Website de turismo de transplante na China foi tirado do ar

12/06/2014 13:53 Atualizado: 12/06/2014 13:53

Até algum momento de maio era possível ir ao despretensioso website intitulado CNTransplant.com e ali mesmo agendar uma chamada telefônica para organizar um transplante de órgão num hospital em Tianjin, China.

“O Centro de Saúde Medinet… Somos os frutos de uma árvore, folhas do mesmo ramo”, dizia o website até poucos dias atrás.

“Nós… estamos aqui para ajudar os pacientes a obterem um rim, fígado ou transplante cardíaco na China.” Seus hospitais, diz o website, operam com todas as licenças apropriadas, e “são certamente onde pacientes moribundos renascem”.

Pacientes, conhecidos como “turistas de transplante”, voariam para a China para obter novos órgãos e emergir “renascidos”.

Órgãos deste tipo na China invariavelmente vêm de prisioneiros executados, embora que tipo de prisioneiro seja uma questão contestada. A China está nos estágios iniciais e vacilantes de estabelecer um sistema de doação de órgãos voluntário, que coexistirá com a extração de órgãos de prisioneiros.

Os números oficiais indicam que houve cerca de 1.000 doadores voluntários de órgãos em 2013, enquanto que cerca de 300 mil pacientes chineses precisam de um órgão. Normalmente, clientes globais pagam mais.

A existência do website CNTransplant.com contestava as alegações das autoridades chinesas que afirmavam não mais permitir transplantes de órgãos para estrangeiros. A data precisa do desaparecimento do website da internet não está clara, mas parece ter ocorrido em algum momento em maio.

“Hospitais e médicos que realizam operações de transplante privadas com estrangeiros terão suas credenciais para transplante de órgãos revogadas”, disse Huang Jiefu, o ex-vice-ministro da Saúde e o mais alto funcionário de transplante na China, conforme citado na imprensa chinesa.

A Sociedade de Transplantes, um grupo médico internacional, tem tentado por anos trabalhar em cooperação com as autoridades chinesas, especialmente na tentativa de encontrar formas de evitar a extração de órgãos de prisioneiros executados.

Numa carta severa à liderança chinesa, a Sociedade de Transplante se referiu especificamente ao website CNTransplant.com como um exemplo do fracasso da China em satisfazer seus compromissos.

“O website Tianjin… continua a recrutar pacientes internacionais que buscam transplantes de órgãos”, disse a carta. “O fato de que pacientes estrangeiros ainda realizam transplantes na China sugere que alguns hospitais estão ousada e irresponsavelmente violando os regulamentos do governo chinês, fazendo da lei um mero ‘tigre de papel’. Estes centros estão comprometendo a confiança pública nacional e manchando a reputação da China no cenário internacional.”

David Matas, um advogado canadense de direitos humanos, afirmou numa palestra recente que a atitude do website era “uma prática descarada do turismo de transplante”.

A remoção do website parece mostrar que as autoridades estão tentando se certificar de que não haja contradições excessivamente óbvias entre as declarações públicas e as ações no país, embora isso não signifique que a prática do turismo de transplante tenha parado, disseram especialistas.

Em março, Huang Jiefu foi citado dizendo que era permitido usar órgãos de prisioneiros executados, uma reversão notável de anos de promessas de que o uso desses órgãos seria interrompido.

“Os órgãos judiciais e ministérios de saúde locais devem estabelecer laços e permitir que prisioneiros no corredor da morte doem órgãos voluntariamente e sejam adicionados ao sistema de alocação de órgãos”, disse ele.

“Não há mais freios no sistema”, disse Ethan Gutmann, um pesquisador que completou recentemente um livro sobre a extração ilícita de órgãos na China. Seu trabalho centra-se na execução de adeptos do Falun Gong detidos ilegalmente para extração forçada de seus órgãos, uma política que teria sacrificado dezenas de milhares de adeptos.

“É temporada de caça. Uma sangrenta temporada de caça está aberta [na China]”, disse Gutmann criticamente.

Outras pesquisas indicam que os órgãos de adeptos do Falun Gong seriam usados no turismo de transplante. Dois canadenses, David Kilgour, um ex-advogado da coroa e ministro do Parlamento, e David Matas documentaram em 2006 telefonemas retratando funcionários hospitalares na China ostentando a disponibilidade e qualidade dos órgãos de adeptos do Falun Gong disponíveis para clientes estrangeiros.

Embora o encerramento do website não comprove que o turismo de transplante foi interrompido, isso resolve o problema da publicidade gritante que a questão representava.

“Esse foi meu truque favorito nos últimos seis meses”, disse Gutmann. “Eu discursaria para um público universitário e pediria a quem tinha alguma dúvida que visitasse o website em seus smartphones.”