A sucessão de vendas de grandes jornais norte-americanos comprova uma mudança de objetivos e métodos que é muito mais relevante do que a troca de comando e de estratégias empresariais. Não se trata apenas da constatação de que terminou o período de vacas gordas na indústria de imprimir notícias, mas da consolidação dos indícios de que a sobrevivência da imprensa depende mais da sua relação com o público do que com os anunciantes e investidores.
Até agora o jornalismo produzia notícias para uma indústria que as transformava em produto comercializável. No fundo, os profissionais produziam para seu patrão, mas agora o objetivo passou a ser pessoas ou grupos de pessoas. Antes, a notícia produzida por jornalistas era valorizada pela sua capacidade de atrair anunciantes. Agora, ela passa a ser avaliada pela criação de comunidades sociais integradas e produtivas.
Antes, a notícia estava vinculada à produção de capital financeiro por meio de taxas de lucros que beiravam os 25%, algo considerado anormal até no mundo dos negócios. Depois das TICs, o objetivo passa a ser a geração de capital social, por meio do qual as comunidades sociais garantem a sua sustentabilidade econômica.
É nessa mudança de foco que podemos entender porquê empresários bem sucedidos, que não têm nada de burros, abrem mão de negócios que não faz muito tempo eram considerados verdadeiras minas de ouro. Os executivos da imprensa perderam as esperanças de voltar à bonança do final do século passado ao verificar que o interesse público passou a ser predominante na atividade jornalística.
No contexto digital, o jornalismo reencontra seu velho discurso sobre a função social da profissão, diante do acúmulo de fatos e dados que apontam o papel da notícia e da informação com fatores obrigatórios, embora não únicos, na produção de conhecimento coletivo – que os economistas e sociólogos chamam de capital social.
É essencial entender esse processo para que não fique a impressão de que os jornalistas e a produção de jornais (impressos ou digitais) estão em vias de extinção inexorável. Pelo contrário, o jornalismo assume, hoje, uma importância que a produção industrial de notícias não permitia vislumbrar.
O raciocínio é simples. A notícia, como um tipo especial de informação caracterizado pelo ineditismo, relevância, credibilidade e pertinência é parte essencial no sistema de produção de conhecimento, sem o qual é impossível alimentar o processo de geração de inovações, que por sua vez é a base da dinâmica da economia digital.
Até agora a produção industrial de notícias era um negócio vinculado à luta pelo poder político e econômico. Era um apêndice da estrutura básica da economia mundial. Agora, o jornalismo assume um papel muito mais importante e central porque se vincula ao processo de inovação social e econômica por meio da notícia e da informação.
O profissional do jornalismo passa a ser avaliado não mais por suas habilidades na escrita e na investigação, mas também pelo seu engajamento junto às comunidades e grupos sociais. É o que afirma Jeff Jarvis, professor e consultor norte-americano em novas mídias, para quem a sobrevivência do jornalismo depende de sua vinculação às necessidades informativas das comunidades e organizações sociais.
Essa mudança de foco levou ao surgimento de novas plataformas de publicação e produção de notícias, como é o caso do Facebook, Twitter, Linkedin, Youtube, Podcasts, RSS, Google, Amazon, blogs, webrádio, softwares para análise de bancos de dados, curadoria de notícias e os programas para edição na “nuvem” (programas residentes na internet). Esses e dezenas de outros novos softwares que pipocam a todo instante na internet são as novas ferramentas do jornalismo.
É toda uma nova linha de produção de equipamentos que substitui as gráficas e sistemas de distribuição de jornais impressos. É um novo jornalismo que está surgindo e cujas dores do parto ainda são intensas, mas assustam bem menos que antes.
Esta matéria foi originalmente publicada pelo Observatório da Imprensa
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