Tradicional Diário do Comércio deixa de circular abruptamente e demite jornalistas

04/11/2014 23:13 Atualizado: 05/11/2014 11:55

Apesar de seus 90 anos de existência, o tradicional jornal da Associação Comercial de São Paulo (ACSP), Diário do Comércio, foi encerrado de repente e sem direito a edição de despedida. A equipe foi surpreendida na sexta-feira, 31 de outubro, quando boa parte dos jornalistas foram convocados e demitidos, inclundo o diretor de redação, Moisés Rabinovici, carinhosamente chamado de Rabino. De acordo com a ACSP, a equipe será reestruturada e apenas os colunistas foram mantidos. A edição impressa circulada na mesma sexta-feira, tornou-se, assim, a última.

Depois de uma conversa com os representantes do jornal nesta segunda-feira (3), o Sindicato dos Jornalistas Profissionais no Estado de São Paulo (SJSP) se reúne nesta quarta-feira (5) com os jornalistas afetados, que estão de licença remunerada por dez dias. O SJSP então retomará as negociações com o representantes do jornal na quinta-feira (6), informa o sindicato em comunicado. “Nosso empenho é para preservar os empregos dos jornalistas”, diz o presidente do SJSP, José Augusto Camargo. De acordo com a ACSP, apenas os colunistas foram mantidos, para a versão on-line, que deve permanecer. E para cujo comando, adianta Rabinovici, já estaria cotado o jornalista Marcelo Tas, que está deixando a Rede Bandeirantes.

Com aproximadamente meio século de jornalismo, Rabino dirige o Diário do Comércio desde 2003. Foi diretor da Agência Estado e correspondente internacional da revista Época, da Rádio Eldorado e do Estadão, versão on-line do Estado de São Paulo. Integrou a primeira equipe do Jornal da Tarde, em 1966. Dois dias após o comunicado interno que terminou com o diário, ele usou seu perfil no facebook para externar sua indignação com a forma como a decisão foi aplicada, sem direito a despedida dos leitores, “como todos os jornais do mundo”. Rabinovici também contou que todo o corpo de jornalistas, inclusive ele, teve seus computadores bloqueados e acesso negado aos ramais da redação.

Em nota publicada domingo no site do jornal, o presidente da ACSP, Rogério Amato, falando em “passo ambicioso em sua modernização”, afirmava que a marca Diário do Comércio continua e justificava a extinção do impresso com a necessidade de se adaptar o jornal à “velocidade exigida por um mundo cada vez mais dinâmico”.

“Somos gratos pelo empenho de todos que produziram o Diário do Comércio em sua versão impressa. Sabemos que no setor da mídia o objetivo prioritário é o de satisfazer os leitores. E todos nós teremos a partir de agora um Diário do Comércio com muito mais recursos”, escreveu Amato, se referindo à interatividade da web, sem citar, no entanto, o rebuliço na Redação nem a carta interna, distribuída na sexta-feira, na qual o presidente creditava o fim do jornal aos “anos de operação com resultados negativos.”

De acordo com análise publicada pelo portal Jornalista&Cia, a contabilidade financeira da versão impressa já não fechava há tempos, principalmente após um rombo ocorrido em janeiro de 2013, “quando 24 dos 49 profissionais que lá trabalhavam deixaram a publicação por causa de uma ação do Ministério Público do Trabalho em combate à informalidade na redação. Ficaram 25 contratados em regime celetista”, escreveu o veículo.

O filósofo Olavo de Carvalho, um dos colunistas do Diário do Comércio, fez um voto em seu perfil no facebook: “O Diário do Comércio tinha a melhor equipe de articulistas que já se viu num jornal brasileiro. Roberto Fendt e Neil Ferreira eram os meus preferidos, mas todos os outros eram bons. Espero que, nesse ponto, nada mude na edição digital.”

Guilherme Afif Domingos, ex-presidente da ACSP e atual vice-governador de São Paulo e ministro-chefe da Secretaria da Micro e Pequena Empresa da Presidência da República, expressou em rede social desconforto com o fim do Diário do Comércio impresso e com a maneira como foi fechado.

“O nosso público é antigo e conservador. Ainda da era do papel impresso. Acabando com ele de forma tão abrupta, corremos o risco de perder os antigos e não conquistar os novos. Deveríamos planejar a transição de forma aberta e não hermética. Enfim, fica a impressão de que tudo que foi feito não tem nenhum reconhecimento. Espero que estejam realmente sabendo o que estão fazendo, pois, quando um pequeno grupo de iluminados se fecha para traçar um futuro sem passado, podem conduzir para o vazio do nada. Inclua-me entre os emails dos que se manifestam pela morte do nosso querido e glorioso Diário do Comércio.”