Os incêndios no Norte do Brasil expõem o governo Lula a uma das maiores crises ambientais na Amazônia desde 2010. O drama histórico alterou a função dos “rios voadores”, transformando-os em corredores de fumaça visíveis até do espaço, resultado de queimadas fora de controle associadas à seca na região.
O sistema dos “rios voadores”, responsável por levar grandes volumes de vapor d´água da floresta para a América do Sul e de transformar a umidade em chuva, passou a ser um disseminador de névoa tóxica, conforme relatório do World Wildlife Fund (WWF) Brasil.
Os gases se espalham a milhares de quilômetros de distância por vários biomas do Brasil. A fumaça já alcançou 11 estados do país até o momento, sendo notada em Cuiabá (MT), Campo Grande (MS), Belo Horizonte (MG), São Paulo (SP), Rio de Janeiro (RJ), Porto Alegre (RS) e Florianópolis (SC).
De acordo com dados do IQAir, na terça-feira (20), Porto Velho, a capital de Rondônia, registrou a pior qualidade do ar entre todas as cidades brasileiras.
“A fumaça está pegando carona nos rios voadores”, explicou o meteorologista Marcelo Seluchi, do Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais (Cemaden). “Quando esses incêndios ocorrem, a fumaça é transportada pelos ventos. No verão, esses ventos levam a umidade da Amazônia para as regiões Sul e Sudeste do Brasil. Na época seca, eles transportam calor e fumaça.”
Recorde histórico
Nesta quarta-feira (27), foram registrados 28.697 focos de queimadas na Amazônia. Isso representa um aumento de 83% em relação ao mesmo período do ano anterior, quando foram identificados 15.710 focos.
Esse recorde supera em 38% a média dos 10 anos anteriores, de 2014 a 2023, durante os governos de Dilma Rousseff (PT), Michel Temer (MDB), Jair Bolsonaro (PL) e o primeiro ano da atual gestão de Luiz Inácio Lula da Silva (PT), com Marina Silva no comando do Ministério do Meio Ambiente.
Em 2024, o total de queimadas já alcançou 53.620 focos, um crescimento de 80% em relação a 2023. O Pará lidera o ranking dos incêndios em agosto, com 36% dos focos; em seguida, está o Amazonas, com 29%, e Mato Grosso, com 16%.”
Estes números são de um estudo do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE).
A analista de pesquisa do Greenpeace Brasil, Kamila Craveira, percorreu um trecho da Amazônia e do Pantanal e descreveu o drama: “Em todo o percurso, não se via a cor azul do céu”, disse. “Estava tudo laranja e pesado. As máscaras protetoras e balaclavas apenas amenizavam a sensação de horror da fumaça tóxica tocando a pele e invadindo os pulmões.”
Danos à saúde
As partículas que ficam no ar após os incêndios têm um tamanho de até 2,5 micrômetros, o que é 30 vezes menor do que a espessura de um fio de cabelo humano. Portanto, não são visíveis a olho nu.
Mas, se inaladas, essas partículas podem causar diversos danos à saúde, como dificuldade para respirar, dor e ardência na garganta, rouquidão, dor de cabeça, lacrimejamento e vermelhidão nos olhos.
Pesquisas mostram que a fumaça também pode prejudicar pulmões, vasos sanguíneos e o sistema imunológico, afetando com maior intensidade os idosos, as crianças e portadores de doenças respiratórias.
Os pneumologistas recomendam o uso de umidificadores de ar e a lavagem das narinas com soro fisiológico. Outra orientação é a ingestão de água e líquidos, além de manter as portas e janelas fechadas. O Ministério da Saúde também sugeriu o uso de máscaras cirúrgicas ou bandanas.
Morte de animais
A equipe do Greenpeace descreveu o drama dos animais registrado pelo grupo durante os 14 dias em que percorreram a região Norte neste mês de agosto. As cenas mais chocantes foram presenciadas no Pantanal, em Mato Grosso do Sul.
“Encontramos animais de diferentes portes carbonizados pelo fogo — cobras, jacarés, javaporcos — todos próximos à estrada, indicando que tentaram correr e se salvar”, descreveu Craveira.