Por Migalhas
Na quarta-feira, 10/4, às 9h30, conforme determinado pelo presidente Toffoli, o plenário do STF finalmente começará o julgamento dos processos objetivos que tratam da seguinte polêmica:
A execução provisória da pena logo após decisão de 2º grau fere ou não o princípio constitucional da presunção de inocência?
A resposta virá a partir da decisão de mérito das ADCs 43 e 44, ambas relatadas pelo ministro Marco Aurélio Mello. Também há a ADC 54, a qual S. Exa. concedeu liminar impedindo a prisão antes do trânsito em julgado – liminar suspensa pelo presidente Toffoli.
A jurisprudência que vigorou antes da polêmica atual é tese defendida há tempos pelo próprio ministro Marco Aurélio.
Com efeito, em 2009, com voto conductore de Marco Aurélio, o Supremo estabeleceu que era inconstitucional a execução antecipada da pena, homenageando o princípio constitucional da presunção de inocência. Por 7 a 4, o plenário concedeu o HC 84.078 para permitir a um condenado pelo TJ/MG que recorresse em liberdade.
Em fevereiro de 2016, também em HC e com o mesmo placar (7×4), mas com composição alterada, o plenário afirmou ser possível a prisão após 2ª instância. Na ocasião, a guinada jurisprudencial foi capitaneada pelo ministro Teori Zavascki. O entendimento foi firmado em um remédio heroico, quer dizer, só dizia respeito ao caso concreto. Tanto é assim que os próprios ministros da Corte passaram a decidir, monocraticamente, de formas distintas – instalou-se a insegurança jurídica com uma miscelânea de decisões.
Posições
Com o desaparecimento trágico do ministro Teori e a consequente entrada na Corte do ministro Alexandre de Moraes, teve início a especulação sobre qual seria, diante da nova composição, a corrente majoritária. Até prova em contrário, Moraes tem se inclinado a seguir o entendimento de seu antecessor.
Mas há novidades. Três ministros dão a entender que podemos ter mudanças na jurisprudência:
• Toffoli, no fim de 2016, lançou a ideia de se aguardar, no mínimo, decisão do STJ para a execução provisória da pena.
• Gilmar, em agosto de 2017, sinalizou que poderia acompanhar a tese do ministro Toffoli.
• Rosa, em abril de 2018, demonstrou que, embora seja contra a prisão em segunda instância, poderá seguir a atual corrente majoritária.
• Fev.16 – STF muda jurisprudência.
• Out.16 – STF mantém posicionamento para permitir prisão.
• Nov.16 – STF confirma prisão em 2ª instância em repercussão geral.
• Abr.18 – STF nega pedido de Lula para evitar prisão.
O que se ouve, para apimentar ainda mais o imbróglio, é que há duas grandes incógnitas e que são elas que irão balizar o julgamento, sobretudo porque estão no começo da votação, logo após o relator. O primeiro é Alexandre de Moraes, que embora se incline por permitir a prisão em 2ª instância, poderá vir a ser contra a obrigatoriedade, ou ainda adotando a tese de Toffoli, de se aguardar o STJ. Na sequência de votação, Fachin e Barroso devem ser a favor da prisão em 2ª instância. E aí surge a segunda incógnita: a posição da ministra Rosa. Se ela for contra a prisão em 2ª instância, o resultado estará sacramentado.
Contra ou favor
Se o Supremo definir que a prisão em 2ª instância, ou após o STJ, não fere a presunção de inocência, a dúvida que o Plenário deverá resolver é acerca da possibilidade versus obrigatoriedade da prisão. Ou seja, se a prisão é regra ou exceção.
Projeto anticrime
Em seu discurso de posse no governo, o ministro da Justiça Sérgio Moro foi enfático ao dizer que o plenário do STF “já decidiu diversas vezes” sobre a regra da execução da condenação após julgamento em segunda instância. Na última quarta-feira, 27, o ministro, em sessão na CCJ do Senado, disse que seu projeto anticrime traz a previsão “clara” da prisão.
Mesmo antes de passar para a política, Moro já defendia que a proposta segue a linha do voto do ministro Teori. Mas a letra do texto apresentado por Moro não leva, em verdade, a essa conclusão. Vejamos:
“Art. 617-A. Ao proferir acórdão condenatório, o tribunal determinará a execução provisória das penas privativas de liberdade, restritivas de direitos ou pecuniárias, sem prejuízo do conhecimento de recursos que vierem a ser interpostos.
§ 1º O tribunal poderá, excepcionalmente, deixar de autorizar a execução provisória das penas se houver uma questão constitucional ou legal relevante, cuja resolução por Tribunal Superior possa plausivelmente levar à revisão da condenação.”
Ocorre que o entendimento do saudoso ministro Teori tinha outro tom. Vejamos dois trechos:
“Não se mostra arbitrária, mas inteiramente justificável, a possibilidade de o julgador determinar o imediato início do cumprimento da pena, inclusive com restrição da liberdade do condenado, após firmada a responsabilidade criminal pelas instâncias ordinárias.”
“A execução provisória de acórdão penal condenatório proferido em grau de apelação, ainda que sujeito a recurso especial ou extraordinário, não compromete o princípio constitucional da presunção de inocência.”
Como se vê, o ministro Teori não falava em obrigatoriedade. Aliás, ipsis litteris, ele fala em “possibilidade”. De modo que, no caso de o plenário assentar a possibilidade da prisão, é importante definir qual deve ser fundamentação da decisão (art. 5º, LXI, CF). Essa discussão até mesmo já foi levantada na 2ª turma do Supremo pelo ministro Lewandowski.
Expectativas – Lula
Se definida pelo plenário a “possibilidade” e não “obrigatoriedade” da prisão após condenação em 2º grau, o destino do ex-presidente Lula pode ser alterado. Isso porque, em dezembro, o ministro Gilmar Mendes pediu vista no HC em que a defesa do ex-presidente alega a suspeição do ex-juiz Sérgio Moro, no caso do tríplex. Fachin e Cármen Lúcia já votaram denegando a ordem. Os advogados pediram HC de ofício, na sessão de julgamento.
Ou seja, ninguém se assuste se, dias depois da decisão do Supremo, o processo voltar á pauta e o ex-presidente Lula for cumprir prisão domiciliar ou ser definitivamente solto para aguardar o trânsito em julgado da condenação, com votos de Celso de Mello, Gilmar e Lewandowski.