Uma comitiva de especialistas em medicina do regime chinês foi recepcionada, na segunda-feira (30), pelo governador Geraldo Alckmin. A reunião, feita no Palácio dos Bandeirantes, tratou da proposta de construção do primeiro hospital chinês da América Latina em São Paulo, como também de parcerias com o estado no setor de saúde.
Segundo informações da Câmara de Comércio de Desenvolvimento Internacional Brasil-China, que pediu o encontro, o hospital teria capacidade para dar atendimento tanto à população brasileira como chinesa.
“A proposta é de unir a medicina tradicional chinesa com as técnicas ocidentais, tanto na área de prevenção quanto de cura. O complexo hospitalar comportaria 250 leitos, com 50 de UTI, além de shopping e área cultural, com parque”, assinala a assessora-especial para assuntos internacionais do governo do estado de São Paulo, Ana Paula Fava, também presente à reunião. “O governador Geraldo Alckmin reforçou a presença da China em São Paulo como um grande parceiro, principalmente na área empresarial, e, agora, com perspectiva de investimentos na área médica”, concluiu.
A comitiva pertence à Administração de Medicina Tradicional Chinesa do Governo da República da China. Estiveram presentes ao encontro o vice-ministro da saúde nacional e planejamento familiar, Wang Guoqiang, o diretor-geral do escritório de controle de doenças, Yu Jingjin, o diretor-geral de cooperação internacional, Wang Xiaopin, o diretor-geral de cooperação internacional, Nie Jiangang, e o diretor do Escritório Europeu e Americano de Cooperação Internacional, Lu Ming. O secretário estadual da saúde, David Uip, também esteve presente.
Parcerias
A partir do encontro do governador Geraldo Alckmin com a vice-primeira-ministra chinesa Liu Yandong no Palácio dos Bandeirantes em agosto de 2016, o governo paulista já recepcionou onze delegações chinesas. O mais recente encontro do governador com um representante do governo da China aconteceu em setembro deste ano, com o anúncio do consórcio chinês Temoinsa-Sifang/CRRC, que venceu a concorrência para fabricar os trens da Linha 13-Jade, da CPTM, que transportará os passageiros até o Aeroporto Internacional de Guarulhos.
No decorrer do anúncio, a nova cônsul-geral da China no Brasil, Chen Peijie, destacou a importância das parcerias com as instituições paulistas. Desde 2007, São Paulo e China já firmaram oito acordos de cooperação, notadamente nas áreas de meio ambiente, agricultura e esporte. O estado de São Paulo é o maior parceiro comercial e de investimentos da China na América Latina e possui uma colônia de 300 mil chineses.
Abaixo, segue um histórico do mercado negro de transplantes de órgãos na China
Cirurgiões de transplante na China têm a sua disposição uma abundância de órgãos humanos. Alguns queixam-se de trabalhar turnos de 24 horas, realizando cirurgias de transplante em série. Outros tentam assegurar que haja órgãos de reserva disponíveis, recém-extraídos, em caso de rejeição. Alguns hospitais conseguem órgãos em poucas horas, enquanto outros relatam terem transplantado dois, três ou quatro órgãos estocados quando houve sucessivas rejeições.
Tudo isto vem ocorrendo na China há mais de uma década, sem que haja um sistema voluntário funcional de doação de órgãos e algumas centenas de prisioneiros no corredor da morte sendo executados – a China afirma que essas seriam suas fontes oficiais de órgãos. Em telefonemas, médicos chineses disseram que a verdadeira fonte dos órgãos é um segredo de Estado. Enquanto isso, praticantes do Falun Gong têm desaparecido em grande número, e muitos relataram terem sido submetidos a exames de sangue enquanto estavam em custódia das autoridades.
Mas cristãos, tibetanos, uigures, ativistas de direitos humanos e dissidentes políticos também fariam parte da lista de vítimas do regime chinês, porém, proporcionalmente, em menor quantidade.
Um relatório sem precedentes produzido por uma pequena equipe de incansáveis pesquisadores foi publicado em 22 de junho e documenta em detalhes, por vezes surpreendentes, a rede de centenas de hospitais chineses e instalações de transplante que operam discreta mas intensamente na China desde cerca de 2000.
Coletivamente, estas instalações teriam a capacidade para realizar entre 1,5 e 2,5 milhões de transplantes ao longo dos últimos 16 anos, segundo o relatório. Os autores suspeitam que o número real seja de 60 mil a 100 mil transplantes por ano desde 2000.
“A conclusão final dessa atualização, e também de nossos trabalhos anteriores, é que a China está envolvida no assassinato em massa de inocentes”, disse o coautor David Matas durante o lançamento do relatório no National Press Club em Washington, D.C., em 22 de junho.
O estudo, intitulado “Bloody Harvest/The Slaughter: An Update,” (“Colheita sangrenta/A matança: Uma atualização” [tradução livre]), se baseia em trabalhos anteriores dos autores sobre o tema. Publicada logo após a passagem de uma resolução no Congresso dos Estados Unidos, um ato de censura oficial à extração forçada de órgãos na China, a pesquisa coloca uma questão explosiva: Está ocorrendo um genocídio médico em grande escala na China?
Grandes lucros
O Hospital Geral do Exército da Libertação Popular (ELP), cuja principal tarefa é prestar atendimento de saúde para a alta liderança do Partido Comunista e da hierarquia militar, está entre os hospitais mais avançados e bem equipados na China. O número de transplantes de órgãos que este hospital realiza é um segredo militar, mas no início da década de 2000, sua divisão clínica, o Hospital 309, estava gerando a maior parte de seu dinheiro com cirurgias de transplante.
“Nos últimos anos, o centro de transplante tem sido a unidade de saúde mais rentável, com renda bruta de 30 milhões de yuanes em 2006 para 230 milhões em 2010, um crescimento de quase oito vezes em cinco anos,” segundo seu site da web. Isso é um salto de 4,5 milhões de dólares para 34 milhões de dólares.
O Hospital Geral do ELP não foi a única instituição de saúde a se deparar com esta oportunidade de negócio lucrativo. O Hospital Daping em Chongqing, afiliado com a Terceira Universidade Médica Militar, também conseguiu aumentar sua receita de 36 milhões de yuanes no final de 1990, quando apenas começou a realizar transplantes, para quase 1 bilhão em 2009, um crescimento de 25 vezes.
Mesmo Huang Jiefu, o porta-voz oficial do regime chinês para sua política de transplante de órgãos, afirmou à respeitada publicação de negócios Caijing em 2005: “Há uma tendência que o transplante de órgãos se torne uma ferramenta para os hospitais ganharem dinheiro.”
Como essas proezas notáveis foram alcançadas em tão pouco tempo em toda a China, quando não havia qualquer sistema voluntário de doação de órgãos, quando o número de prisioneiros no corredor da morte estava diminuindo, e para que os tempos de espera para pacientes que necessitavam de transplantes pudessem ser de semanas, dias ou até mesmo horas, é o assunto do novo relatório de 817 páginas.
“Esta é uma pesquisa extremamente difícil de fazer”, disse Li Huige, um professor no centro médico da Universidade Johannes Gutenberg de Mainz, na Alemanha, e membro dos Médicos Contra a Extração Forçada de Órgão (DAFOH), após revisar o estudo.
O relatório contém um registro forense de todos os centros de transplantação de órgãos conhecidos na China, mais de 700 deles, e contabiliza e descreve quanto leitos possuem, suas taxas de utilização, a equipe cirúrgica, os programas de treinamento, a aquisição de nova infraestrutura, os tempos de espera dos recipientes dos órgãos, os números de transplantes anunciados, o uso de drogas de antirrejeição, etc. Os autores, armados com estes dados, estimaram o número total de transplantes realizados em mais de 1 milhão.
Esta conclusão, porém, é apenas parte da história.
“É um sistema enorme. Cada hospital tem tantos médicos, enfermeiros e cirurgiões. Isso em si não é um problema. A China é um país grande”, disse o Dr. Li Huige numa entrevista por telefone. “Mas de onde vieram todos esses órgãos?”
Órgãos para transplante não podem ser removidos de cadáveres e simplesmente colocados em armazenamento até que sejam necessários: eles precisam ser extraídos antes ou logo após a morte, e em seguida transplantados rapidamente para um novo hospedeiro. A agilidade, muitas vezes desesperadora, e a logística em torno deste processo tornam a compatibilização de órgãos na maioria dos países um campo complexo, com listas de espera e equipes dedicadas que encorajam os familiares de vítimas de acidentes a doarem órgãos.
Mas, na China, os doadores parecem estar cativos, esperando pelos destinatários.
O Hospital Changzheng em Shanghai, um importante centro médico do ELP, relatou a realização de 120 “transplantes de emergência de fígado” até abril de 2006.
A expressão refere-se a quando um paciente com uma condição de risco de morte iminente é admitido no hospital ou ala de transplante, e um órgão compatível é encontrado em apenas algumas horas. Isso é raríssimo em outros países.
Mas o Hospital Changzheng publicou um artigo no Jornal de Cirurgia Clínica, uma revista médica chinesa, sobre seu sucesso com os transplantes de emergência. “O tempo mais curto para um paciente ser transplantado após sua entrada no hospital foi de quatro horas”, indicou o artigo.
Num período de uma semana entre 22 e 30 de abril de 2005, o hospital realizou 16 transplantes de fígado e 15 de rim.
O Primeiro Hospital Afiliado da Universidade de Zhejiang publicou seu próprio estudo a respeito, documentando que entre o início de 2000 e final de 2004, 46 pacientes receberam “transplantes de emergência de fígado”, significando que os destinatários foram compatibilizados com um doador em 72 horas.
Até mesmo o registro oficial de Transplante Hepático da China, numa série de slides apresentada em seu relatório anual de 2006, compara o número de cirurgias de transplante “seletivamente programadas” com os transplantes de emergência. Houve 3.181 transplantes regulares no ano, e 1.150, ou pouco mais de um quarto, foram realizados em condições de compatibilização de emergência.
Estes fenômenos são extremamente difíceis, se não impossíveis, de explicar de acordo com pronunciamentos oficiais. E eles se apresentam como evidência à primeira vista de que uma população de doadores cativos está disponível para que seus órgãos sejam extraídos.
“Isto é muito comovente para mim”, disse Wendy Rogers, uma bioeticista australiana da Universidade Macquarie, que vivenciou a experiência em que uma grande amiga sofreu insuficiência hepática devido à hepatite e precisou de um transplante dentro de três dias para ter alguma chance de viver.
“Ela foi extraordinariamente afortunada em obter um [fígado] neste prazo”, disse a Dra. Rogers.
“Mas para fazer 46 destes [tipos de cirurgia] em série? É difícil pensar em outra explicação plausível, exceto a execução sob demanda.”
Partes do relatório, que combinam relatos de testemunhas e documentos médicos chineses, afirmam que alguns doadores sequer estariam mortos quando seus órgãos foram removidos. Isso inclui o testemunho de um ex-policial paramilitar, que disse ter assistido a uma operação de extração de órgãos com o “doador” vivo e sem anestesia, e de um ex-profissional de saúde de Jinan.
Alvos para extermínio
Os autores do novo relatório, com base em evidências anteriores e novas descobertas, afirmam que a população principal na China que teria sido vítima desta política estatal são prisioneiros de consciência, compostos principalmente de praticantes do Falun Gong.
O Falun Gong é uma disciplina tradicional de auto-cultivo que se tornou extremamente popular na China na década de 1990. A disciplina envolve a prática de cinco exercícios incluindo meditação e ensinamentos baseados nos princípios de verdade, compaixão e tolerância. O Estado chinês tacitamente apoiava o Falun Gong, até que uma pesquisa oficial indicou que havia mais de 70 milhões de praticantes em 1999, mais do que o número de membros do Partido Comunista Chinês (PCC) na época.
Em julho de 1999, o então líder chinês Jiang Zemin desencadeou uma campanha nacional para eliminar o Falun Gong. Inicialmente, ele enfrentou oposição no alto escalão do regime, mas rapidamente Jiang Zemin transformou a mobilização contra o Falun Gong num meio de consolidar seu poder dentro do PCC, à medida que promovia quadros leais e marginalizava os resistentes e opositores.
A extração de órgãos como um meio de eliminar a população do Falun Gong parece ter começado no ano seguinte ao início da perseguição.
A evidência de que isso ocorreu já está disponível há uma década, mas esta é a primeira vez que o número de mortos estimado se mostrou tão chocante, o grande volume de evidências tão avassalador, e o papel central do Estado chinês como facilitador tão claro.
Os três autores do relatório, David Kilgour, David Matas e Ethan Gutmann, publicaram anteriormente relatórios sobre o assunto, mas esta é a primeira vez que eles juntaram forças. Inclusive eles foram surpreendidos com os resultados da investigação.
“Quando criança, você esperimentou pegar uma pedra e viu toda a riqueza de vida sob ela, como formigas e insetos? Assim tem sido a experiência de trabalhar com este relatório”, disse Gutmann, um jornalista cujo livro “The Slaughter” sobre o tema foi publicado em 2014.
Kilgour é um ex-parlamentar canadense e Matas é um conhecido advogado de direitos humanos; a dupla publicou o livro “Bloody Harvest” sobre o tema em 2009, que se seguiu a um relatório pioneiro com o mesmo título lançado em julho de 2006.
Nos últimos anos, os pesquisadores dos abusos de transplante na China tinham a impressão de que a escala da extração forçada de órgãos tinha se reduzido consideravelmente, ou que pelo menos os praticantes do Falun Gong e outros prisioneiros da consciência não seriam mais visados para execução.
Os autores descobriram que isso não é verdade. “Eles criaram um monstro”, disse Gutmann. “Nós estamos olhando para uma engrenagem gigantesca, que não consegue parar. Eu não acredito que seja apenas o lucro por trás disso, eu acredito que é a ideologia, o assassinato em massa, e o encobrimento de um crime terrível em que a única maneira de encobrir o delito é continuar matando as pessoas que sabem a respeito.”
A espinha dorsal do relatório, e sua maior seção, é um relato exaustivo de todos os hospitais na China que se sabe terem realizado transplantes. Dos 712 hospitais que são identificados, 164 recebem tratamento detalhado e individualizado no relatório.
Centros de extração de órgãos
O Hospital Geral de Nanjing, no Comando Militar de Nanjing, por exemplo, é detalhado em duas páginas. O relatório discute a prolífica carreira de Li Leishi, o fundador do centro de pesquisa do rim no hospital; há inclusive um documento do Partido Comunista que tornou obrigatório o estudo do “modelo” que ele estabeleceu. Li Leishi foi elogiado pelo regime pela criação de um dos centros de transplante renal de crescimento mais rápido no país.
Numa entrevista de 2008, Li Leishi, então com 82 anos, disse que no passado ele realizaria em média 120 transplantes de rim por ano, mas na época ele estava se limitando a 70. Outro cirurgião-chefe relatado teria realizado “centenas de transplantes de rim por ano” desde 2001. Com 11 cirurgiões-chefes e 6 cirurgiões-associados envolvidos em transplantes de rim, o volume total de transplantes no hospital pode ter atingido cerca de mil por ano, afirma o relatório.
Volumes de transplante surpreendentes como este aparecem ao longo do relatório.
No Hospital Geral de Fuzhou, também no Comando Militar de Nanjing, o Dr. Tan Jianming dirigiu pessoalmente 4.200 transplantes de rim até 2014, segundo sua biografia num website pertencente à Associação Médica Chinesa.
O Hospital Xinqiao, afiliado à Terceira Universidade Médica Militar, em Chongqing, sudoeste da China, disse que havia realizado 2.590 transplantes de rim até 2002, incluindo 24 em um único dia.
Zhu Jiye, diretor do Instituto de Transplante de Órgãos da Universidade de Pequim, disse em 2013: “Houve um ano em que o nosso hospital fez 4.000 operações de transplante de fígado e rim.”
Num artigo publicado em junho de 2004 no Jornal de Medicina da Polícia Militar Chinesa, uma tabela acessível é fornecida mostrando que o Hospital Fraterno de Pequim e o Hospital Guangzhou Nanfang realizaram mais de 2.000 transplantes renais até o final de 2000. Três outros hospitais registram terem realizado 1.000 transplantes cada até o final do mesmo ano. A maioria destes teria sido realizada apenas em um ano ou pouco mais, uma vez que até o final da década de 1990, o transplante de órgãos na China era praticamente inexistente.
Hospital após hospital, página após página, números volumosos como estes são apresentados, provenientes de publicações oficiais chinesas, incluindo discursos, boletins internos, websites hospitalares, revistas médicas, relatórios da mídia e muito mais.
Sem exceção, esses hospitais apenas discutem esses dados impressionantes sobre o volume de transplantes a partir do início de 2000. Os programas de desenvolvimento de infraestruturas e de formação em massa de cirurgiões também só começaram a ser relatados nesta data, ou seja, logo após o início da perseguição ao Falun Gong.
Máquina de matar estatal
A linha oficial do regime chinês sobre suas fontes de órgãos mudou ao longo do tempo. Em 2001, quando o primeiro desertor emergiu da China, alegando que o regime estava usando prisioneiros no corredor da morte como uma fonte de órgãos, o porta-voz oficial do regime negou, alegando que a China depende principalmente de doadores voluntários.
Em 2005, funcionários do regime começaram a insinuar que na verdade os prisioneiros no corredor da morte é que eram usados. E depois que as alegações da extração de órgãos de praticantes do Falun Gong foram tornadas públicas em 2006, as autoridades chinesas insistiram que os prisioneiros no corredor da morte, que teriam consentido em ter seus órgãos removidos após a morte, eram a fonte primária.
Mas a conclusão ameaçadora que lentamente emergiu por meio da pesquisa publicada no relatório, que inclui cerca de 2.000 notas de rodapé, é que toda a indústria médica de transplante foi deliberadamente criada, quase da noite para o dia, imediatamente após uma nova fonte abundante de órgãos ter se tornado disponível.
Isto é sugerido pelo imenso envolvimento do Estado, tanto a nível central como local, na indústria de transplante. Começando na década de 1990, o sistema de saúde da China foi em grande parte privatizado, com o Estado pagando somente pela infraestrutura, enquanto os hospitais tinham de se financiar por conta própria.
O centro de transplante de fígado no Hospital Renji viu o número de leitos cirúrgicos disparar: de 13 no final de 2004, para 23 apenas duas semanas mais tarde, para 90 em 2007, e para 110 em 2014.
Em 2006, o Primeiro Hospital Central de Tianjin acrescentou todo um edifício de 17 andares, com 500 leitos, exclusivamente para transplante de órgãos. Há muitos outros casos; o relatório contém fotografias dos edifícios, muitas vezes impressionantes.
O transplante de órgãos rapidamente se tornou um negócio rentável e os governos centrais e locais patrocinaram pesquisa e desenvolvimento, a construção de novas instalações palacianas de transplante, e o financiamento de programas de formação médica, incluindo o treinamento no exterior de centenas de cirurgiões de transplante.
Toda uma indústria chinesa de medicamentos antirrejeição emergiu, enquanto os hospitais chineses começaram a desenvolver suas próprias soluções conservantes, produtos químicos em que os órgãos são mantidos durante o transporte entre o doador e o receptor.
Conforme o centro de transplante associado à Universidade Médica Chinesa em Shenyang disse em seu website: “Para ser capaz de completar um número tão grande de cirurgias de transplante de órgãos a cada ano, nós precisamos dar todo nosso agradecimento ao apoio dado pelo governo. Em particular, o Supremo Tribunal Popular, a Suprema Procuradoria Popular, o sistema de segurança pública, o sistema judiciário, o Ministério da Saúde e o Ministério dos Assuntos Civis promulgaram leis em conjunto para determinar que a obtenção de órgãos recebe o apoio e a proteção do governo. Isso é inédito no mundo.”
Os autores do relatório se recusaram a estabelecer o número de mortos. Embora seja possível que em alguns casos múltiplos órgãos tenham se originado de uma única vítima, até 2013 a China tinha apenas um sistema ad hoc de rastreio de compatibilidade. Cirurgiões chineses também se queixaram sobre o grande desperdício na indústria de transplante da China, em que muitas vezes apenas um órgão vinha de um doador. Assim, se 60 mil a 100 mil cirurgias de transplante foram realizadas anualmente, o número de mortes devido à extração forçada de órgãos na China pode chegar a 1,5 milhão.
Como o Relatório de Medicina da China informou num resumo de 2004 sobre a indústria de transplante: “Atualmente, porque a China não tem um sistema interativo de registro de órgão, frequentemente apenas um rim é retirado de um doador e muitos outros órgãos são simplesmente desperdiçados.”
David Matas, na conferência de imprensa de 22 de junho, disse: “O fenômeno de múltiplos órgãos de uma pessoa [sendo utilizados] tem ocorrido, mas são estatisticamente insignificantes.”
De acordo com Lan Liugen, o vice-diretor de cirurgia no Hospital No. 303 do ELP na província de Guangxi, até o início de 2013, havia apenas dois hospitais na China que poderiam extrair e transplantar múltiplos órgãos de um único doador. “Tais cirurgias são o melhor uso dos recursos dos doadores”, disse ele. “Atualmente, apenas países como os Estados Unidos, Alemanha e Japão podem fazer vários transplantes de órgãos do mesmo doador simultaneamente.”
Os autores estão publicando suas conclusões num momento em que o clima da opinião pública sobre esta questão parece prestes a mudar: jornalistas estão mais dispostos a olhar para o tema; documentários sobre o assunto estão sendo produzidos e ganhando prêmios; e está crescendo o número de médicos de transplante e especialistas em ética que estão tomando conhecimento sobre o sistema de transplante da China e ficando revoltados com isso.
Recentemente, o Congresso dos Estados Unidos aprovou uma resolução expressando preocupação sobre essas práticas da China, com membros do Congresso denunciando o fato como “macabro” e “repugnante”.
Um documentário de 2015, intitulado “Hard to Believe” e que está sendo exibido na emissora PBS, explora como a questão foi recebida pelos meios jornalísticos e médicos. A gravidade do que tem ocorrido na China há uma década e meia só agora está começando a ganhar reconhecimento.
Rogers, a bioeticista australiana, diz que ela descobriu que muitas pessoas têm dificuldade em processar e aceitar o que está ocorrendo na China.
“Eu tive que explicar em detalhes a uma amiga alemã que é bioeticista e que lida com muitos temas internacionais desafiadores”, disse Rogers. “Ela literalmente não podia acreditar em mim, e perguntou: ‘Como eu não fiquei sabendo disso antes?’”
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