A Torre da Água da Ásia está em perigo

12/09/2013 16:56 Atualizado: 20/11/2013 12:33

Quando o ex-líder chinês Hu Jintao voou para Nova Déli em 28 de março de 2012, para uma cimeira do BRIC, ele penetrou em terreno desconhecido: uma democracia com imprensa livre, onde um refugiado tibetano de 27 anos, Jamphel Yeshi, caminhou num protesto público, derramou querosene no corpo e se pôs em chamas enquanto gritava pelo fim das atrocidades chinesas no Tibete.

As imagens marcantes da Índia, o corpo de Jamphel Yeshi queimando, expuseram ao mundo o custo do reinado de terror da China no Tibete, que foi bem escondido por 61 anos.

Desde 16 de março de 2011, 121 pessoas no Tibete e 6 no estrangeiro se imolaram em público, em desafio aos assaltos dos comunistas chineses a sua fé budista, mas não havia jornalistas ou diplomatas para testemunhar a carnificina, apenas um vídeo bruto que chegou à internet.

Há outra fonte potente dessa explosão de revolta tibetana, que recebe desprezível cobertura internacional: a história secreta da China de destruição e pilhagem das terras e águas ancestrais do Tibete.

No folclore asiático, o Tibete é conhecido como “A Casa dos Tesouros do Ocidente”. Seu povo tem sido o responsável cuidadoso deste terreno abundante por milênios. A bênção do Tibete, seu remoto platô, agora é sua maldição: a China controla o “Terceiro Polo” com punho de ferro e não há ninguém para detê-la.

Fatos elementares sobre o Tibete não são amplamente conhecidos, mas qualquer mapa do platô tibetano revela os enormes recursos e a vantagem estratégica conquistada por sua captura.

O Tibete é uma entidade geomorfológica única, suas 46 mil geleiras constituem a terceira maior massa de gelo do planeta. Esse “Terceiro Polo”, cheio de riquezas intocadas, animais selvagens, minerais, madeira e, acima de tudo, água, é um componente vital do ecossistema do planeta.

Um mapa da região do Himalaia e do planalto tibetano (Diana Hubert-Benedetti/Epoch Times)
Um mapa da região do Himalaia e do planalto tibetano (Diana Hubert-Benedetti/Epoch Times)

O Tibete é a nascente dos rios Yangtzé, Amarelo, Indus, Brahmaputra, Chenab, Sutlej, Salween e Mekong, que fluem através de 11 nações, nutrindo 3 bilhões de pessoas de Peshawar a Pequim. Hoje, todos os grandes rios da Ásia – exceto o Ganges, que nasce no planalto tibetano, mas, felizmente, fora da fronteira chinesa – são controlados nas cabeceiras do Tibete pelo Partido Comunista Chinês (PCC).

Em 2000, a China lançou um projeto de desenvolvimento vasto intitulado ‘Xibudaifa’, a Abertura e Desenvolvimento das Regiões Oeste (de Xinjiang e do Tibete, que juntos compõem a metade oeste da China). Um afluxo maciço de colonos chineses, urbanização e realocação forçada dos nômades rapidamente se seguiram.

A Ferrovia Xizang, que abriu em 2006, transporta grandes fontes de minerais, pedra e madeira do Tibete para o continente e traz uma enxurrada de engenheiros e operários chineses que construíram pelo menos 160 barragens hidrelétricas em todo o Tibete e tem planos para centenas mais.

Engenheiros chineses agora operam várias barragens e minas em todo o Tibete, poluindo os rios em sua nascente, você pode ver tudo isso no Google Earth. O governo chinês rejeita as preocupações dos próprios cientistas e dos Estados vizinhos, alarmados pelo súbito declínio nos níveis da água e pesca.

Exilados tibetanos carregam um caixão com o corpo de Jamphel Yeshi, que se imolou em protesto contra a ocupação chinesa do Tibete. A degradação ambiental causada pelo regime chinês está entre os principais motivos de manifestação dos tibetanos (STRDEL/AFP/Getty Images)
Exilados tibetanos carregam um caixão com o corpo de Jamphel Yeshi, que se imolou em protesto contra a ocupação chinesa do Tibete. A degradação ambiental causada pelo regime chinês está entre os principais motivos de manifestação dos tibetanos (STRDEL/AFP/Getty Images)

Na década de 1990, a China se recusou a assinar o tratado da ONU sobre rios transfronteiriços e aumentou a militarização do platô tibetano, negando o acesso de observadores internacionais e jornalistas à conturbada região.

O autor Michael Buckley, que capturou imagens raras da construção de uma barragem em seu filme ‘Meltdown in Tibet’, observa: “A China não tem que ouvir ninguém sobre isso. A China tem o Tibete, então, a China tem todas as cartas.” (Para ver os vídeos do Sr. Buckley e outros documentos visite aqui.)

Quando recentemente questionada sobre a crise no Tibete, a mídia oficial chinesa afirmou: “O Dalai Lama nos lembra dos nazistas descontrolados e cruéis na 2ª Guerra Mundial. … Como isso pode ser similar ao Holocausto cometido por Hitler aos judeus?!”

Muitos diplomatas e jornalistas estão intrigados com a China demonizando obsessivamente o Dalai Lama, o ilustre Prêmio Nobel da Paz, mas a histeria estalinista do Politburo funciona. Ela esmaga toda e qualquer discussão racional sobre a exploração da China dos recursos do Tibete e subverte a atenção de como as minas e represas chinesas têm criado uma catástrofe ambiental iminente no continente mais populoso do mundo.

A preservação e a gestão das geleiras do Tibete e dos rios que ele sustenta é um dos maiores desafios da humanidade no século 21. Nos 11 países por onde correm as águas do Tibete, o crescimento populacional e o desenvolvimento industrial estão projetados para dobrar em 50 anos.

Os efeitos combinados do rápido desenvolvimento, desertificação e escassez de água já criaram ciclos extremos de secas e inundações, escassez de alimentos e pandemias. O continente chinês está tão ameaçado que, em abril de 2011, os fluxos de água do rio Yangtzé estavam em seu nível mais baixo na história registrada.

No entanto, apesar da evidência irrefutável dos perigos da exploração excessiva dos recursos hídricos do Tibete, o governo chinês não modificará ou reduzirá seus planos de barragens, túneis, ferrovias e rodovias em todo o planalto tibetano.

Exilados tibetanos fazem uma vigília em Calcutá, Índia, pelas vítimas de autoimolação, durante uma visita do ex-líder chinês Hu Jintao a Nova Déli. Desde março de 2011, 121 tibetanos no Tibete e 6 seis no estrangeiro se imolaram em protesto (Dibyangshu Sarkar/AFP/Getty Images)
Exilados tibetanos fazem uma vigília em Calcutá, Índia, pelas vítimas de autoimolação, durante uma visita do ex-líder chinês Hu Jintao a Nova Déli. Desde março de 2011, 121 tibetanos no Tibete e 6 seis no estrangeiro se imolaram em protesto (Dibyangshu Sarkar/AFP/Getty Images)

Desde que o presidente Mao invadiu o Tibete em 1951, a China implantou uma enorme infraestrutura militar em todo o planalto tibetano, o que dá à China uma fronteira contínua com a Tailândia, Birmânia, Butão, Índia, Nepal e Paquistão. As áreas de fronteira agora estão cheias de aeródromos militares e batalhões do Exército da Liberação Popular (ELP). Na próxima era das “guerras pela água”, a China terá mão firme na Torre da Água da Ásia.

A China insiste que o Tibete é “um assunto interno do Estado” e, por décadas, o mundo recuou em silêncio desconfortável enquanto o abate de uma população civil indefesa continua sem impedimento ou penalidade. Por 61 anos, o PCC controlou a narrativa, mas ignorar o Tibete é mal interpretar como a ocupação chinesa intensifica a instabilidade ambiental, econômica e militar na Ásia e no mundo.

Tsetan, um jornalista tibetano baseado em Déli, diz: “Por anos, temos protestado contra a profanação de nossa cultura, o jugo de nossos rios e a mineração de nossas montanhas sagradas, mas a China não ouve: Eles nos fuzilam, torturam e não há ninguém para detê-los. Agora, as pessoas no Tibete são levadas a imolarem seus corpos para fazer o mundo entender o que a China está fazendo ao Tibete e é melhor o mundo acordar antes que seja tarde demais.”

Maura Moynihan é uma jornalista e pesquisadora que trabalhou por muitos anos com refugiados tibetanos na Índia e no Nepal. Suas obras de ficção incluem “Hotel Yoga” e “Kaliyuga”

Esta matéria foi originalmente publicada pela Rangzen Alliance