados mostram que esse crescimento é insustentável e artificial.

 “[Quero] cumprimentar o setor, a Anfavea, pelos bons números. As vendas cresceram 14%, praticamente. E esse é um momento bom. Aumentou a confiança do consumidor. Aumentou a confiança do empresário”, afirmou Alckmin, destacando a recuperação do setor após os anos de pandemia e as dificuldades enfrentadas pela economia global.

A reação positiva do governo é acompanhada de otimismo quanto à recuperação do mercado e o aumento na confiança dos consumidores e empresários. O governo enxerga esses números como reflexo de medidas que incentivaram o consumo, estimulando a indústria automotiva, setor estratégico para a economia nacional.

Além disso, a maior oferta de crédito contribuiu para alavancar as vendas de veículos, criando um cenário favorável para o crescimento industrial e a geração de empregos.

A Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea) foi quem publicou os dados. Em agosto, as vendas de veículos totalizaram 237,4 mil unidades, representando um crescimento de 14,3% em comparação ao mesmo mês do ano anterior. No acumulado de janeiro a agosto de 2024, 1,622 milhão de unidades passaram a circular no Brasil, registrando um crescimento de 13,3% em relação a 2023. Já a produção de veículos atingiu 259,6 mil unidades em agosto, um aumento de 5,2% em relação a julho e 14,4% em comparação ao mesmo período de 2023. A produção acumulada no ano chegou a 1,644 milhão de veículos, alta de 6,6% no ano.

Outro fator importante foi o desempenho das exportações, que somaram 38,2 mil unidades em agosto, apesar de uma queda de 17,9% em comparação ao ano anterior. O setor de ônibus, por sua vez, destacou-se, com um crescimento de 41,0% na produção de janeiro a agosto de 2024.

O que explica os números positivos

Esse aumento na produção e vendas de veículos está associado principalmente ao crescimento dos financiamentos e subsídios no setor.

De acordo com o relatório de julho de 2024 da bolsa de valores brasileira, B3, foram financiadas 4,058 milhões de unidades no acumulado do ano, um crescimento de 24,3% em relação a 2023.

O Crédito Direto ao Consumidor (CDC) foi a modalidade mais utilizada, com um aumento de 29,8% em julho de 2024, quando comparado ao mesmo mês do ano anterior. O crescimento do financiamento ocorreu mesmo em um cenário de taxa Selic a 10,5%, indicando que o apetite pelo consumo de veículos foi fortalecido pelo acesso facilitado ao crédito.

No entanto, essa expansão do crédito, que visa estimular o consumo, pode levar a crises econômicas, conforme apontado pela teoria dos ciclos econômicos da Escola Austríaca. Segundo essa teoria, quando há uma expansão artificial do crédito sem o correspondente aumento de poupança real, ocorre um boom inicial, um período de “vacas gordas” no consumo e nos investimentos, que é seguido por um um período de “vacas magras”, um colapso econômico.

Os dados mais recentes do Banco Central referente a agosto de 2024 mostram justamente isso. Do dia 1 até o dia 23 de agosto, apenas 5 dias foram positivos para os depósitos, mostrando que as poupanças tem se esvaziado cada vez mais. A captação líquida, que é o valor de depósitos menos o valor de retiradas, atingiu um valor negativo de R$ 9 milhões durante o mês.

(Depósitos e retiradas da poupança no Brasil em agosto de 2024. Dados do Banco Central)

Essa expansão descontrolada de crédito cria bolhas nos setores beneficiados, como o automotivo, resultando em investimentos que se mostram insustentáveis a longo prazo. Assim, os desequilíbrios gerados culminam em recessões, em que os erros de investimento se tornam evidentes.

Um alerta relacionado a essa questão foi dado pelo Conselho Monetário Nacional e Econômico Financeiro (Conmef), vinculado ao Banco Central, que destacou os riscos do aumento do crédito no Brasil. O órgão alertou para o perigo de um endividamento elevado, já que a expansão do crédito tem impulsionado o consumo de forma significativa.

O Conmef indicou que o crescimento do endividamento das famílias e empresas pode representar um risco à estabilidade financeira, principalmente em um cenário onde a inadimplência começa a se elevar. O órgão recomendou que os bancos e instituições financeiras adotem práticas mais cuidadosas na concessão de crédito, de forma a evitar uma crise de endividamento que possa impactar de maneira negativa a economia nacional​

“Estamos vendo um crescimento em vendas e financiamentos de carros. Festa no governo, manchetes para todo lado. O que não estamos vendo é que no fim de 2023 o governo federal deu um subsídio de quase 20 bilhões para montadoras no Brasil”, disse Raphael Lima, fundador do Instituto Livre Mercado e fundador da da consultoria de imigração Settee, influenciador digital de economia e libertarianismo dono do canal do YouTube, Ideias Radicais, em conversa com o Epoch Times Brasil.

Esses subsídios, explica ele, todos pagam, através de impostos, para que poucos comprem e façam o setor crescer. 

“Lula se elegeu prometendo picanha e cervejinha. Certamente as montadoras brasileiras ganharam um belo churrasco. Alguns puderam economizar um pouco no carro novo. E quase todos os outros ganharam uma bela conta”, finalizou Raphael.