“Podemos ser pobres e vivenciamos grave escassez de alimentos, porém não estamos dispostos a expor nossa população a riscos desconhecidos”, disse em 2002 o então presidente
Zâmbia e outros três países africanos surpreenderam o mundo em 2002, quando reduziram o auxílio alimentício durante um período de escassez regional. Não aceitavam diversos alimentos porque, além de serem geneticamente modificados (GM), não estavam triturados, significando que, potencialmente, poderiam ser semeados para desenvolver cultivos GM. Os quatro países solicitaram aos Estados Unidos, que haviam fornecido a maior parte do auxílio, que triturassem o alimento para que este fosse apto apenas para consumo, e não para ser cultivado. Porém, o pedido foi negado, pois triturar o alimento eleva o custo da doação.
Quando a África do Sul interveio para auxiliar na trituração, três países, Malaui, Moçambique e Zimbabue aceitaram. Somente a Zâmbia seguiu desprezando a ajuda, afirmando a modificação genética era um “veneno”, como chamou o então presidente do país Levy Mwanawasa.
Na Cúpula Mundial sobre Desenvolvimento Sustentável (2002) em Johannesburgo, Mwanawasa disse: “Podemos ser pobres e vivenciamos grave escassez de alimentos, porém não estamos dispostos a expor nossa população a riscos desconhecidos”. […] Não permitirei que os zambianos se convertam em cobaias, independentemente dos níveis de fome que vivenciamos em nosso país”.
Na mesma época, depois que cientistas zambianos foram ao exterior em uma missão de estudo sobre o milho GM, o ministro da agricultura da Zâmbia, Mundia Sikatana, disse aos jornalistas em Lusaka: “Ante à incerteza científica, o país deve se precaver contra ações que podem afetar negativamente a saúde humana e animal, como também deteriorar o meio ambiente”.
Dessa época em diante, existe a proibição da importação de qualquer organismo geneticamente modificado (OGM), com a exceção de um auxílio alimentício GM permitido em 2005. Inicialmente, Zâmbia suportou críticas do exterior pela sua firme postura anti-OGM, porém agora, grande parte da pressão para aceitar os OGM desapareceu.
Zâmbia recebe demanda de milho não-transgênico
Aproximadamente 85% da população da Zâmbia vive da agricultura. Em comparação com os países vizinhos, como Zimbábue, Zâmbia consegue produzir grande parte de seu consumo, sem necessidade de importações.
De fato, Zâmbia exporta um pouco da sua produção de milho aos países vizinhos através do World Food Program (WFP) – Programa Mundial de Alimentos das Nações Unidas. Em 2012, Zâmbia vendeu 59.500 toneladas de milho não-GM ao WFP. Em 2010, exportou 551.000 toneladas de milho não-GM ao Zimbábue. “A maior parte dos países que consomem a alimentação tradicional do WFP, em particular, insistem nessa classe de milho”, disse Simon Cammelbeeck, diretor do WFP na Zâmbia, em uma entrevista com sua própria organização, em 2012. “O fato de que a Zâmbia produz milho não-GM tem criado, à sua maneira, um mercado especializado, porque poucos países são capazes de satisfazer a exigência global”. Em outras palavras, as suas colheitas estão sendo aceitas globalmente, e beneficiam a Zâmbia.
Em termos de relações da Zâmbia com países da União Européia, o governo zambiano teme que os países da UE desprezem suas colheitas pela possível contaminação cruzada com grãos GM. Ainda que a “Zâmbia, a nenhum grau significativo, exporte colheitas comestíveis à Europa”, segundo um artigo de Gastronomia escrito por Christopher Annear, dizendo que preferem ficar livres de OGM. Atualmente, a Zâmbia carece de tecnologia para examinar a presença de OGM.
Com a demanda de seu milho não-transgênico e os temores de prejudicar as relações com a UE, a Zâmbia tem razões globais para manter sua postura anti-OGM.
Explorando os OGM
O Sindicato Nacional de Agricultores da Zâmbia (ZNFU), que ajudou a proibir os OGM em 2002, escreveu em seu site em 2010 que “O ZNFU não apóia os transgênicos, já que, por enquanto, não há base para apoiar esse tipo de tecnologia, porém o que o Sindicato está promovendo e pedindo é a abertura das discussões e debates sobre as tecnologias OGM”. Também no ano de 2010, o então presidente Rupiah Bwezani Banda disse que o governo estava disposto a discutir e debater os OGM.
O presidente atual Michael Sata, havia, no passado, criticado a renúncia do governo a aceitar os OGM, porém como seus predecessores desprezaram a entrada de transgênicos, ele também seguiu a mesma política. Assim, há 11 anos, o governo zambiano tem mantido a política anti-OGM mais forte da África.
No entanto, uma política do governo para investigar e construir uma indústria para desenvolver e produzir OGM tem existido na Zâmbia desde 2003, mas os funcionários do Ministério da Ciência, Tecnologia e Formação Profissional (MSTVT) mantêm uma postura estrita de não utilizar os OGM, segundo Emma Broadbent, uma investigadora estabelecida em Londres. “A diretora Jane Chinkusy particularmente desejava refutar as afirmações dos meios dizendo que o governo estava ‘abrindo’ o debate”, escreveu em seu trabalho de investigação, em 2012.