O KMT, Partido Nacionalista de Taiwan, sofreu recentemente uma derrota esmagadora nas eleições. As queixas dos taiwaneses contra o KMT são muitas – há um sentimento de que o KMT é elitista, inacessível e distante do povo –, no entanto, para muitos, a perda do KMT nas eleições passou uma grande mensagem: a maioria dos taiwaneses não está feliz com o estreitamento dos laços entre Taiwan e China.
Esse processo de aproximação em relação à República Popular da China foi um ponto crítico no governo do presidente Ma Ying-jeou. A derrota nas eleições – dos 22 municípios, o KMT venceu em 6; perdeu em 13 para a oposição, o Partido Democrático Progressista; e nos 3 restantes perdeu para outros partidos – é considerada uma resposta a essa política de aproximação e expressa a preocupação do povo quanto a isso.
Fundamentalmente, esta foi a primeira eleição em Taiwan depois de o “Movimento Girassol”, quando milhares de jovens invadiram a legislatura do país em março e abril, exigir maior escrutínio na aprovação de um acordo comercial com a China. Isso porque um político do KMT tentou forçar a passagem desse acordo na Assembleia na tentativa de burlar o processo legal de apuração do acordo, o que contrariou muitas pessoas.
“O resultado das eleições é que Taiwan está dizendo ‘Não!’ ao Partido Comunista Chinês e ao Partido Nacionalista”, disse o colunista e escritor chinês Cao Changqing, em entrevista à Rádio Som da Esperança.
Cao Changqing recordou uma frase atualmente bastante comum entre os políticos de Taiwan, que diz que, se o KMT continuar a dominar a política, “Taiwan se tornará outra Hong Kong”.
“Esta frase é absolutamente precisa”, disse Cao na entrevista. Hong Kong é nominalmente autônoma, mas está sob o modelo de “um país, dois sistemas”, e, em última análise, está sob o controle do Partido Comunista Chinês (PCC). Foi justamente o controle exercido pelo PCC sobre o processo eleitoral de Hong Kong que levou dezenas de milhares de estudantes às ruas em setembro, que os levou a ocupar em manifestação as principais vias de tráfego do centro financeiro da cidade para que sejam ouvidos em suas reivindicações por eleições livres.
O intelectual Chen Weijian, escrevendo para o jornal Beijing Spring, de tendência pró-democracia, comentou que os familiares de muitos funcionários do KMT estão fazendo negócios na China. “Eles se tornaram um poderoso grupo de interesse”, escreveu ele. “Eles já foram comprados.”
“O povo de Taiwan não é idiota,” escreveu Chen. “Quando os comunistas chineses dão algo a Taiwan, o povo sabe que é mais um caso de ‘a doninha vir para desejar feliz Ano Novo’. O objetivo é integrar Taiwan à ditadura chinesa.” (Chen encurtou o ditado tradicional chinês que diz que “quando a doninha vai desejar feliz Ano Novo ao frango, não é por bondade de coração”, ou seja, a real intenção da doninha é comer o frango.)
Ele acrescentou que a continuidade do governo do KMT acabaria resultando nisso. De fato, em Taiwan, muitos não temem tanto a ameaça militar representada pela China – há mais de 1.000 mísseis balísticos na costa da China apontados para a pequena ilha de Taiwan – quanto o grande poder econômico que o PCC pode usar para conseguir seu objetivo de dominação.
Por exemplo, tornando a economia de Taiwan dependente da China, ou seja, controlando partes vitais da economia de Taiwan, o PCC poderia de fato obter real controle político sobre Taiwan. Muitos temem isso.
“Esta eleição não foi apenas uma derrota para o Partido Nacionalista”, disse Cao Changqing na entrevista, “foi também uma enorme derrota para o Partido Comunista Chinês.”
Gerrit van der Wees, editor do Taiwan Communiqué, uma publicação pró-independência da Associação de Formosa para Assuntos Públicos, disse numa entrevista por telefone que “os resultados das eleições são em grande parte um repúdio às políticas de Ma”.
O editor acrescentou que a pobre governança do presidente Ma Ying-jeou e sua tentativa de transformar o poder político numa máquina de “obter aprovações”, também contribuiu para essa derrota.
Ma parece estar ciente dessa preocupação do povo de Taiwan sobre sua política em relação à China. Num surpreendente discurso público em outubro, Ma expressou apoio à democratização de Hong Kong.
“A China simplesmente deveria agir de forma correta em relação a sua promessa feita há 17 anos, quando disse que, por 50 anos, permitiria que Hong Kong fosse governada pelo próprio povo de Hong Kong, tivesse um alto grau de autonomia e elegesse o chefe-executivo por meio do sufrágio universal”, disse Ma Ying-jeou nesse discurso.
“Agora que 1,3 bilhão de pessoas no continente enriqueceram moderadamente, elas naturalmente desejam desfrutar de maior democracia e do estado de direito”, continuou ele.
Essa atitude aparentemente mais iluminada de Ma e até então inédita representou uma mudança política de seu governo sobre a questão chinesa. Se isso será suficiente para mudar a sorte do KMT e futuras eleições não está claro.
Gerrit van der Wees disse que esse gesto de Ma foi “muito pequeno, muito tardio”. Quando disse isso em seu discurso, Ma já havia estreitado relações com a China e desconsiderado uma série de coisas que a China fez que agravava a situação na Ásia… Mostrando uma postura pró-China, Ma se posicionou tardiamente sobre a situação em Hong Kong.”