Por Bloomberg
O gerente da fazenda, Marcos Aurélio de Queiroz, quer triplicar o número de cabeças de gado que sua empresa, a CSM Agropecuária, envia para o abate todo ano. A parte complicada: fazer isso sem adicionar um único pedaço de terra.
Durante décadas, fazendeiros do estado do Pará expandiram suas propriedades com fogo e machado, desmatando vastas áreas da floresta amazônica. Era um orgulho e um diferencial competitivo o fato de que suas vacas eram engordadas naturalmente, enquanto rivais nos Estados Unidos e outros lugares cada vez mais usavam e dependiam de fazendas de confinamento e alimentação exclusiva de grãos. Agora as coisas estão mudando.
O desmatamento da Amazônia não é proibido pelo governo, mas é severamente limitado. E os exportadores de carne bovina, incluindo a gigante JBS SA, concordaram em não comprar gado de nenhuma área desmatada depois de 2008. Ao mesmo tempo, o esgotamento das pastagens mais antigas está forçando os fazendeiros a fazer a rotação de gado e plantações para cultivar a terra. A CSM utilizou 3.000 hectares (7.400 acres) para o cultivo e plantio este ano em suas quatro fazendas na região e planeja utilizar 10.000 mais adiante.
“É uma revolução”, disse Queiroz em uma entrevista. “Eu sempre tive em mente que a pecuária deveria ser integrada à agricultura” Além disso, cerca de 30% do gado da empresa agora está em confinamento, disse ele.
A mudança na indústria tem sido lenta, mas agora está aumentando a velocidade, adicionando pressão aos fazendeiros tradicionais que precisam permanecer competitivos, de acordo com Mauricio Nogueira, diretor da Athenagro, uma empresa de consultoria sediada em São Paulo. “Estamos caminhando para um cenário de preços que não tolerará mais a baixa tecnologia”, disse Nogueira em uma entrevista.
No estado do Pará, onde a maioria das fazendas da CSM está localizada, a taxa média de vacas por hectare saltou quase 70% na última década, de acordo com a Athenagro. O número de animais engordados em confinamento quase triplicou.
“Vamos ver um processo de intensificação”, disse o diretor executivo Cleiton Luiz Custodio, da Agro Santa Bárbara SA, em Xinguara, onde a empresa agora tem dezenas de confinamentos espalhados por uma fazenda do tamanho da área da cidade de Nova Iorque. “Estamos buscando obter mais receita por hectare”.
Rotação de culturas e gado em terra alimenta o solo e aumenta a quantidade de grama disponível para o gado, que ganha peso muito mais rápido e pode ser enviado para o abate em menos de 20 meses, contra 36 em um sistema tradicional, de acordo com Custodio
O rebanho bovino no Pará dobrou para mais de 20 milhões de cabeças desde o início dos anos 2000, ou quase o dobro do tamanho do rebanho no estado norte-americano do Texas. A maior parte da expansão ocorreu através da queima de florestas em favor de novas pastagens, despertando o alarme sobre o impacto da pecuária na região amazônica.
Mesmo que o desmatamento na Amazônia do Pará tenha diminuído 68% em relação ao pico de 2004, alguns agricultores continuam queimando e cortando. No ano passado, por exemplo, uma área maior do que a cidade de Tóquio foi desmatada.
Ao mesmo tempo, o presidente eleito Jair Bolsonaro prometeu aliviar as restrições ambientais, então há uma chance de o governo ser muito mais flexível a partir de agora. E, com certeza, nem todo fazendeiro é receptivo às mudanças.
Mauricio Fraga Filho tem cerca de 25.000 cabeças de gado em três fazendas no Pará. Ele não está adotando confinamento ou integração lavoura-pecuária, conforme relata:
“Os confinamentos só ajudam os frigoríficos porque significam maior oferta de gado durante o período de entressafra”, disse Filho em uma entrevista. “Você não pode reter o gado quando os preços estão baixos porque o custo de manter o animal no confinamento é muito alto. Então você perde seu poder de barganha”
Ainda assim, as restrições agora “estão levando as pessoas a investir mais”, disse Claudiomar Kehrnvald, um fazendeiro que cria mais de 60 mil cabeças de gado no Pará.
O Brasil tem cerca de 15 milhões de hectares usando a rotação de culturas, em comparação com menos de 5 milhões de hectares de uma década atrás, de acordo com a EMBRAPA. O governo do Brasil estimulou a prática ao oferecer empréstimos subsidiados destinados a reduzir as emissões de carbono no setor agrícola.